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Ilustração de uma estação do projeto do metrô em Curitiba, feito pela prefeitura | Divulgação/ Prefeitura Municipal de Curitiba
Ilustração de uma estação do projeto do metrô em Curitiba, feito pela prefeitura| Foto: Divulgação/ Prefeitura Municipal de Curitiba
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Até sete anos atrás, a implantação do metrô, pelo menos nos moldes tradicionais, era um assunto nunca abordado pela administração de Curitiba – cidade que "exporta" o modelo de canaletas exclusivas para o ônibus, implantado aqui na década de 70. Mas a situação mudou. O metrô tornou-se a solução para desafogar o sistema, ao menos no eixo Norte-Sul, segundo a atual gestão. Um erro estratégico para o ex-prefeito e ex-governador Jaime Lerner, que implantou o sistema de canaletas. Para o engenheiro Garrone Reck, ex-diretor de operações da Urbs (orgão gerenciador do transporte coletivo integrado na capital) , há outras soluções simples e baratas. Confira o que pensam o atual presidente do Ippuc, Cléver Almeida, e os dois especialistas sobre o assunto.

Carro versus transporte coletivo

Cléver Almeida – Tivemos uma melhoria do ponto de vista econômico, o que facilitou o acesso dos brasileiros ao automóvel, que é visto não apenas como um meio de deslocamento, mas como um patrimônio da família. Mesmo fazendo campanhas que falam que o carro não é um meio sustentável de transporte, é ele que as pessoas querem. Temos, ainda, uma situação boa em Curitiba, até em função do nosso transporte público ter qualidade. Tanto é que 45% das pessoas que se deslocam na cidade usam ônibus. A função da prefeitura é criar condições favoráveis para que se utilize outros meios de transportes que não o carro. É preciso haver uma conscientização das pessoas de que o transporte individual não é sustentável e que, continuando com essa opção, todos nós vamos parar um dia. Não creio que em Curitiba isso se dê rapidamente, mas é uma tendência.

Jaime Lerner – O acesso ao automóvel não necessariamente impede uma cidade de ter um bom transporte público. A mobilidade tem que ser pensada como um conjunto de sistemas: o automóvel, um smart metrô, smart bus, passa pela qualidade no metrô, a operação de superfície, táxi, ou bicicleta. Quanto mais mal feita estiver a operação de superfície, mais inútil será o metrô. O equívoco é deixar deteriorar a superfície para justificar o metrô. Se a superfície não for bem operada, o metrô também não será bem operado.

Argumentos favoráveis ao metrô

Cléver Almeida – Dizer que o sistema de canaleta, que foi implantado com ônibus que acomodava 80 passageiros e quatro anos depois teve dobrada sua capacidade, com carros que carregam 160 passageiros, foi um fracasso, não é correto. Pelo contrário: o sistema de canaleta precisou ser mudado para dar conta da demanda que crescia. O metrô vem nessa linha; ou seja, um veículo capaz de transportar um número maior da passageiros. Não estamos mudando a concepção do sistema e, sim, fazendo a substituição do veículo que está operando nessas canaletas por outro com maior capacidade.

Argumentos contra o metrô

Jaime Lerner – Na superfície você tem capacidade de maior fluxo e o que precisa ser feito é continuar investindo nas inovações do sistema. A canaleta ainda tem muito potencial a ser explorado. O risco de se deteriorar o sistema de superfície é grave. Pode-se anular conquistas de 30 anos que colocaram Curitiba na vanguarda da inovação para passarmos a ser copiadores de um sistema que seria implantado em apenas um trecho de uma linha. Os argumentos que se colocam de que o sistema está superado e é necessário outro com maior capacidade são discutíveis. Posso provar que vamos poder transportar na superfície mais do que no metrô, se a superfície for bem operada.

Garrone Reck – O metrô pode ser uma alternativa, mas tem seu ônus. Tem o tempo para as obras, que é grande, além do impacto desses trabalhos no trânsito e na cidade. Ainda podem ser encontradas soluções que não são paliativas e que são mais fáceis e baratas. As canaletas ainda têm muito potencial a ser explorado.

Custo do sistema

Cléver Almeida – Você tem de trabalhar com um projeto adequado às suas necessidades. É lógico que o custo é um item importante na hora de definir um projeto, mas não adianta gastar menos e não resolver o problema. O metrô vem dentro dessa lógica. É mais caro, mas hoje não temos um sistema de ônibus capaz de fazer o que o metrô é capaz, em se tratando de aumento da capacidade. É preciso fazer análise de benefícios e transtornos. O metrô hoje traz uma solução definitiva para o transporte no eixo no qual ele vai ser implantado. É um custo maior, sim, mas nós já fizemos avaliações e ele se mostrou viável do ponto de vista econômico. Fazendo uma conta bem rasteira, o custo do nosso quilômetro está em torno de US$ 40 milhões, sendo que o de um metrô tradicional sairia US$ 100 milhões. O que é mais barato no nosso projeto é a obra de infraestrutura porque temos canaleta e não precisamos abrir uma via pública, não precisamos fazer de forma tão profunda.

Jaime Lerner – Posso reduzir a tarifa pela metade se reduzir a frota. Agora, é preciso operar com a frota adequada. Neste ponto, estamos entrando no perigoso terreno do subsídio. O metrô, além de altos investimentos, vai ter que ser subsidiado para operar. O metrô não paga a sua operação e alguém vai ter de subsidiar a construção. Um dia talvez tenhamos a necessidade de metrô. Mas, enquanto precisar de subsídio, e não tiver de onde tirar o dinheiro para a operação, ele representa um risco. Esse dinheiro vai sair da saúde, da educação, da atenção à criança. E não é pouco dinheiro: são 2,3 milhões de passageiros por dia.

Garrone Reck – Em Curitiba você paga a mesma tarifa até para ir à Lua. A tarifa única gerou ônus para o próprio sistema, que é subsidiado, e o próprio usuário de ônibus [que faz um trajeto mais curto] ajuda nesse subsídio. Fazer o metrô integrar a rede e não cobrar preço diferenciado é uma decisão política. Se houver condições de manter tarifa igual para todos os meios, então que seja em função de fonte externa ao sistema. Por que não cobrar um pedágio que subsidie o transporte público? O motorista faz sua escolha. Se quiser andar de carro, tudo bem, mas então pague a mais para ajudar quem anda de ônibus.

Como conquistar mais motoristas

Cléver Almeida – Temos de trabalhar em várias frentes. Primeiro ter uma estrutura de transporte capaz de oferecer ao usuário de transporte individual uma opção que considere viável. Pode ser bicicleta para uns, o transporte público para outros.Temos hoje uma estrutura boa, com pessoas morando nas cidades da região metropolitana, tendo acesso tranquilo pelo transporte público e pagando uma tarifa justa. Para conquistar o novo usuário, para que ele deixe o carro em casa e só use de forma racional, é preciso trabalhar a cabeça dessas pessoas. É necessário entender que, se ele continuar optando pelo transporte individual, vai chegar um momento – em Curitiba, deve levar ainda um tempo para isso acontecer – em que vai ser inviável andar na cidade.

Jaime Lerner – Se você pega ônibus aqui (Cabral), vai ver usuários que têm automóvel e que o deixaram na garagem. Se o sistema operar bem, oferecer boa alternativa, as pessoas irão optar pela boa alternativa. Agora, se o ônibus estiver lotado... Quantas vezes pego ônibus e vejo gente de renda alta dentro dele. Não acontece isso em outras linhas? Mas o sistema expresso foi pensado para operar bem em todas as linhas e não só em algumas.

Como melhorar o uso da canaleta

Jaime Lerner – Se o expresso, que foi pensado para operar com intervalos de 30 segundos a um minuto, deixar as pessoas esperando por três minutos, vai ter gente explodindo lá dentro do tubo. Quando o ônibus não chega na frequência desejada, obviamente o povo acha ruim e as estações incham. Se o ônibus biarticulado, que foi pensado com pista exclusiva e prioridade no sinal tiver que parar em toda a esquina, anula tudo aquilo para o qual foi pensado. Se você der prioridade no sinal, quando o ônibus passar o sinal estará aberto. Ele foi pensado assim, operou durante muito tempo assim e de repente não existe mais a sincronização do sinal para ele.

Garrone Reck – Uma solução é permitir a ultrapassagem nas canaletas de linhas diretas, o que está sendo feito na canaleta do Boqueirão e na Linha Verde. Precisa de uma terceira faixa para ultrapassagem. Poderia se sacrificar os estacionamentos ao longo das canaletas e alargar a canaleta, eliminando o tráfego lento dessas ruas. Colocar mais ônibus nas canaletas, aumentando a frequência.

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