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Fernanda Torres, fantasiada de rato, interpreta um dos personagens de Amoral da História, série que estreia no Multishow | Juliana Coutinho/Divulgação
Fernanda Torres, fantasiada de rato, interpreta um dos personagens de Amoral da História, série que estreia no Multishow| Foto: Juliana Coutinho/Divulgação

Até domingo passado, Fernanda Torres ocupava semanalmente páginas da Folha de São Paulo arriscando-se a opinar sobre as eleições presidenciais, com a astúcia de uma leiga no assunto, interessada sobretudo no caráter de encenação do jogo político. Amanhã, a atriz aparecerá na tevê vestida de coelhinha.

Um pouco inspirada nas mu­­lheres-símbolo da Playboy, outro tanto no roedor imaginado por Lewis Carroll, Fernanda adota as orelhas ironicamente, para narrar as fábulas subversivas da série Amoral da História, que estreia no canal pago Multishow, com episódios de segunda a sexta-feira, às 23h30. Trata-se de uma adaptação das Fábulas Fabulosas, publicadas por Millôr Fernandes pela primeira vez em 1964.

Seu fascínio pelo autor carioca motivou o projeto, e ganhou força diante da constatação de que os textos de Millôr, por mais acessíveis e irreverentes, não eram aproveitados na tevê. "Ele é pop, tem humor e inteligência. É altamente adaptável", justifica, empolgada.

Em 22 dias, o elenco dirigido por Vicente Kubrusly gravou 20 episódios. Além da coelhinha, Fernanda interpreta personagens variadas, vira rato, escrava e japonesa, fun­­keira e rainha má, Pandora e Pené­­lope, com um empurrãozinho da maquiagem e do figurino.

Ela contracena principalmente com o ator Luiz Carlos Mieli, mas não faltam participações especiais: Wando, o cantor, faz a Fera (da Bela) e Paulo Silvino, um guarda e um burro.

Ao ver os primeiros episódios, a maior surpresa da atriz foi a junção "mágica" das partes: cenas gravadas, trechos de animação e imagens de arquivo. "Lembra Monty Python e o filme do Orson Welles que corta do rosto do Picasso para uma mulher andando na rua [em Verdades e Mentiras], é esse tipo de edição, com imagens reais e ficção. Não é realista, mas também não é nonsense", adianta.

Um pouco antes de o segundo capítulo de Amoral da História ir ao ar no Multishow, na terça-feira, bastará mudar de canal para ver Fernanda fazer graça em outra situação. Por volta das 22h30, a Globo exibe o episódio de As Cariocas no qual ela é a protagonista: "Cris, a Invejosa de Ipanema". Enfim, de­­sencanta a parceria com o diretor Daniel Filho, há muito tempo desejada mas, até aqui, inédita.

Para o ano que vem, a atriz planeja atuar em mais uma série, escrita por Cláudio Paiva e dirigida por Maurício Farias. Em Entre Tapas e Beijos, ela e Andréia Beltrão serão duas moradoras do subúrbio carioca que investiram na profissão e conquistaram independência, mas cuja vida sentimental é uma ca­­tástrofe. Uma, amante de um ho­­mem casado. Outra, de um su­­jeito que a largou no altar e volta dizendo que estava preso. "Elas são populares, mas são problemas que dizem respeito a mulheres de A a Z", comenta Fernanda.

Parece o bastante, mas não é tudo. No teatro, ela ainda sustenta o monólogo A Casa dos Budas Ditosos, em cartaz há sete anos. Recentemente, cumpriu mais uma temporada de quatro meses no Rio de Janeiro, e o sucesso da senhora libertina faz com que queira voltar com o espetáculo a Brasília, Salvador, Porto Alegre e Curitiba, em breve.

"É meu trabalho mais maduro em teatro", diz Fernanda. Até hoje, a atriz diz aproveitar insights que o diretor Domingos de Oliveira teve nos ensaios. Por exemplo, lembra de falar a primeira sacanagem (de incontáveis) como quem pede perdão à plateia, sem nenhuma agressividade.

Fernanda participou da adaptação do romance de João Ubaldo Ribeiro para o teatro. Mas, apenas no ano passado, estreou como autora de um texto original. Na peça Deus É Química, converteu sua experiência com drogas – segundo diz, foi usuária de cocaína – em uma história sobre a busca da felicidade nas substâncias químicas, incluindo os remédios receitados por psiquiatras e os inibidores de apetite. "O mais complicado talvez tenha sido estar em cena fazendo um texto meu, era esquisito", conta.

Na imprensa carioca, Barbara Heliodora publicou uma crítica desmerecedora, reclamando, entre outras coisas, da falta de ideias. "Não tinha como a Bárbara gostar. A peça dividia opiniões pelo tema, a encenação, o texto. Era meio uma viagem lisérgica", responde Fernanda. "Eu fiquei satisfeitíssima."

Sua próxima investida na dramaturgia será menos solitária. Ela partilha com o diretor Felipe Hirsch e o ator Fernando Eiras a tarefa de adaptar para o palco o livro Na Praia, do britânico Ian McEwan (de Reparação). "É um escritor moderno que tem alma do século 19, sem qualquer maneirismo de modernidade. Fiquei muito impressionada como, em um livro tão curto, consegue ser tão profundo", elogia a leitora, que agora se ocupa das páginas de Solar.

Com tanto trabalho na tevê e no teatro, Fernanda deixou um pouco de lado o cinema, que no passado a consagrou com o prêmio de me­­lhor atriz no Festival de Cannes. Estava em seu horizonte o papel da viú­­va Porcina na filmagem de Roque Santeiro, mas atrasos na produção adiaram as gravações.

Sua intenção de escrever roteiros cinematográficos, manifestada quando colaborou com o de O Redentor, também foi abandonada. Hoje, prefere textos curtos e individuais. "Comecei a fazer crônicas, porque minha profissão já é muito coletiva", diz.

Fernanda escreve sobre temas livres como a cidade do Rio de Janeiro ou comportamento a cada quinze dias, na última página da Revista Veja Rio – um espaço dividido com Manoel Carlos. Antes de assumir o posto, colaborou com algumas edições da revista Piauí.

Pelas duas experiências, recebeu da Folha de São Paulo o convite para assinar uma coluna sobre política durante a disputa entre Marina, Serra e Dilma. Queriam mesmo uma "não expert".

"Fiquei com medo, porque não entendo especialmente de política. Ao mesmo tempo, acho que a posição do ignorante é comum à maioria de nós, e a eleição não deixa de ser um palco: o político precisa lidar com o público e criar uma imagem. Isso me norteou em algumas crônicas. Acho que consegui não ser partidária", comemora, satisfeita e aliviada que acabou.

Serviço:

Amoral da História, de segunda a sexta-feira, às 23h30, no Multishow. As Cariocas, às terças, às 22h30, na Rede Globo.

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