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Diego Fortes (à direita) dirige segunda montagem da companhia A Armadilha adaptada de uma obra de Karam | Lucilia Guimarães
Diego Fortes (à direita) dirige segunda montagem da companhia A Armadilha adaptada de uma obra de Karam| Foto: Lucilia Guimarães

Despretensioso não é exatamente o adjetivo que Diego Fortes, diretor da companhia A Armadilha, gosta de escutar sobre seus espetáculos teatrais. Mas está difícil fugir da palavra. Assim os jornalistas classificaram, de modo positivo, Os Leões, e o mesmo termo serviu depois à peça Bolacha Maria. "Parece algo inofensivo, que não perturba", ele lamenta.

Mais incomodado ficou ao ouvir o comentário do iluminador Beto Bruel – antigo colega do dramaturgo Manoel Carlos Karam, na época do grupo Margem – que achou "engraçado" o fato de Bolacha Maria ser tão "comportadinha", já que o autor do texto, Karam, costumava fazer loucuras em cena.

Fortes percebeu, então, que a ousadia dos "patronos" do teatro paranaense era maior que a dos ditos "contemporâneos". "Aquilo me deu uma vergonha tão grande diante dessa geração da década de 1970."

Com sua nova montagem, Jornal da Guerra contra os Taedos, que estreou ontem no Teatro Novelas Curitibanas, o diretor acredita ter dado um passo além. "A gente tentou ser um pouquinho mais rock-and-roll, subverter algumas coisas. Melhor definindo, é provocativo", diz.

Manoel Karam, mais uma vez, nutre A Armadilha com seus escritos – com os quais a companhia se identifica pela linguagem fragmentada e elíptica, e pelo humor sutil. Jornal da Guerra contra os Taedos é o último livro do escritor – publicado após sua morte, em dezembro de 2007.

Um pouco antes disso, o grupo havia aprovado pela Funarte o projeto de pesquisa da obra do catarinense, que passou grande parte da vida radicado em Curitiba. O primeiro resultado prático foi Bolacha Maria, espetáculo de 2008, dirigido por Nadja Naira.

Enquanto pesquisava a obra completa de Karam, Diego Fortes se interessou por Pescoço Ladeado por Parafusos, um livro-Frankenstein, todo fragmentado, que continha algumas histórias sobre uma guerra fictícia contra o igualmente inventado povo dos Taedos – representante do "inimigo", seja qual for.

"Mais tarde, soube que publicaria um livro só sobre isso, porque a viúva dele adorava os Taedos e pediu para que o Karam escrevesse mais dessas crônicas curtas. Ele mandava quatro delas para a esposa todo mês, por e-mail, embora morassem na mesma casa", conta Fortes.

Apesar do que o título sugere, o diretor está convencido de que a guerra não é o verdadeiro tema em questão. "São os conflitos humanos, seja por inveja, implicância, preconceito, ignorância ou ambição." A imprensa, como produtora do discurso oficial, e a publicidade, criadora de slogans motivacionais para o alistamento, também estão em foco.

Alguns percalços se impuseram no caminho da montagem. A começar pelo sorteio das datas em que cada uma das seis companhias aprovadas pelo edital do Teatro Novelas Curitibanas ocuparia o espaço. Por causa de uma série de recursos impetrados, a decisão saiu apenas no dia 5 de dezembro, restando dois meses (cortados pelos feriados de Natal e ano-novo) para ensaios. Somaram-se a esse atraso outros contratempos. Conflitos humanos no próprio grupo, com a saída de grande parte dos atores do elenco original da companhia. Alexandre Nero estava comprometido com uma novela, e as atrizes Tatiana Blum e Sol Faganello seguiram outro rumo.

No fim das contas, Diego e Alan Raffo, os únicos integrantes restantes, uniram-se a atores convidados para um trabalho em regime colaborativo: Patrícia Kamis (National Kids), Patrícia Ramos (Aconteceu no Brasil Enquanto o Ônibus Não Vem), Gabriel Gorosito (Henfil Já!) e a bailarina uruguaia Mariana Gômez.

Os seis assumem, em momentos diferentes, o personagem-condutor do espetáculo, um soldado que narra sua participação na guerra – retirado do trecho mais longo do livro, de três páginas. Os demais fragmentos – notícias curtas – foram divididos em temas e inspiraram cenas recontextualizadas, em uma tentativa de escapar da obviedade de usar o jornal do título como cenário. "Calúnia", por exemplo, se passa em um salão de beleza.

Serviço:

Jornal da Guerra Contra os Taedos. Teatro Novelas Curitibanas (R. Carlos Cavalcanti, 1.222), (41) 3321-3358. Direção de Diego Fortes. Com Alan Raffo, Diego Fortes, Gabriel Gorosito, Mariana Gómez, Patrícia Kamis e Patricia Ramos. Quarta a sábado, às 21 horas, e domingo, às 19 horas. Ingresso é uma lata de leite em pó. Até 15 de março.

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