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O ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura: pasta negocia agenda de quase 20 itens com representantes de caminhoneiros para evitar nova greve.
O ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura: pasta negocia agenda de quase 20 itens com representantes de caminhoneiros para evitar nova greve.| Foto: Ricardo Botelho/MInfra

A sinalização do governo federal em reduzir o PIS/Cofins sobre o diesel não é a única medida estudada para conter uma possível greve dos caminhoneiros. Embora tenha vindo logo após o anúncio de aumento no preço do combustível, o gesto tem relação com uma extensa agenda debatida há tempos entre órgãos do governo e a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), uma das entidades que representam a categoria.

A Gazeta do Povo teve acesso com exclusividade a 19 itens da pauta de diálogos entre CNTA e governo, tendo, sobretudo, o Ministério da Infraestrutura como interlocutor direto.

Dentro dessa agenda estão desde medidas em discussão ainda inicial a outras mais maduras para serem executadas. Entre os itens estão questões como alterações nas normas de pesagem, fiscalização do piso do frete, incentivo à renovação de frota e crédito para a manutenção dos caminhões.

Um dos pedidos dos caminhoneiros já foi atendido. A categoria cobrava o combate a práticas anticoncorrenciais no mercado de reposição de pneus de carga e a eliminação de proteções à indústria nacional que encareciam os pneus importados. Em resposta, o Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Camex), do Ministério da Economia, reduziu a zero o imposto de importação sobre pneus de caminhão a partir de 20 de janeiro. A alíquota vigente era de 16%.

Agora, o governo sinaliza com a possibilidade de redução do PIS/Cofins sobre o diesel, conforme o próprio presidente Jair Bolsonaro anunciou. Como contrapartida, para não perder arrecadação, o Executivo estuda aumentar a tributação de automóveis adaptados para deficientes que custem mais de R$ 70 mil, segundo o site "Poder360".

Apesar do estreito diálogo do governo com a CNTA, outras associações articulam uma paralisação para 1.º de fevereiro. A insatisfação cresceu após o anúncio de reajuste no preço do diesel, no início desta semana. Dependendo do caminhão e do tempo de uso, o combustível pode representar de 33% a até 50% dos custos de um caminhoneiro autônomo.

Entre entidades que apoiam greve estão a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte e Logística (CNTTL), a Federação Única dos Petroleiros (FUP), o Conselho Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas (CNTRC) e a Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava).

Como se dá o diálogo entre governo e caminhoneiros

A CNTA sustenta que nenhuma das medidas que vieram a público nos últimos dias é um aceno específico do governo para conter a paralisação marcada para 1º de fevereiro.

Uma das iniciativas sinalizadas pelo governo, a possibilidade de reduzir o PIS/Cofins sobre o diesel, já era debatida – mas ganhou velocidade após a decisão da Petrobras de reajustar o preço do combustível.

“Não tem nada a ver dizer que o governo cedeu às pressões que estão aí através dessa possível greve e, por isso, acenou em relação aos pneus e ao diesel. Tudo isso é fruto de um trabalho amadurecido após dois anos de intenso profissionalismo no diálogo com o governo”, disse à Gazeta do Povo o assessor executivo da entidade, Marlon Maues.

A fim de evitar uma greve como a de 2018 e melhorar as condições dos caminhoneiros, categoria que votou em peso no presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, procurou manter um diálogo próximo com lideranças da categoria.

Ele rompeu com algumas delas no fim de 2020, depois que veio à tona a articulação para uma greve. A partir dali, o diálogo com a CNTA se estreitou mais. Por meio da Secretaria Nacional de Transporte Terrestre (SNTT), o ministério tem reuniões periódicas com a entidade e líderes associados.

Como o Ministério da Infraestrutura reagiu ao reajuste do diesel

Mesmo com todo o bom relacionamento entre governo, CNTA e as lideranças mais próximas, o Ministério da Infraestrutura sentiu que o termômetro político de uma greve foi às alturas quando a Petrobras anunciou, na terça-feira (26), um reajuste de mais de 4% sobre o diesel. O próprio ministro Tarcísio de Freitas foi pego de surpresa com o reajuste.

O Ministério da Infraestrutura mantém diálogo permanente com todas as demais pastas do governo que, de alguma forma, influenciam na política de transporte terrestre. O Ministério da Economia é uma delas. Freitas sabia que o aumento do diesel às vésperas da paralisação colocaria os nervos dos caminhoneiros autônomos à flor da pele e até poderia até antecipar uma greve. Mas, nas conversas com técnicos da equipe econômica, não se tinha a informação de um reajuste dos combustíveis por agora.

Tão logo Freitas tomou conhecimento do reajuste, pôs a cúpula do ministério em reunião para discutir medidas para acalmar os ânimos. O diretor do Departamento de Planejamento, Gestão e Projetos Especiais, Luciano Lourenço e o secretário da SNTT, Marcello da Costa, foram à Secretaria-Executiva da pasta, chefiada por Marcelo Sampaio, para preparar uma resposta. Dali, saiu a decisão de acenar com a redução de PIS/Cofins.

Até a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi pega desprevenida com o reajuste, apurou a Gazeta do Povo. O órgão monitora situações com potencial de desestabilizar o país, como uma greve dos caminhoneiros e os estopins para isso. Um abrupto aumento sobre o diesel vinha sendo apontado como a gota d’água mesmo por caminhoneiros contrários à greve. O combustível representa entre 33,6% a 38,5% do custo médio de operação de um caminhão novo, mas a proporção chega a 50% para autônomos com um veículo com 20 anos de uso.

Os 19 itens da pauta debatida entre governo e caminhoneiros

A proposta de redução tributária sobre o diesel foi bem recebida pela categoria, mas mesmo caminhoneiros alinhados com o governo questionam a viabilidade e celeridade da medida.

O ministro Tarcísio de Freitas e líderes da categoria entendem que somente as estratégias conduzidas até então para desmobilizar lideranças favoráveis à paralisação seriam insuficientes para segurar o ímpeto dos autônomos grevistas.

Para apaziguar os ânimos, a CNTA intensificou as articulações com o Ministério da Infraestrutura e a categoria nos últimos dias. Confira a seguir os itens da agenda debatida entre governo e caminhoneiros:

1. Alteração das normas de pesagem

Os caminhoneiros autônomos defendem a mudança da pesagem, atualmente feita por eixo, para uma medição de peso bruto total (PBT). Resta um acordo com o Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que defende um PBT acima de 50 toneladas. A categoria tenta pleitear uma medição independentemente do volume da carga.

2. Promover a aproximação com a PRF

A categoria pleiteia o estabelecimento de novos parâmetros de policiamento nas rodovias federais e um relacionamento melhor com os agentes da Polícia Rodoviária Federal.

3. Acompanhamento da implantação dos PPDs

Caminhoneiros cobram a instalação dos pontos de parada e descanso (PPDs) e sua inclusão obrigatória nos novos processos de concessão de rodovias. Estruturas garantem repouso mais confortável e seguro.

4. Foco no aperfeiçoamento e implantação do DT-e

O Documento Eletrônico de Transporte (DT-e) vai unificar cerca de 20 documentos que são exigidos para operações de transporte de carga no país. Sua implantação favorecerá a contratação direta do autônomo pelo embarcador.

5. Inclusão do quarto eixo na agenda regulatória

Algumas empresas, hoje, modificam sob encomenda carretas para acoplar um quarto eixo. Isso é feito na informalidade e os caminhoneiros pedem que o Contran regulamente o assunto.

6. Crédito para programa de manutenção veicular via Cartão BNDES

Caminhoneiros pleiteiam via cartão caminhoneiro do BNDES uma linha de crédito para fazer a compra de peças para a manutenção do caminhão. Em 2019, o banco liberou uma linha de R$ 100 mil aos autônomos que, em geral, não conseguiram obter nos bancos.

7. Análise sobre custo e preço dos pneus no Brasil

O imposto de importação de pneus favorecia um quase monopólio no mercado nacional, na avaliação dos caminhoneiros. Eles pediam o combate a práticas anticoncorrenciais no mercado de reposição de pneus de carga e eliminação da proteção à indústria nacional. Em resposta, o governo zerou o imposto de importação.

8. Redução das alíquotas do PIS e Cofins incidentes sobre o diesel

Outra medida acenada pelo governo. O presidente Jair Bolsonaro alerta, contudo, que cada centavo de redução no PIS/Cofins sobre o combustível teria impacto de R$ 800 milhões aos cofres públicos. O governo, por isso, corre atrás de medidas para compensar a perda de arrecadação. Uma alternativa em estudo é aumentar a tributação de automóveis adaptados para deficientes que custem mais de R$ 70 mil.

9. Efetivação do programa de renovação de frota

Caminhoneiros autônomos pedem uma cesta de soluções para viabilizar a troca de um caminhão antigo por um novo sem o aumento da frota de veículos no país. Linha especial do BNDE ou crédito do ICMS são propostas analisadas.

10. Operação dos pátios de triagem nos portos

Transportadores pedem a efetivação e cumprimento das regras da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) em relação à implementação de protocolos de atendimento para recepcionar os caminhões nos portos. Pauta tem apoio da Federação Nacional das Operações Portuárias (Fenop).

11. Rediscussão do Marco Regulatório do Transporte Rodoviário de Cargas

O marco regulatório, que está no Senado, define questões como condições de contratação, pagamentos, seguro do caminhão e da carga, contratação direta entre autônomo e embarcador, entre outras.

12. Contratação direta

A meta é implementar condições para simplificação da contratação direta do autônomo pelo contratante, reduzindo intermediadores, como as transportadoras, e permitindo que o caminhoneiro busque a carga diretamente com os embarcadores.

13. Substituição tributária

Caminhoneiros demandam alterações tributárias visando à paridade fiscal em relação às empresas, de modo que os autônomos possam usar créditos tributários de ICMS, PIS e Cofins.

14. Revisão de normas do Contran

Caminhoneiros pedem a revisão de normas antigas do Contran para simplificar a burocracia, reduzir custos operacionais e incrementar a produtividade.

15. Fiscalização da aplicação do Vale-Pedágio, Piso Mínimo de Frete e Pagamento Eletrônico de Frete

Autônomos lidam com custos de pedágio não repassados pelas transportadoras e valores do frete abaixo do piso mínimo. Caminhoneiros pedem rigorosa fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

16. Efetiva implementação do CIOT para todos

Caminhoneiros cobram que o Código de Identificação de Operações de Transporte (CIOT) seja aplicado a toda a cadeia do transporte, inclusive as transportadoras. Medida visa garantir que receberão o pagamento do frete conforme os valores contratados.

17. Comprovação da liquidação do frete pelas IPEFs

Categoria exige a implantação efetiva de mecanismos que assegurem o pagamento de todo o valor do frete contratado. É comum os transportadores autônomos receberem 70% do valor adiantado e não serem pagos pelos 30% residuais. Meta é que as Instituições de Pagamento Eletrônico de Frete (IPEFs) reportem tudo à ANTT.

18. Pagamento do frete em conta corrente ou poupança

Categoria quer a exigência de que as IPEFs ofereçam opção de pagamento do frete por meio de depósito em conta corrente ou poupança ou por cartão-frete, de acordo com a escolha do autônomo.

19. Cumprimento da Lei da Estadia

Caminhoneiros pedem fiscalização da ANTT sobre a obrigação do embarcador ou destinatário da carga de fornecer documento hábil para comprovar o horário de chegada do caminhão na origem ou destino.

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