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 | Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo
| Foto: Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo

Assim que passei a dirigir em Portugal, tive que aprender a me comportar corretamente. Em grandes cidades como Lisboa ou em povoados, a maior instituição urbana por estes lados se chama “faixa de pedestre”. Todos os motoristas param quando um caminhante ameaça descer da calçada rumo a esta área sinalizada. Os carros freiam e, se algum avança, a população o reprime.

No começo, vivi alguns apuros, pois me esquecia que, a qualquer momento, teria uma pessoa bem na frente do para-brisa, cruzando a rua sem nem conferir se o motorista tinha ou não parado. Era óbvio que ele pararia. Embora não fosse óbvio para mim que eu pararia. Depois de vários sustos, habituei-me a dar a preferência às pessoas.

Agora que tenho uma carta de condução portuguesa, posso me dizer integrado ao trânsito. Já conheço as placas europeias, tão diferentes das brasileiras, e consigo até pagar o pedágio em máquinas de autoatendimento. Aliás, a carteira internacional que tirei no Brasil com validade até 2020 só serviu por 6 meses, o que me obrigou a substituí-la. Como na brasileira sou habilitado para moto e caminhão e na portuguesa apenas para ligeiros, ao voltar terei algumas limitações.

Mas o difícil mesmo vai ser me acostumar a conduzir na maioria das cidades brasileiras. Se parar para os que andam a pé, causarei algum acidente com os carros atrás de mim. E correrei o risco de morrer atropelado ao atravessar, caminhando distraidamente, a faixa de pedestre, crente de que todo condutor sabe que elas precisam ser respeitadas. Vou ter que desaprender este uso civilizado da cidade.

Mas há em Portugal um hábito de trânsito terrível. Todos os motoristas deixam o carro em fila dupla em qualquer lugar, mesmo em vias movimentadas e estreitas. Alguns ligam o alerta para indicar que estão fazendo algo rápido.

No começo, selvagemente, eu buzinava para alertar que estavam cometendo um erro, depois vi que ninguém se importava com isso. Era uma tradição e as tradições devem ser cultuadas. Deixamos o nosso carro bem estacionado em frente a um restaurante e quando voltamos há um veículo qualquer obstruindo a saída. Aí sim é que se usa a buzina. Sem irritação, apenas para chamar o responsável. Todos na região olham para a fonte daquele som e em minutos aparece o condutor, pedindo desculpas.

Pronto! – esta é uma das expressões mais repetidas aqui. A coisa foi civilizadamente resolvida.

Num sábado de manhã, fui ao mercado da cidade. O trânsito nesta área é um caos. Parei em fila dupla, seguindo a tradição, e quando voltei, 5 minutos depois, um guarda anotava a matrícula (placa, para nós) de meu carro. Expliquei que fazia o que era tão comum. Ele não quis conversa, talvez irritado com meu sotaque.

– O senhor tem 30 euros para a coima?

Tinha, mas não sabia o que era coima. Seria uma gorjeta para corrompê-lo? Respondi que sim e ele me levou até a viatura para emitir a multa, que paguei na hora.

Coima significa multa.

Aprender o vocabulário lusitano pode custar caro.

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