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| Foto: Leticia Akemi/Gazeta do Povo

Conseguir documento de identidade em Curitiba é mais difícil do que garantir um ingresso para a Copa da Rússia. A média de espera dos curitibanos que acessam o site do Instituto de Identificação do Paraná (IIPR) para agendar atendimento é de dias e até meses. O tempo de espera na fila virtual para garantir espaço em um dos 12 estádios no maior torneio mundial de futebol é de algumas horas. Um dos motivos para esse descompasso é simples: faltam servidores. O governo anunciou abertura de concurso e processo de terceirização para ampliar o atendimento, porém, sem prazo definido. Enquanto isto, vagarosamente a estrutura física na capital vai sendo ampliada. A dúvida fica na eficácia da medida, já que os novos postos serão operados com o contingente atual.

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Talvez você já tenha passado pela experiência. Entrar no site do Instituto de Identificação para tentar agendar o atendimento para fazer a carteira de identidade e se deparar com a seguinte resposta: “no momento, não tem horários disponíveis no município de Curitiba”. O jeito foi seguir tentando, correto? Então aqui vai uma dica: uma boa estratégia é abrir a página virtual pouco antes das 9 horas, horário de abertura das vagas, esperar o relógio rodar e ser rápido. Parece uma gincana. Os 387 primeiros levam o prêmio, processo que demora em torno de 15 minutos. Depois disso, só no dia seguinte.

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A explicação é simples: falta gente. De acordo com o Instituto de Identificação, o Paraná conta com 283 papiloscopistas, profissionais responsáveis por realizarem a identificação humana, para atender todo o estado. Um quadro já defasado considerando que o estado possui 500 vagas. Mas, de acordo com as contas do Sindicato das Classes Policiais Civis do Paraná (Sinclapol), a quantidade de profissionais que está na ativa é ainda menor. “Eles não estão considerando os policiais que estão afastados por licença-médica, por exemplo. Além do que 12 papiloscopistas estão fora da função”, critica o vice-presidente do Sindicato, Daniel Luiz Santiago Côrtes.

De acordo com ele, para que o serviço prestado pelo Instituto de Identificação fosse ideal seriam necessários 750 policiais com essa especialidade, lembrando que eles atuam em outras áreas que também são prejudicadas pelo baixo contingente, como na coleta de pistas em locais de crime. O último concurso estadual para a função foi realizado em 2010. Os aprovados foram empossados aos poucos. A última leva de nomeados foi contratada ano passado, totalizando 116 profissionais efetivados ao longo de oito anos, informou o órgão.

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Isso explica porque o número atual não é suficiente para alocar um servidor em cada um dos 399 municípios do Paraná. Grandes centros como Curitiba, Londrina, Foz do Iguaçu e Maringá exigem mais de um profissional para dar conta da demanda. Nas cidades que não têm papiloscopista, ou naquelas em que há alto fluxo de trabalho, servidores públicos municipais são treinados para realizar a função ou a administração pública firma contratos para terceirização. “Nas cidades em que o atendimento é feito por servidores ou terceiros, o correto é que um papiloscopista da Polícia Civil supervisione e coordene o trabalho”, adverte Côrtes.

O ex-governador Beto Richa anunciou a abertura de novo concurso para ampliar o quadro de policiais civis no estado, porém, ainda não há data estabelecida nem para a entrega do edital. Atendendo ao questionamento da Gazeta do Povo, no fim de abril, a assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública e Administração Penitenciária do Paraná (Sesp) informou que o protocolo para abertura de concurso público para a carreira de papiloscopista está tramitando dentro das secretarias de governo. “Nas próximas semanas, o protocolo será encaminhado para a Secretaria da Fazenda e da Administração para os devidos pareceres. Somente após esta etapa poderemos informar com mais precisão informações como número de vagas a serem abertas e o efetivo início das atividades”, explicou a pasta por meio de nota.

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Outra solução anunciada pelo governo foi a contratação de terceirizados. Sobre essa medida, que já parecia estar mais avançada, a Sesp informou que houve a necessidade de alteração do termo de referência, por isto o processo retornou à secretaria. O protocolo tem ainda que tramitar pelas secretarias de Governo até que seja finalmente aprovado com detalhamento sobre o modelo de concorrência e funções a serem abertas. “Ambos [concurso e contrato com terceiros] desafogariam a demanda represada. Vale lembrar que a implantação efetiva dos postos nas Ruas da Cidadania deverá dar vazão à demanda assim que estiverem todos os postos em funcionamento”, afirmou o diretor do IIPR, Marcus Michelotto.

O último item citado por Michelotto já está em execução, porém, em ritmo lento. Richa havia anunciado, no início de março, que as dez regionais de Curitiba ganhariam postos de atendimento para a emissão de carteiras de identidade. Contudo, o convênio entre prefeitura de Curitiba e governo do Paraná para a cessão dos espaços destinados ao serviço foi efetivado somente um mês depois. “Ainda não temos as 10 regionais com postos do Instituto de Identificação em funcionamento por questões jurídicas (convênio), algumas reformas também atrasaram a implantação total. Até agora, temos quatro regionais em funcionamento, e nas demais, os espaços já estão sendo reformados para adequar tudo que é necessário, como por exemplo as instalações de rede lógicas. Assim que os trabalhos sejam finalizados, brevemente iniciarão o funcionamento”, explica o diretor.

Sistema sobrecarregado

Michelotto reconhece a grande procura no agendamento do documento de identidade via internet. Mas o motivo desta alta demanda, segundo ele, não está relacionado diretamente a um aumento da população. “Antigamente, o cidadão ficava uma vida toda com um RG. Atualmente, órgãos públicos e entidades privadas pedem RGs atualizados, mesmo sem existir um prazo de validade. Para matrícula escolar, emissão de passaportes, recadastramento da aposentadoria também são exigidos o documento atualizado”, argumenta.

Para algumas fontes ouvidas pela Gazeta do Povo, o problema não é recente. É que nos últimos anos ele ficou mais notório por reflexo da diminuição no quadro do Instituto de Identificação, que ainda tem a função de realizar a identificação de presos, perícia criminal, exames em laboratórios e atualização do histórico criminal. Por isso, a informatização do sistema de agendamento para a produção das carteiras de identidade não foi suficiente para dar conta do recado.

Até 2012, quem desejava emitir a primeira ou segunda via da carteira de identidade tinha que se deslocar a um dos postos de atendimento e enfrentar a fila. “Era um transtorno fazer o cidadão sair de casa, ficar em filas, e por fim acabar não sendo atendido. O agendamento online visa dar comodidade ao cidadão, que já sai de casa sabendo que será atendido e sem qualquer espera”, diz Michelotto. Nos casos em que a pessoa não tenha acesso à internet, ela poderá se dirigir ao posto de identificação e aguardar uma vaga de encaixe, torcendo pela falta de alguém que tenha agendado.

O problema das filas, no entanto, saiu do mundo real e foi para o virtual. A maior crítica dos usuários do serviço está na impossibilidade de agendar o atendimento. São abertas somente vagas para a semana e que se esgotam muito rápido, obrigando o usuário criar uma rotina em frente ao computador todos os dias até conseguir. O agendamento pela internet é único caminho para conseguir a carteira de identidade, com exceção dos casos especiais e de urgência que devem ser comprovados por meio de documentos. Pior para quem não tem acesso à internet em casa ou no trabalho. Para o diretor do Instituto de Identificação , o modelo adotado para o agendamento não precisa ser alterado: “Entendemos que o aumento da capacidade com as medidas anunciadas são a solução”.

Enquanto as medidas não são colocadas em prática, o Instituto de Identificação encontra nos mutirões realizados nas Ruas da Cidadania uma maneira de atender as pessoas de maneira presencial e desafogar o sistema. Desde o inicio de 2017, foram feitos mais de 46 mil documentos nesses eventos. Mas quem se viu obrigado a optar por essa modalidade de atendimento enfrentou grandes filas e algumas pessoas esperaram até 17 horas para serem atendidas.

Esta foi a situação vivida pelo mecânico Luiz Antônio Gonçalves, de 34 anos. Gonçalves teve seu documento furtado em um fim de semana e precisava de um novo RG para disputar uma vaga de emprego. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele contou que entrou na fila do mutirão realizado na Rua da Cidadania do Pinheirinho às 16h30 e só foi atendido às 9 horas do dia seguinte. A auxiliar de padaria Rosangela Miranda Barbosa também relatou a mesma situação. Ao lado das filhas de 12 e 15 anos, dormiu no chão da rampa de acesso para poder ser atendida na manhã seguinte.

Poupatempo

No estado com a capital mais populosa do Brasil, São Paulo, o Poupatempo – programa que facilita o acesso das pessoas a diversos documentos – poderia servir de exemplo a ser seguido no Paraná. O recurso disponibilizado pelos paulistanos, por exemplo, foi a solução encontrada pela agrônoma Manuella Boldrini Francisco no ano passado, quando precisou da segunda via da carteira de identidade. Depois de ser informada que deveria apresentar o documento original para emitir a carteira de trabalho, mesmo morando em Curitiba há seis anos, preferiu realizar o processo em São Paulo, onde vivem os pais. “Agendei por telefone e fiz tudo na unidade de atendimento de Limeira em apenas 15 minutos”, conta.

O serviço utilizado por Manuella existe desde 1997, mas somente há cinco anos implementou o sistema de agendamento online. Diferente do paranaense, por lá são oferecidos diversos canais para o agendamento. O usuário pode recorrer a totens espalhados em shoppings, supermercados e estações de trem e metrô. Além do número de telefone gratuito, é possível se dirigir a qualquer das 72 unidades. Neste caso, o solicitante será encaminhado para uma área de agendamento e então atendido conforme a grade de horários disponíveis, o que pode acontecer no mesmo dia. O volume de documentos realizados por meio do Poupatempo é espantoso. De acordo com a assessoria de imprensa, são realizados 124 mil atendimentos em média por dia, sendo 14.250 referentes ao documento de identidade. Só na capital do estado, são atendidas diariamente 27,2 mil pessoas, das quais 4.853 estão atrás de novos RGs. Somente neste ano, foram realizados mais de 10,3 milhões de atendimentos levando em conta todos os documentos disponibilizados.

A reportagem da Gazeta do Povo fez o teste. Durante uma semana tentou programar o atendimento para a realização da primeira via da carteira de identidade pelo site do Instituto de Identificação em diferentes horários. Sem sucesso. Logo na primeira tentativa pelo Poupatempo, após um rápido cadastro, às 16h30 de 24 de abril, agendamos o atendimento na unidade de Santo Amaro para o dia seguinte. O atendimento foi cancelado em seguida para não ocupar o horário de quem realmente precisava.

Dicas para vencer a corrida pelo RG

- Entre na página do Instituto de Identificação minutos antes da abertura dos agendamentos, assim você estará entre os primeiros às 9 horas.

- Como as vagas abrem com apenas sete dias de antecedência e o sistema está sobrecarregado, seu atendimento sempre será agendado para a semana seguinte.Isto quer dizer que sábado e domingo são dias em que dificilmente você encontrará uma vaga, somente caso alguém tenha desistido do atendimento e feito a gentileza de cancelar pelo site.

- Tentar agendamento em feriados que caem em dia de semana é uma ótima ideia. O atendimento será marcado para o mesmo dia da semana seguinte, que será útil. Quase ninguém se dá conta deste detalhe. O contrário também vale. É má ideia tentar agendamento em um dia útil, mas que na semana seguinte será feriado.

- Tenha em mente o local e horário para o atendimento. Pessoas perderam a vaga por demorarem no preenchimento destes dados

- Em algumas cidades da Região Metropolitana de Curitiba é mais fácil conseguir vagas: Adrianópolis, Cerro Azul, Doutor Ulysses, Piên e Rio Negro são as mais indicadas. A primeira é a mais distante da capital, a viagem leva cerca de 2h40, e a última é a mais próxima, média de 1h40.

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