Caso o espectador menos informado não tenha tempo de ler o programa da peça antes de as luzes do teatro se apagarem, poderá pensar que O Papa e a Bruxa foi bolada meses atrás. O texto do italiano Dario Fo, hoje com 84 anos, foi escrito em 1992 e constrói uma crítica rasgada aos dogmas e à sisudez protocolar da Igreja Católica. Após os recentes escândalos de abuso sexual cometidos por membros da Igreja, é difícil, na verdade, descobrir se o material original perdeu a força transgressora ou se tornou ainda mais atual.
Essa armadilha foi driblada pelo craque Hugo Possolo e seu grupo Parlapatões, que retornam à Curitiba com a montagem de O Papa e a Bruxa, uma das atrações mais concorridas do último Festival de Curitiba (confira o serviço completo).
Malabares
O grupo paulistano expande as possibilidades da peça para satirizar diversos elementos da cultura contemporânea e, brincando entre si, fazer malabares com o texto original.
Por isso a montagem parece ter deixado toda a provocação obrigatória para a parte inicial do primeiro ato. Durante os primeiros 15 minutos da encenação, a plateia assiste a uma espécie de vaudeville em que são apresentas as piadas mais agressivas, quase vulgares, porém jamais deslocadas, sobre os abalos recentes à imagem da Igreja Católica.
Estes momentos funcionam como uma espécie de prólogo a demonstrar o quanto a igreja já foi malhada pela comédia, e não há como não lembrar do filme Maus Hábitos, de Pedro Almodóvar, ou do número musical "Todo Esperma É Sagrado", do grupo britânico Monty Python.
Com a lição de casa feita de adianto, os Parlapatões estão livres para se entregar ao absurdo da trama e oferecer um sem-número de momentos brilhantes. Com o crescimento da comédia stand-up, O Papa e a Bruxa é um lembrete do prazer associado à sutileza das comédia bem planejadas.
A entrega do texto é outro ponto de destaque. Orbitando em torno do ator principal e diretor Hugo Possolo um dos mais talentosos comediantes de palco do Brasil os atores espremem as possibilidades humorísticas de cada ditongo, mantendo a plateia aquecida mesmo em momentos mais densos, quando a trama precisa abrir espaços para avançar. Em O Papa e a Bruxa, somente o riso é sagrado.
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