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Por que o novo auxílio emergencial deve ter impacto bem menor na economia
| Foto: Leonardo Sá/Agência Senado

Depois de segurar a queda do PIB brasileiro em 2020, o auxílio emergencial, que voltou a ser pago neste mês, terá impacto limitado em 2021 e economistas veem risco de quedas na atividade econômica já a partir do trimestre iniciado em abril.

Com valores menores e menos parcelas, o benefício – destinado a cidadãos que perderam renda por causa da crise gerada pela pandemia de Covid-19 – deve ter capacidade para fazer frente a necessidades sociais, mas vem sem fôlego para repetir o desempenho do ano passado, quando funcionou como pilar para o crescimento.

Para este ano, o grupo de brasileiros atendidos pelo auxílio emergencial encolheu de 68 milhões para 45,6 milhões, e a ajuda prevista ficou mais restrita. São quatro parcelas mensais (de R$ 150, R$ 250 ou R$ 375 cada), contra os cinco auxílios emergenciais de R$ 600 e outros quatro de R$ 300 pagos entre abril e dezembro passados.

No total, o país destinou R$ 293 bilhões ao auxílio emergencial em 2020, o equivalente a 3,9% do PIB anual. Agora, o montante reservado é de R$ 44 bilhões, o que corresponde a apenas 15% do desembolso do ano passado. Consequentemente, os impactos desses pagamentos na economia também serão muito menores.

Conforme as MPs com o regramento para o pagamento do benefício, o governo foi autorizado a emitir dívida para custear o auxílio emergencial este ano, ou seja, esses R$ 44 bilhões passarão ao largo das regras fiscais vigentes, inclusive o teto de gastos. O pagamento via crédito extraordinário foi liberado por não haver espaço fiscal para a inclusão de mais essa despesa no orçamento 2021.

Na avaliação do economista Fábio Astrauskas, sócio-diretor da consultoria Siegen e professor do Insper, a ameaça ao PIB surge não apenas por causa do auxílio mais enxuto. O especialista destaca que o contexto de 2021 difere muito da situação vivenciada nos primeiros meses da pandemia do coronavírus, quando o governo tomou medidas mais numerosas de olho em auxiliar também negócios afetados pela Covid-19.

"No ano passado, além do auxílio emergencial ter sido para muito mais pessoas, num valor maior e por um tempo maior, ele também foi acompanhado empréstimos, auxílios, medida de redução de jornada de trabalho com congelamento de demissões. Além disso, a gente não teve um momento de fechamento [de atividades] tão forte quanto o movimento que está acontecendo agora. São todos fatores que colaboraram para que o PIB no ano passado acabasse tendo uma queda bastante inferior àquela que se previa no início", resume.

Segundo o economista, o PIB deve recuar neste segundo trimestre e fechar o ano abaixo da previsão do governo federal, que prevê crescimento de 3,2% em 2021. O ponto médio das projeções de consultorias e bancos, em queda há semanas, aponta hoje para uma alta de 3,08%.

O governo quer reeditar – em versões mais enxutas – alguns dos programas citados pelo economista, entre eles o BEm (que permite redução de salário e suspensão de contrato, com pagamento de complemento de renda pelo governo) e o Pronampe (crédito para empresas). Além disso, pretende antecipar o pagamento do 13.º dos aposentados. Mas essas medidas estão atrasadas e não devem sair do papel enquanto o governo não resolver impasses do Orçamento de 2021.

Astrauskas avalia que o dinheiro do auxílio, mais uma vez, deve ir todo para consumo, mas chegará ao bolso de uma população mais empobrecida. De agosto de 2020 para fevereiro de 2021, o número brasileiros que vivem na pobreza triplicou, saindo de R$ 9,5 milhões para 27 milhões, segundo levantamento da Fundação Getulio Vargas.

"A necessidade de essas pessoas terem o mínimo de segurança alimentar é o que está se colocando nesse auxílio emergencial, mas ele vai fazer um efeito bastante menor para um crescimento da economia", ressalta. De acordo com Astrauskas, o valor garantido para a medida e seus impactos, entretanto, não serão suficientes para compensar a perda de atividade econômica experimentada em decorrência de lockdowns e outras restrições, que devem persistir de alguma forma enquanto não houver vacinação em massa.

Vala destacar, em paralelo, que a inflação puxada pela demanda repentina observada em 2020 não deve se repetir. "Restou só uma pressão do dólar, que voltou a ficar num patamar alto, mas estável", afirma.

Brasil perde competitividade sem vacinação

A possibilidade de retração no PIB deste início de ano aparece colada às incertezas sobre a normalização da atividade econômica no país. Ainda afetada pelas restrições adotadas para conter a propagação da doença em meio ao momento mais agudo da pandemia até agora, com UTIs lotadas pelo país e seguidos recordes de mortes, que vem ultrapassando as 4 mil vítimas da Covid-19 ao dia, a economia brasileira será prejudicada também pela vacinação lenta, dizem os economistas.

Arrastando os pés no caminho da imunização, o Brasil tende a demorar mais para ter os negócios locais de portas abertas, mas arrisca levar a pior também no campo do comércio internacional. A comparação aqui, segundo Astrauskas, é com países que aceleraram seus processos de vacinação, já contando com a retomada que viria a reboque.

"Se a gente estivesse em um cenário mundial onde, como no ano passado, todos os países estão enfrentando o problema da Covid sem a ferramenta que chama vacina, todos estavam mais ou menos no mesmo pé de igualdade. Mas este ano é diferente, teremos uma desvantagem competitiva muito grande no cenário internacional", avalia o economista, em referência à possíveis reações econômicas lá fora enquanto o Brasil "patina nesse cenário".

"É muito ruim do ponto de vista competitivo, inclusive de indústrias, exportações, importações, balança comercial. É mais um efeito potencial negativo que nós vamos sofrer por estar largando atrás na corrida", completa, ainda sobre a imunização.

Na leitura de Luciano Nakabashi, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP de Ribeirão Preto, a falta de avanço na vacinação é apenas parte do problema da falta de coordenação nacional. "Pior porque a gente vai ter uma retração no PIB nesse primeiro semestre e isso pode até contaminar o segundo semestre, dependendo do andar da carruagem. A gente está indo para trás, não está nem parado", avalia.

Crescimento sustentado do PIB depende de reformas

Os depósitos do auxílio 2021 começaram a ser feitos na primeira semana de abril, respeitando cronograma definido com base no mês de aniversário dos beneficiários ou no calendário habitual do Bolsa Família para os integrantes do programa que se enquadraram nas novas regras e terão o benefício temporariamente substituído pelo novo auxílio).

A retomada dos pagamentos quase quatro meses depois da última parcela do benefício original foi feita por meio de PEC Emergencial aprovada no Congresso em março. O texto que viabilizou a retomada do auxílio prevê ainda medidas de contenção de gastos, mas os economistas ouvidos pela Gazeta do Povo destacam que o país precisa destravar a pauta das reformas se quiser permitir crescimento mais duradouro nos próximos anos.

Segundo Nakabashi, professor de Economia da USP de Ribeirão Preto, é fundamental ter um avanço na agenda de reformas para abrir mais espaço de manobra para a administração federal.

"O orçamento do governo está muito comprometido com gastos que são obrigatórios, que são vinculados, e para mudar isso tem que ter uma reforma ou reformas ao longo do tempo". O destaque é feito porque, além do problema de curtíssimo prazo, que é a pandemia, soma-se a questão do desequilíbrio fiscal, que impede a estabilidade macroeconômica, fundamental para os investimentos.

Na mesma linha, Fábio Astrauskas lembra que a única das reformas que saiu durante o atual governo foi a reforma previdenciária, cuja economia já se esvaiu o ano passado com o gasto da pandemia. "A gente voltou para a estaca zero", avalia.

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