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Rodrigo Díaz de Vivar, El Cid
Rodrigo Díaz de Vivar, El Cid| Foto:

Era para ser um evento de aproximação entre a família Ferreira Gomes e a família Lula – ou, mais precisamente, entre o já derrotado Ciro Gomes e o futuro derrotado Fernando Haddad. Era para ser, mas não contavam com a astúcia – e com a fúria – de El Cid.

Cercado por fiéis, concede: votaria em Fernando Haddad porque ele é boa pessoa, tem méritos, mas convoca: que algum companheiro fale aos seus da necessidade de uma autocrítica séria, inteira, veraz.

Foi como xingar a mãe. No caso, o pai.

Autocrítica é palavra que não consta no criterioso dicionário petista. Um militante rosna qualquer coisa sobre Lula, ao que Cid Gomes rebate: “Lula tá preso, babaca!” Confusão armada, o irmão de Ciro enfrenta os apupos e gritos de uma multidão fanática que não admite crítica, não sabe autocrítica, não permite que levantem a voz para difamar o nome do poderoso chefão ou do caridoso painho.

O cearense arretado não se intimida e desfia um rosário de verdades que continuam a ser verdadeiras, ainda que tenham sido proferidas por quem foram. Os Ferreira Gomes, em geral, e Ciro, em particular, estão longe, muito longe de ter toda essa moral para apontar dedos contra Lula e o PT. Para começar, porque sempre flertaram com a moça que agora esnobam; sempre quiseram comer no prato em que agora cospem.

O ódio é fungo do amor não correspondido.

Não sei bem o que se passou ali. Terá Cid Gomes forçado um afastamento, chutado o cachorro morto, para viabilizar o sobrenome da família às presidenciais de 2022? Faria sentido. Ciro precisa reposicionar a marca, como dizem os publicitários. Ou ele enfrenta o PT e se aparta de vez, assumindo-se como oposição e alternativa, ou morrerá de rostinho colado ao partido que nunca lhe deu apoio como protagonista.

A história entre eles é longa e cheia de reviravoltas, idas e vindas, tapas e beijos, rompimentos e perdões. Não duvido que essa briga acabe servindo como forma de reaproximação. A conferir. Por outro lado, quanto ao necessário aggiornamento petista, há muito não acredito que possa acontecer. Isso não parece constar na pauta dos líderes.

Discuti com amigos as razões e desrazões pelas quais Fernando Haddad não fez o bendito “movimento ao centro”, de que tanto se fala. Muita gente (no mercado, inclusive) esperava por isso. Se Haddad ajustasse a própria trajetória e assinasse uma sua versão da “Carta ao Povo Brasileiro”, e somasse forças com a tal frente democrática, e se comprometesse com a ortodoxia econômica e a ordem liberal, talvez tivesse sido páreo para Jair Bolsonaro.

Porém, Fernando Haddad não saiu do lugar. Fez questão de deixar mercados e jornalistas no mais completo breu, sobre sua equipe e suas intenções futuras. Só parou de visitar Lula na cadeia porque este é mais pragmático. Haddad fincou pé numa campanha suicida que, em seus últimos suspiros de agonia, quer imitar a de seu adversário.

Talvez o PT não tenha feito a autocrítica por método e engenho. Fazê-la seria assumir erros, culpas, crimes e responsabilidades e, por consequência, dar aos inimigos o poder sobre sua própria narrativa. Seria assumir: não houve golpe coisa nenhuma, os inimigos estavam certos o tempo todo. Mas o Partido dos Trabalhadores quer se manter vivo oposição e não pode ceder um milímetro sequer do controle de sua autobiografia.

Meu palpite, no entanto, é que o PT não quis fazer a autocrítica porque não sabe – não pode – fazê-la.  Não fez autocrítica porque não se reconhece como passível de crítica. Para Lula, Haddad e companhia, autocrítica quem faz é o PSDB, até de seus acertos; autocrítica quem faz é quem errou. O PT não reconhece seus erros porque não acredita que um dia errou ou errará. Não se pode pedir perdão de pecados não cometidos.

Porque não se trata de um partido como os outros, mas de uma espécie de categoria política com a qual todos deveriam se medir, por aproximação e afastamento, na história brasileira. O PT é o “Príncipe” de Maquiavel, encarnado na razão partidária, que só responde à própria consciência e a mais ninguém. Prefere morrer em seus termos a ter de sobreviver nos termos dos outros. Egocêntricos como crianças na fase oral, os lulopetistas estão dispostos a sugar tudo o que puderem, até a última gota, ainda que isso venha a destruir a fonte do leite que sugam.

Às vezes, a resposta mais simples é mesmo a mais verdadeira: Lula tá preso, babaca.

 

 

 

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