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De promessa a mistério: Paulo José Miranda reordena a carreira em Fazenda Rio Grande | André Rodrigues/Gazeta do Povo
De promessa a mistério: Paulo José Miranda reordena a carreira em Fazenda Rio Grande| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

Biografia

Saiba mais sobre Paulo José Miranda:

Paulo José Miranda nasceu em Paio Pires, em Portugal, em 1965. Formado em Filosofia pela Universidade de Lisboa, estreou na literatura com o livro de poesia A Voz Que Nos Trai, em 1997. Migrou para a prosa no ano seguinte, quando publicou a trilogia Triptíco da Criação, três romances cujos temas são personagens da inteligência portuguesa do século 19. O segundo volume desta série, Natureza Morta, venceu a primeira edição do Prêmio Literário José Saramago em 1999. O autor tem 15 obras publicadas com textos em prosa, poesia, ensaios e teatro, porém, nenhuma delas foi editada no Brasil. Miranda também é músico – toca violão clássico e fez parte de bandas de rock em Portugal.

"Não há violência se há equilíbrio entre as forças. Ao equilíbrio entre forças que se medem chama-se luta ou guerra. Violência é a ação de uma força sobre um nada de força, ou um pouco mais que nada. Um grupo é tendencialmente violento, pois a força é atraída pela sua própria capacidade de exercer o poder sobre o nada, ou sobre muita pouca coisa, embora não tenha necessariamente de ser violento. Tende para a violência, para a exclusão de quem não faz parte dele. Por outro lado um grupo pode ser muito bem treinado e disciplinado, como as forças militares. E, tendencialmente, as forças militares não exercem a violência, mas a guerra. A guerra pode ser boa, a violência é sempre má; apesar de eu viver da e para a violência. Mas o que seria do mundo sem violência? Haverá mundo sem violência?"

Trecho do livro A Máquina do Mundo (Abysmo, 2014), de Paulo José Miranda.

Parece uma trama de ficção. Um jovem escritor surge como a grande promessa da literatura portuguesa. Seu segundo romance, Natureza Morta, é considerado uma obra-prima e vence em 1999 a primeira edição do Prêmio Literário José Saramago, a maior láurea possível da língua portuguesa desde então. O grande escritor português Herberto Hélder afirma estar diante do "o único jovem romancista português que conseguia ler".

Foi assim o início estrondoso da carreira de Paulo José Miranda. Nos 15 anos seguintes, porém, o autor desapareceu do cenário literário. Conseguiu publicar pouca coisa. Sua obras saíram de catálogo. Enquanto autores de sua geração, como José Luís Peixoto, Valter Hugo Mãe e Gonçalo M. Tavares, alcançavam status de celebridade, seu paradeiro era desconhecido. De autor promissor, seu nome virou sinônimo de mistério, lenda urbana da literatura lusa. O que teria acontecido com Paulo José Miranda?

Vivendo hoje em Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana de Curitiba, o autor coloca na conta do acaso sua peculiar trajetória. "Quando recebi o Prêmio Saramago eu vivia na Turquia. Por acaso, eu liguei para minha mãe e ela disse que o meu editor me procurava para me dar uma boa notícia", lembra.

Depois de voltar a Portugal e receber os 15 mil euros das mãos do próprio Saramago, voltou para o que estava fazendo. "Estava escrevendo um livro com uma bolsa do governo lá na Turquia e continuei fazendo isso. Passei a viver com a minha namorada [a cineasta turca Pelin Esmer] fui para o para o Oriente Médio e Hong Kong. A diferença é que tinha um pouco mais de dinheiro", conta.

Depois disso, o vento o trouxe ao Brasil. "Por acaso, cheguei no Rio de Janeiro. Vim como quem vem comprar cigarros e já estou há nove anos." Foram seis meses na capital fluminense, dois anos em São Paulo, onde conheceu a atual esposa – a advogada curitibana Áurea Cruz. Com ela, Miranda se mudou para Florianópolis, onde moraram por três anos, na Praia do Campeche. A profissão da esposa os trouxe para Curitiba e hoje ele mora em um condomínio afastado em Fazenda Rio Grande. "Não gosto de cidade com menos de 10 milhões de habitantes. Ou é uma cidade nervosa ou o meio do mato. Para mim, é a selva ou a selva", brinca.

"Eu deixo as coisas acontecerem. Se estou mal, eu mudo. Vejo as pessoas reclamando das coisas. Estás mal, mudas, ó pá. Quando eu achar que não dá mais, dou cordas aos sapatos e me vou", filosofa.

No Brasil, algumas propostas para editar seu livro não deram certo, até porque o autor vivia como clandestino no país. "Não conseguia provar que eu era eu mesmo." Se virava com lábia e um velho passaporte português. "Quando eu tinha de viajar de ônibus, alguém precisava se responsabilizar por mim, como se fosse uma criança", ri. "Agora estou com o visto permanente, voltei a ser uma pessoa", conta.

Neste ano de 2014, porém, o autor foi redescoberto em Portugal. Uma editora publicou três livros seus de uma tacada só com grandes tiragens. Surgiram convites para trabalhos editoriais – Miranda participa do festival Litercultura, em novembro – e possibilidades reais de publicação no Brasil do material que nunca deixou de produzir. "A grande literatura é como erva daninha. Nasce onde nasce."

Autor ministrará oficinas sobre Fernando Pessoa no Litercultura

O escritor Paulo José Miranda é um dos convidados da edição 2014 do festival Litercultura, em Curitiba. Em novembro, ele irá ministrar oficinas sobre a obra do poeta português Fernando Pessoa e também falar sobre a proximidade e distância que existem entre as literaturas brasileira e portuguesa. "Há um desconhecimento de parte a parte, mas me parece que é muito mais de vocês em relação à nos do que de nós em relação a vocês", avalia.

Para Miranda, a literatura brasileira sofre de "provincianismo" ao rotular tudo o que o que não é produzido em São Paulo ou no Rio de Janeiro como literatura regional.

"Se pensássemos assim na Europa e considerássemos o continente um único país e, até por uma questão de geografia, achássemos que Paris e Londres eram o centro e o resto regionalista, imagine só toda a literatura que seria desperdiçada. Me parece que aqui vocês fazem isso", aponta.

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