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Seriado alerta para o perigo das tecnologias | David Dettmann/Netflix/
Seriado alerta para o perigo das tecnologias| Foto: David Dettmann/Netflix/

Quem foi criança nos anos 1980 certamente vai lembrar: no final de todo desenho animado do He-Man, o herói ou um de seus amigos explicava a moral daquele episódio. Quando He-Man salvou o vilão Esqueleto da morte certa, a lição era a de que toda a vida tinha seu valor, mesmo a de pessoas de quem não gostamos. Outros vários assuntos foram abordados, como ganância, amizade, perdão e até vícios.

He-Man, Mentor, Gorpo, Teela, Feiticeira e os outros personagens nunca se esforçaram para ser sutis. Pelo contrário, o importante era que a mensagem fosse transmitida da maneira mais clara possível para as crianças, principal público do desenho.

Trinta anos depois, as crianças daquela época cresceram. E, em um mundo cheio de smartphones, redes sociais, aplicativos de namoro e reality shows, nada mais apropriado que um novo conto moral para mostrar-lhes o caminho. Mais sutil, é claro, mas que no fim deixa o mesmo gostinho de ter passado uma mensagem da qual elas possam extrair algum sentido. Este programa chama-se Black Mirror.

Como tantos produtos culturais antes dele, Black Mirror pretende alertar para o perigo das novas tecnologias. O primeiro episódio da primeira temporada mostrou a que veio com uma ideia chocante: o primeiro-ministro do Reino Unido precisaria fazer sexo com um porco para salvar a princesa sequestrada. O evento seria transmitido ao vivo para toda a Grâ-Bretanha. Após várias maneiras de tentar escapar da chantagem, o político não vê outra saída a não ser ceder ao clamor público manifestado nas redes sociais, que deseja vê-lo cumprir o que pede o sequestrador.

Na terceira e mais recente temporada, o episódio mais comentado foi “Nosedive” (“Queda Livre”, em português). Já com um investimento maciço da Netflix, que comprou os direitos da série, contou com direção de peso de Joe Wright (“Anna Karenina”, “Peter Pan”, “O Solista”, “Orgulho e Preconceito”), a participação de uma superestrela de Hollywood, Bryce Dallas Howard (“Jurassic World”) e roteiro de Rashida Jones (“Parks and Recreation”).

Como o criador da série gosta de frisar, o mundo retratado em Black Mirror não é o futuro distante, mas o “daqui a um minuto”, então “Nosedive” traz algo muito semelhante ao nosso mundo, com a diferença de que todos são avaliados por um aplicativo que dá notas pelo comportamento, o tempo todo. O resultado é que todos agem de modo artificial, aterrorizados pela perspectiva de ganharem uma avaliação negativa.

O grande problema com a série, como um todo, é o excesso de moralismo empregado em todos os episódios (com a honrosa exceção de “San Junipero”). Não existem nuances em Black Mirror. Para convencer a audiência de que a tecnologia é algo terrível, ela entrega personagens caricatos, unidimensionais, como os que vemos em contos de fadas infantis — ou nos desenhos do He-Man. A tecnologia faz o papel de vilã e todas as pessoas são joguetes em suas mãos.

Recepcionada como a grande novidade da TV mundial, Black Mirror não oferece nada além do que o velho medo das novas tecnologias travestidas de mensagens moralistas. Aconteceu antes com a eletricidade, com as viagens espaciais, com as modificações genéticas e agora com a internet. É o He-Man do século 21. Mas sem a mesma cor e diversão.

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