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bolsonaro e o embaixador da argentina daniel scioli
No dia 19 de agosto, o novo embaixador da Argentina, Daniel Scioli, apresentou as credenciais a Jair Bolsonaro para poder atuar no Brasil.| Foto: Marcos Corrêa/PR.

Maior parceiro comercial do Brasil no continente, a Argentina vem travando, desde o começo do ano, as importações de produtos brasileiros em vários setores como automotivo, máquinas e equipamentos, têxtil e insumos para a construção civil, entre outros.

Até 17 de agosto, havia 759 licenças pendentes de liberação “com prazos superiores aos usualmente observados”, equivalentes a US$ 139 milhões em mercadorias, de acordo com o Ministério da Economia.

São produtos que se encaixam nas chamadas licenças não automáticas (LNAs), que precisam de aprovação do governo argentino. Os prazos para liberação variam de dez dias, no caso de peças automotivas e carros, até 60 dias para outras mercadorias. Os prazos são fixados por acordos bilaterais e multilaterais no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Das 759 licenças pendentes, 311 estão efetivamente em atraso, equivalentes a mais de US$ 95 milhões em mercadorias. O setor automotivo é o que mais sofre, com 224 LNAs emperradas. Cerca de 30% das exportações para a Argentina são desse setor. Outros segmentos também foram atingidos, como materiais plásticos, instrumentos de precisão, tapetes, vestuário, combustíveis minerais e borracha.

“É uma clara tentativa de dificultar as importações. O motivo, basicamente, é a situação econômica da Argentina que está fora do mercado financeiro internacional”, avalia José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil. O país vizinho sofre com inflação elevada e, sobretudo, desvalorização cambial. No último ano, o peso recuou 26% frente ao dólar.

No dia 10 de agosto, o ministro das Relações Exteriores da Argentina, Felipe Solá alertou que o país precisa “aumentar as exportações para que a Argentina não volte a ter o clássico problema de angústia na balança de pagamentos”. “Em caso de desequilíbrio, precisamos de mais dólares e não os temos, então ou fugimos da taxa de câmbio ou começa o endividamento”, afirmou em reunião do governo.

Relações com a Argentina se deterioraram com novo presidente

As reclamações sobre atrasos na aprovação de LNAs por parte da indústria nacional começaram em janeiro de 2020. Uma situação inédita, segundo o Ministério da Economia, que não ocorria no governo argentino anterior, de Maurício Macri.

A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) explicou em nota que “o governo argentino tem exigido informações e documentos adicionais não previstos nas normas internas do Brasil, o que causa demora na liberação e insegurança jurídica para os nossos exportadores”. Apesar das demoras, a Argentina não pode sofrer nenhum tipo de sanção, de acordo com José Augusto de Castro.

Na ata da última reunião do Mercosul, em 2 de julho, o Brasil solicitou maior agilidade na liberação de licenças não automáticas e o pedido, pelo menos nas intenções, foi acatado pela Argentina. A embaixada brasileira em Buenos Aires também tem pressionado as autoridades argentinas para liberar os produtos.

Não é mistério que as relações entre os dois países estão desgastadas pelo menos desde que Alberto Fernandez, de centro-esquerda, assumiu a Presidência argentina, em dezembro do ano passado. Ele ainda não se encontrou com Jair Bolsonaro e os dois já trocaram farpas por causa das diferenças ideológicas.

O antagonismo tem um “peso muito grande” e afeta o comércio bilateral, segundo Castro. E isso pode beneficiar a China, que é ávida para expandir suas exportações. “A tendência mundial é impor tarifas a produtos chineses, por isso a China vai tentar abrir novos mercados, inclusive o brasileiro e o argentino”, avalia o especialista.

Perspectiva de melhora nas relações bilaterais

Uma nova fase nas relações bilaterais pode se abrir após a posse, na última quarta-feira (19), do novo embaixador argentino no Brasil, Daniel Scioli. “Abordamos temas prioritários da agenda bilateral, centrados no comércio entre os dois países e o papel estratégico que a relação entre Argentina e Brasil tem para o Mercosul”, escreveu o embaixador no Twitter após se reunir com Bolsonaro.

Apesar de ser peronista e ter sido, entre 2003 e 2007, vice-presidente no governo do falecido Nestor Kirchner - marido de Cristina Kirchner, atual vice-presidente argentina - Scioli tem um perfil moderado e boas relações com empresariado brasileiro.

“Scioli tem uma representatividade importante e veio com uma mensagem de ‘vamos zerar as relações de Fernandez e Bolsonaro, vamos recomeçar’”, diz Pedro Brites, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Ele já pediu uma linha direta com os ministros brasileiros para negociar e gerenciar crises, e tem uma agenda específica de retomar o comércio e outros setores como o turismo”, explica.

O governo de Fernandez afirmou, em nota, que o desafio de Scioli “é incrementar as vendas da produção argentina que deve se canalizar também por meio do contato estreito com cada um dos governadores dos estados brasileiros”.

Os intercâmbios comerciais entre Brasil e Argentina vêm encolhendo significativamente nos últimos anos. Em 2019, o volume das exportações brasileiras reduziu quase pela metade em relação a 2017: de US$ 17,6 bilhões para US$ 9,7 bilhões. Já as importações aumentaram levemente, de US$ 9,4 bilhões para US$ 10,5 bilhões.

Em 2020, o montante das exportações brasileiras soma US$ 4,3 bilhões e o das importações US$ 4,2 bilhões, mostrando leve superávit do Brasil.

Para tentar destravar as exportações, o Ministério das Relações Exteriores diz ter feito contatos permanentes com o governo argentino e ter incluído o tema na agenda de diferentes foros do Mercosul. “O aprofundamento da integração regional passa pela expansão do comércio bilateral e não pela restrição de comércio por meio de controle e administração das operações de importação” informou em nota.

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