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“Em um mundo globalizado, os clientes praticamente são os mesmos, oferecem as mesmas coisas, os carros têm a mesma tração 4x4, o Gatorade mata a sede do mesmo jeito. Quando você vê uma peça se destacando por alguma razão, é um aprendizado.”Leo Macias, Diretor de criação da Talent e jurado do Festival de Cannes |
“Em um mundo globalizado, os clientes praticamente são os mesmos, oferecem as mesmas coisas, os carros têm a mesma tração 4x4, o Gatorade mata a sede do mesmo jeito. Quando você vê uma peça se destacando por alguma razão, é um aprendizado.”Leo Macias, Diretor de criação da Talent e jurado do Festival de Cannes| Foto:

Não fosse pelo forte sotaque, o diretor de criação da agência Talent, Leo Macias, passaria facilmente por um brasileiro cheio de orgulho pelo país e pela publicidade feita aqui. Colombiano, mas autodeclarado brasileiro, Macias vive há 13 anos no Brasil e vai representar o país no júri do Festival Internacional de Cannes, na categoria Press. Nesta semana, ele esteve em Curitiba para participar do Workchopp – evento promovido a cada dois meses pelo Clube de Criação do Paraná (CCPR) – e para apresentar a palestra "Yes, we Cannes".

Em uma edição que certamente será marcada pelos reflexos da crise econômica mundial, Macias aposta que o Brasil se sairá muito bem. "Diferentemente de outros países, sempre vivemos algum tipo de crise. Não é nenhuma novidade para nós. Essa escassez de recursos tem feito com que a gente tenha que se espertar, se expressar criativamente de um jeito muito mais ‘porrada’."

Macias será jurado em Cannes pela primeira vez, mas, como diretor de arte, foi vencedor de Leões de Ouro e Prata – em 2006, ganhou o único troféu em Press do Brasil no evento. Dono de diversos outros prêmios nacionais e internacionais, ele já desenvolveu trabalhos para grandes marcas como General Motors, Nestlé, Bradesco, Net e Sony Ericsson, entre outras.

Em entrevista exclusiva para a Gazeta do Povo o criativo conta como está se preparando para o maior prêmio da publicidade mundial e como a crise está influenciando o trabalho publicitário brasileiro.

É a sua primeira vez como jurado de Cannes. Como você está se preparando?

A primeira coisa que eu tenho feito bastante é conversar com pessoas que já foram jurados em Press, para sentir um pouco o que eu vou encarar lá, como vai ser o dia a dia, qual vai ser a pressão que eu vou sentir. Estou buscando informações que podem me ajudar a ser um jurado melhor. A outra coisa é deixar as agências à vontade para que enviem os materiais que vão inscrever. Porque é importante você conhecer melhor o trabalho que o país está mandando. A qualidade gráfica que o Brasil tem hoje é digna de qualquer país do mundo. Sinceramente, estamos muito evoluídos em relação a isso. Os nossos clientes aqui são clientes do mundo, anunciantes fortes. Também tenho acompanhado a imprensa especializada e converso com os jornalistas. Tenho tentando cobrir todos os aspectos. Mas, obviamente, ainda falta muita coisa.

Você já tem ideia de quantas peças terá de avaliar?

O volume varia muito. Este ano, por ser o "ano da crise", provavelmente o número de inscrições caia. Não só todas as agências fecharam a "torneirinha", como também o euro está mais caro. Mas acho que isso também tem um lado interessante: vai fazer com que se feche mais o funil das coisas que vão ser enviadas. Isso vai ajudar bastante. Quando você tem um pouco mais de recurso para fazer a inscrição, manda mais coisas. Mas é uma loucura hoje, em um momento de crise, mandar peças nas quais você não acredita realmente. Às vezes você até joga um pouco de sorte nesse panelão todo. Mas acho que esse ano as pessoas vão estar mais focadas nos trabalhos que acreditam que realmente podem trazer mais resultados.

Você já viu alguns dos materiais que serão enviados? O que você espera da participação brasileira este ano?

As inscrições ainda estão sendo feitas. Acho que as coisas vão realmente começar a chegar até mim dentro de um mês. Mas já posso dizer que acredito que o Brasil vai muito bem. Diferentemente de outros países, sempre vivemos algum tipo de crise. Não é nenhuma novidade para nós. Esta escassez de recurso tem feito com que a gente tenha que se espertar, se expressar criativamente de um jeito muito mais "porrada". Você vê, por exemplo, alguns países que têm grandes investimentos com grandes materiais, mas a aposta que eles fazem na simplicidade faz com que o trabalho deixe à desejar algumas vezes. A gente tem este poder de síntese que nos ajuda muito.

Então você não concorda com quem diz que a publicidade brasileira já foi melhor, mais criativa?

Eu acho que isto tem um pouco de verdade. Muitas agências e anunciantes, em alguns momentos, até pela própria crise, se limitam a fazer a coisa um pouco mais segura. Eu digo que, em se tratando de ideias criativas, quando o mercado e o cliente estão bem, os criativos pulam do trampolim, dão duas voltas e caem na piscina incrivelmente. Quando começa a apertar um pouco o cinto, os clientes ficam segurando a borda da piscina, onde é mais seguro para eles. Isto tem derrubado um pouco a qualidade do que a gente vê no dia a dia. Mas não podemos generalizar. A Net, por exemplo, nosso cliente, vive do dia a dia. Todo dia tem ligação aqui pra dizer "Olha, não vendeu". E em tempos de crise, a primeira coisa que as pessoas cortam são os chamados supérfluos – ficam só com a televisão aberta, ou sem a internet em casa. Mas mesmo assim, temos conseguido fazer, cada vez mais, campanhas criativas. Isso com a ajuda do cliente, que acredita nisso. Algumas agências se assustam com a situação do mercado e reagem trazendo o marasmo. Mas não são todas.

Que influência você acha que pode ter um jurado que represente o Brasil?

A maior influência que o país pode ter em Cannes é o material que ele manda. Este é o primeiro passo. Na verdade, o trabalho de um jurado começa a ser um pouco mais significativo no shortlist (lista de finalistas), porque é quando você, muitas vezes, pode mostrar a relevância que uma peça tem para um jurado que não tenha conseguido perceber no momento inicial de escolha – quando cada um vota individualmente. Neste momento, consigo explicar um pouco melhor a peça e convencê-lo a ver com olhos diferentes. Mas, o mais importante é a peça ser boa. Um jurado para uma peça é o equivalente à situação da cobrança de um pênalti. Supõe-se que é mais fácil do que sair driblando todo mundo até chegar na boca do gol. Mas, mesmo no pênalti você tem que saber cobrar. Estar no shortlist é quase um gol. Mas para fazer o gol, tem que ser um chute no ângulo. Ou seja, tem que ser bom. Se não, não basta.

Qual a importância de um festival como o de Cannes para as agências?

Seria muito hipócrita dizer que trazer um Leão de Cannes não é importante. Muito pelo contrário. É um mérito enorme para qualquer pessoa. Mas o fato de você colocar a sua criatividade para competir com a do mundo inteiro é um desafio. É um aprendizado chegar no festival e ver suas peças do lado de outras do mundo todo. Em um mundo globalizado, os clientes praticamente são os mesmos, oferecem as mesmas coisas, os carros têm a mesma tração 4x4, o Gatorade mata a sede do mesmo jeito. Tudo fica mais ou menos igual. Quando você vê uma peça se destacando por alguma razão, é um aprendizado.

Serviço:

A organização do Festival de Cannes prorrogou as inscrições de todas as categorias para 27 de março. As regras e valores não sofreram alterações.

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