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Luccas Neto (à esquerda) e o irmão Felipe Neto
Luccas Neto (à esquerda) e o irmão Felipe Neto| Foto: Reprodução

Depois de ter postado em suas redes sociais um vídeo compilando falas de influenciadores digitais relacionadas a sexo, a atriz e apresentadora Antonia Fontenelle encampou na internet uma briga que foi parar na Justiça e recentemente ganhou contornos políticos. Ela tem compartilhado em seus perfis vídeos de mães que se indignaram com o comportamento de dois desses influenciadores expostos, os irmãos Luccas e Felipe Neto, e ajudou a impulsionar a hashtag #MãesContraFelipeNeto, que apareceu entre as mais comentadas do Brasil na primeira semana de julho de 2020.

A postagem em questão apresentava um vídeo editado, e trazia falas, entre outras pessoas, dos irmãos youtubers. Luccas Neto aparece no vídeo pegando uma garrafa de dentro de um freezer e olha para a câmera, perguntando se pode fazer “besteirinhas” com ela. Na sequência, ele introduz o gargalo da garrafa na boca, faz movimentos repetitivos e fala “meu Deus, é por isso que eu gostei tanto”.

Felipe Neto, por sua vez, é mostrado em uma sequência onde fala de uma menina que estaria com raiva por odiá-lo, e mesmo assim ter tido “sonhos eróticos” com ele. “A menina, ela é tão ‘hater’, mas tão ‘hater’ que não percebe que me ama. Aí ela fica culpada porque teve um sonho erótico comigo. É mole uma p... dessa?” Felipe ainda fala que vai “mandar desenvolver” um acessório erótico com o rosto dele.

Os dois ingressaram com uma ação na Justiça contra Antonia, pedindo R$ 200 mil de indenização – metade para cada um – além de uma retratação pública e da retirada da postagem. A postagem original, que trazia um questionamento de Fontenelle sobre uma possível “incitação à pedofilia a olhos nus” foi apagada, mas segundo a atriz a retratação e o pagamento da indenização não vão acontecer tão cedo. “Soube que os advogados do imoral do Felipe Neto entraram com 1 pedido sei lá pra que relacionado ao meu Facebook e meu Instagram hahahahaha mooorrttaa. Só digo uma coisa, se entrarem numa de derrubar minhas redes, vocês irão saber que é terceira guerra mundial. E tenho dito”, postou ela no Twitter.

Felipe e Luccas Neto se defendem das acusações dizendo que os vídeos são antigos e que foram editados para serem tirados de contexto. Mais especificamente no caso do vídeo com a garrafa (feita de açúcar segundo o youtuber), Luccas explicou que a ordem das falas foi alterada, e isso tirou todo o sentido da gravação original. Ele também garante que conteúdos antigos produzidos por ele e hoje considerados impróprios para as crianças vêm sendo tirados do ar ou colocados sob restrição de idade no YouTube.

Mães contra e a favor

A tag #MãesContraFelipeNeto já era usada no Twitter desde 2018, mas não aparece nas pesquisas no espaço de tempo entre 6 de novembro daquele ano e 15 de junho de 2020, data do polêmico post de Fontenelle. Em comum, mães indignadas com o youtuber – nas citações mais recentes há também bastante apoio à atriz e preocupação com a educação dos filhos. Algumas manifestações tratam Felipe Neto como “lixo humano”, e em outras as mães falam a respeito de “vacinar” seus filhos “contra o progressismo nojento”.

Felipe Neto, por sua vez, está impulsionando outra tag: #MãesComFelipeNeto. Assim como Antonia Fontenelle, ele tem publicado vídeos e fotos de mães, mas que nesse caso apoiam o trabalho dele. Em entrevista à Época, Felipe disse que a “adesão está fantástica, realmente impressionante”, e que os conteúdos produzidos atualmente não são impróprios para menores. “O objetivo é a gente mostrar que essa ideia de que o conteúdo seria impróprio para menores de idade é uma mentira, criada por pessoas que querem destruir reputação, muito por motivos políticos, tanto que se você entrar no perfil dessas pessoas, quase sempre encontra posts politizados, defendendo o governo, o presidente da república.”

Politização

A suposta motivação política citada por Felipe Neto encontra guarida quando se analisa o uso das tags nas redes sociais. Uma ferramenta gratuita disponível na internet traz uma possível associação da crítica ao youtuber a postagens a favor do presidente Bolsonaro: muitos dos que postaram #MãesContraFelipeNeto também postaram #BolsonaroTemRazão, de acordo com a ferramenta.

Outro mecanismo que analisa a postagem de tags por contas cujo comportamento pode ser associado a robôs do Twitter mantinha na manhã de 10 de julho o termo #MãesContraFelipeNeto entre os 10 mais usados por contas “não autênticas”. A ferramenta garante que usa inteligência artificial para fazer esse tipo de análise, mas não é incomum encontrar na rede ações de empresas de tecnologia que diminuem o alcance dos conservadores na internet.

Responsabilidades

Em um mundo virtual onde conteúdos impróprios estão a poucos cliques de distância – e onde empresas relacionadas à pornografia podem estar mirando suas armas nas crianças – cabe aos pais e responsáveis serem os primeiros filtros de conteúdos acessados pelos pequenos. Em outras palavras, se um vídeo na internet influencia mais os pequenos do que a educação dada pelos pais, os adultos precisam rever seus próprios conceitos.

Segundo a psicóloga Adriana Loti Dias, a geração atual de crianças é diferente, mais questionadora, e isso acaba trazendo uma dificuldade a mais para os pais. “Essas crianças não se submetem, não obedecem cegamente, e vão ser mais desafiadoras e dar trabalho”, disse. Os pais, aponta a especialista, precisam encontrar um meio termo entre a proibição total e a permissividade, e esse diálogo com os filhos precisa começar desde cedo. “Os pais têm que ter a consciência de que em vez de impor regras, o importante é trazer as crianças para fazer as próprias regras da casa. Como vai ser a rotina, em que momentos a gente vai poder pegar o celular, assistir a alguma coisa na televisão ou computador. Isso tem que ser feito de uma forma que a criança participe, se sinta pertencente, porque senão se criam embates e disputas de poder. Essa relação de diálogo e confiança com a criança sobre perigos como atravessar a rua, sobre um desconhecido oferecer algo a elas, tem que ser construída desde cedo. Isso ajuda a própria criança a entender o que é legal e o que não é.”

Do outro lado da tela, quem gera material com potencial audiência infantil também precisa ter suas responsabilidades. É o que afirma a influenciadora digital Mariana Bernini, que coordena os papeis de mãe com o de produtora de conteúdo para a internet. Ela sabe que o público de suas redes é composto na maioria por mulheres, muitas delas mães, e que algumas espectadoras têm o costume de consumir o conteúdo postado por ela junto com os filhos.

O foco do trabalho não são vídeos de temática infantil, aponta. “Eu crio conteúdos para isso também, para que as crianças possam assistir. O que eu gravo com meus filhos tento fazer de forma bem educativa, e se eu posto é para que agregue algum valor. Meu intuito é que os pais possam consumir isso com os filhos”, disse.

E quando percebe que alguma de suas postagens voltada aos adultos pode ser imprópria para as crianças, Mariana diz usar uma espécie de alerta para as mães.

“Eu fiz uma postagem que teve conteúdo adulto, um dispensador de álcool em gel em um sex shop, teve milhares de compartilhamentos, uma repercussão enorme. Mas antes disso eu tive o cuidado de colocar uma tela vermelha escrito: ‘o próximo conteúdo é para maiores de 18 anos. Mamães, não assistam na frente dos filhos’. E sempre que eu vou mostrar algo que é impróprio para as crianças, eu coloco algo como ‘se o seu filho estiver do lado pare de assistir agora’.”

Ela também disse que limita o acesso dos filhos às telas, e reconhece a importância dos pais na filtragem e escolha do que as crianças devem assistir. “Se você dá livre acesso ao filho, ele vai ver esse tipo de conteúdo impróprio sem a sua presença. E por mais que não seja algo pornográfico, é muito ruim quando uma criança descobre por si só, na internet, um conteúdo que precisa ser tratado com muito cuidado e com responsabilidade pelos pais.”

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