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Sem acordo com Paulo Guedes, o presidente Jair Bolsonaro sepultou o Renda Brasil e afirmou que continuará apenas com o Bolsa Família
Sem acordo com Paulo Guedes, o presidente Jair Bolsonaro sepultou o Renda Brasil e afirmou que continuará apenas com o Bolsa Família| Foto: Mauro Pimentel/AFP

O presidente Jair Bolsonaro sepultou a ideia de criação do Renda Brasil até o fim de seu mandato, em 2022. Ele disse “vamos continuar com o Bolsa Família e ponto final”. Sem a reformulação do programa de transferência de renda, haverá poucos avanços na área em 2021.

A proposta de orçamento do governo prevê aumento da verba anual do Bolsa Família, atrelada a mais beneficiários. Na prática, isso significa que as famílias que recebem a ajuda não terão nenhum reajuste no valor, tampouco verbas extras, como o 13.º em 2019 ou o auxílio emergencial neste ano.

Além da quebra de expectativa das famílias – já que houve repetidas declarações tanto da equipe econômica em relação ao novo programa quanto do próprio presidente sobre o valor médio do benefício, que não deveria ser inferior a R$ 300 –, há uma questão logística a ser resolvida.

O orçamento proposto pelo governo prevê a ampliação do Bolsa Família para atender até a 15,2 milhões de famílias, sem alterações nas condicionalidades do programa. Não há estimativas de quantas pessoas que receberam auxílio emergencial – que atingiu 67,2 milhões de brasileiros ao custo de R$ 196,2 bilhões até o dia 14 de setembro e ganhou regras mais rígidas na última prorrogação – continuarão em situação de vulnerabilidade após o fim dos pagamentos, e as perspectivas para o mercado de trabalho em 2021 são de alta no desemprego.

Bolsa Família tem aumento no próximo orçamento

Quando apresentou a proposta de orçamento para 2021, em 31 de agosto, o governo separou uma verba maior para o Bolsa Família no ano que vem. Os recursos para o programa aumentaram cerca de 15% em relação ao que havia sido proposto para 2020 e representam um avanço de R$ 5 bilhões em relação à média nominal dos últimos anos.

Evolução do orçamento do Bolsa Família

O governo propõe destinar R$ 34,9 bilhões para o atendimento de 15,2 milhões de famílias ao longo de 2021, respeitando as atuais regras de acesso ao programa. Para receber a ajuda, as famílias precisam ter renda per capita igual ou inferior a R$ 178 mensais. Também há pagamentos adicionais para crianças e adolescentes, desde que em dia com a vacinação e que frequentem a escola, e para mulheres gestantes e lactantes.

Além disso, as famílias que ainda se mantenham abaixo da linha de pobreza extrema – renda per capita igual ou inferior a R$ 89 –, ainda recebem um benefício variável de superação da pobreza, calculado individualmente.

“O aumento que se dá para [o Ministério da] Cidadania é o aumento do Bolsa Família, basicamente por uma questão socioeconômica: se prevê que tenha um aumento das famílias que atendem os critérios de admissibilidade do programa”, explicou George Soares, secretário de Orçamento do Ministério da Economia, na coletiva em que a equipe apresentou a proposta.

Trabalhar com 15,2 milhões de famílias no próximo ano representa um avanço de 2 milhões em relação a previsão feita para 2020 – e que se mostrou subestimada, uma vez que o Bolsa Família já atende a 14,2 milhões de famílias. O número também é inferior ao que foi estimado pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, que chegou a projetar um programa para 22 milhões de famílias.

As famílias atendidas pelo programa

Caso o cenário estimado pelo governo se confirme, os R$ 34,9 bilhões distribuídos a 15,2 milhões de famílias representam um benefício médio de R$ 191,11 – a média de pagamento antes da pandemia estava na casa de R$ 190. Ainda quando discutia a viabilização do Renda Brasil, o presidente insistia que o benefício mensal médio deveria ser de, pelo menos, R$ 300.

Benefício médio pago aos beneficiários do Bolsa Família

Além disso, o valor já orçado para o próximo ano não dá margem para a reedição do 13.º benefício do programa, uma promessa de campanha de Bolsonaro e que só foi viabilizada em 2019.

Na ocasião, o governo editou uma medida provisória que previa o pagamento do benefício extra apenas em 2019. O então ministro da Cidadania Osmar Terra chegou a declarar que a restrição foi feita porque a proposta de orçamento para 2020 contemplaria o 13.º, o que não ocorreu.

Por causa da pandemia da Covid-19, os beneficiários do programa acabaram transferidos para o auxílio emergencial, que pagou valores muito superiores aos do Bolsa Família – foram cinco parcelas de R$ 600 e até mais quatro de R$ 300.

Pressão por marca social da gestão Bolsonaro

A discussão acerca da criação do Renda Brasil ganhou força em 2020, mas a pressão por um programa que representasse a marca social da gestão Bolsonaro já vinha do ano passado, pois a área era considerada um gargalo do governo. Na época, o presidente cobrava a formulação de uma proposta que ampliasse os benefícios concedidos à população de baixa renda.

O sucesso do auxílio emergencial, benefício pago para trabalhadores informais e população vulnerável durante a pandemia, acabou aumentando essa pressão por dois motivos principais. A ajuda aos mais necessitados teve efeitos diretos na redução da pobreza e manutenção da atividade econômica durante os meses mais duros da crise sanitária em 2020, embora tenha fragilizado as contas públicas e se tornado o fator preponderante de aumento do déficit primário.

Além disso, a popularidade de Bolsonaro cresceu muito nesse período, sobretudo junto às camadas mais pobres da população e no Nordeste, que são setores em que o presidente não obtinha bom desempenho e onde havia preferência pelo PT, por exemplo.

O grande entrave para a formulação do Renda Brasil é a questão fiscal: não há espaço para aumentar o gasto público sem descumprir regras como o teto de gastos, que podem ensejar até pedidos de impeachment do presidente por crime de responsabilidade.

As principais ideias divulgadas pela equipe econômica sempre giraram em torno da reformulação de programas considerados ineficientes, como o seguro-defeso e o abono salarial, ou da desindexação do orçamento, com congelamento de aposentadorias e restrições ao acesso do seguro-desemprego.

Essas propostas contrariavam muito Bolsonaro, que declarou mais de uma vez que “não tiraria dos pobres para dar aos paupérrimos”. A divulgação da intenção de congelar benefícios de aposentadoria para arrumar o espaço fiscal necessário para a viabilização do Renda Brasil foi a gota d’água, e o presidente optou por sepultar a proposta, que sequer chegou a ser oficialmente apresentada.

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