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 | Arquivo da família/
| Foto: Arquivo da família/

Um cartaz em frente a uma casa na Vila Torres, em Curitiba, estampa o agradecimento da família de José Francisco Anchieta Sanches, o Baleia, pelo carinho dedicado pela comunidade a um de seus membros mais queridos, falecido em setembro aos 57 anos. Sua partida foi tão repentina – duas semanas entre a descoberta de que estava doente e a morte – que algumas pessoas ainda aparecem na mercearia de Baleia e, ao saber do falecimento, saem às lágrimas. Crianças contam como ele as ajudava, seja com um salgado para levar para a escola ou com um gibi emprestado. Moradores de rua, ao passar por sua casa, murmuram “Esse é o cara”.

Baleia cresceu junto com a Vila, morando no local há mais de 50 anos, e deve até seu apelido, que pegou mais que o próprio nome, ao local. A história que a família conta é que o José criança, além de pequeno, era também gordinho e, ao brincar no rio Belém, ganhou o nome do mamífero marinho. Adulto, levaria o nome como trocadilho para um dos vários negócios que empreendeu no local onde cresceu. De mercadinhos a carrinhos de churrasco, de catador de latinhas a trabalhador no Japão, Baleia passou pelas mais diversas funções. Um dos comércios que abriu, o Bar Baleia tinha, na fachada, o desenho de um homem barbado lendo um livro.

Longe de ser coincidência ou vazio aproveitamento de um jogo de palavras, a ilustração retratava uma das lutas de Baleia: trazer o hábito da leitura para a comunidade, especialmente para as crianças. Teve na biblioteca colaborativa da Vila Torres, ideia sua, a realização do sonho do menino que precisou, com um pai alcoólatra, parar de estudar para ajudar a mãe a criar os seis irmãos. Conhecedor não só da história da localidade, como das pessoas que construíram a comunidade, organizou um museu com fotos dos moradores mais antigos.

As ações de Baleia na região, sem que nunca esperasse algo em troca além da melhora na qualidade de vida dos envolvidos, deixam marcas além das que ficam na memória dos moradores. Dedicado à terra e às plantas, levou o que já cultivava na frente de casa para um espaço comunitário, a praça da Vila. Ali, árvores frutíferas, flores e bancos, complementados por frases que ele gostava de deixar no local, colorem a área e servem de refúgio para os moradores de rua que procuram água fresca – que Baleia nunca deixava faltar – sombra ou um local para descansar.

Fosse em parceria com restaurantes amigos ou não, fornecia marmitas para os moradores de rua. O café, que poderia ser cobrado, já que era vendido em sua mercearia, era dado gratuitamente a eles. Mas nada lhe dava mais prazer do que os churrascos de final de semana, dos quais era quase impossível algum vizinho sair sem um pão com carne na mão. No Natal, maionese, arroz de forno, chester e o tradicional churrasco eram pratos compartilhados entre a família Baleia e os moradores de rua.

A formação dessa família também tem a Vila como personagem principal. Foi nos jogos do Flamenguinho – time da comunidade que reunia os homens, que jogavam futebol, as mulheres, que gostavam da união e de um dedo de prosa, e as crianças, que brincavam juntas – que Baleia conheceu sua segunda esposa, Neuza Maria da Silva, e companheira por 35 anos de vida. A generosidade e a capacidade que Baleia tinha de se colocar no lugar do outro permanecem em quem conviveu com ele. Deixa esposa, quatro filhos e cinco netos.

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