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O canadense Oscar Peterson era capaz de usar uma centena de notas num espaço em que outro pianista usaria dez | Divulgação
O canadense Oscar Peterson era capaz de usar uma centena de notas num espaço em que outro pianista usaria dez| Foto: Divulgação

É típico de uma resenha de música dizer que "tal faixa vale o disco", mas depois de passar boa parte de um dia ouvindo a faixa dois de JATP Lausanne 1953 na opção "repeat", admito que o medley conduzido pelo pianista Oscar Peterson é a melhor coisa que aconteceu na minha semana. Talvez no mês.

A faixa é uma combinação de três baladas, cada uma delas tocada por um saxofonista diferente, todos amigos do pianista – como sugere o "Oscar Peterson & Friends" na capa do CD.

O sax tenor de Lester Young é capaz de levar você para um lugar melhor em "I Cover the Waterfront", que abre o medley. Dá para ver o "presidente" (como era chamado por alguns parceiros) tocando enquanto revira os olhos, algo que fazia sempre durante os solos – uma cena perturbadora de se ver. Willie Smith, no sax alto, emenda "Indian Summer" e toca como quem sussurra promessas de um futuro melhor, aumentando o volume nos momentos necessários, talvez para afastar o pessimismo. Para fechar, o também saxtenorista Flip Phillips escorrega para dentro da canção e mostra "Isn’t This a Lovely Day", famosa na voz de Fred Astaire no musical Top Hat.

A costura é feita pelo piano de Peterson, sutil como nunca se viu. O problema é a duração: míseros 6 minutos e 31 segundos. Viva o botão "repeat".

Contam que o produtor Norman Granz adorava "fogos de artíficio musicais", querendo dizer que ele tinha gosto pelos solos atléticos e barulhentos, com trompetistas berrando como elefantes e pianistas tocando todas as notas disponíveis o mais rápido que podiam.

Oscar Peterson (1925-2007) conseguia tocar rápido. O crítico Scott Yanow disse que o canadense batia uma centena de notas onde a maioria dos músicos tocava dez. Um ás dos acordes, ele floreava nos arranjos e solos, mas isso nunca chegou a incomodar. Nunca passou do ponto.

Enorme e com um sorriso simpático, lembrava um urso ao piano e suava em bicas durante as apresentações. Começava antes mesmo da primeira música acabar. E ia sacando os lenços do paletó, quando não toalhas, deixando-os sobre o piano.

O desempenho em Lausanne, em 1953, faz parte do projeto Jazz at the Philarmonic (JATP), idealizado por Granz e colocado em prática no Philarmonic Auditorium, em Los Angeles, a partir de 1944, o que explica o seu nome. Nos anos 50, o projeto começou a viajar, chegando à cidade suíça de Lausanne.

A importância da reunião organizada em torno de Peterson é audível (para não dizer visível). O CD começa com a introdução da banda e, somando os nomes e os aplausos do público, o processo todo dura quase dois minutos, um tempão. Além dos saxofonistas já citados, o grupo tinha o baterista Gene Krupa (protagonista de um solo demolidor em "Cottontail"), o baixista Ray Brown, o trompetista Charlie Shavers e o guitarrista Barney Kessel. J.C. Heard se revezou na bateria com Krupa.

Note que a acolhida do público para Lester Young é mais entusiasmada do que para qualquer outro instrumentista sobre o palco.

O disco vem numa bela caixa de papelão e traz um encarte que inclui notas originais e mais um texto do professor José Domingos Raffaelli. Ele compensa a falta de informações da ficha técnica e diz quem toca o que em cada música, além de descrever o contexto em que a gravação foi feita. GGGG

Serviço:

JATP Lausanne 1953, Oscar Peterson & Friends. Biscoito Fino, preço médio: R$ 38. Jazz.

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