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 | Daniel Castellano / Gazeta do Povo
| Foto: Daniel Castellano / Gazeta do Povo

Muitas empresas brasileiras vêm sendo empurradas pelo turbilhão do crescimento econômico para bem perto do limite de sua capacidade de produção. Ao mesmo tempo, a infraestrutura energética, viária e aeroportuária do país beira o esgotamento, em especial sob uma perspectiva de crescimento acima de 5%, em média, para os próximos anos. O cenário obrigatoriamente demanda investimentos públicos e privados – e o Paraná está nessa rota, como centro de atração de capital, na opinião do especialista em recrutamento de executivos, Gino Oyamada.

"Estamos diante de uma bela janela de oportunidade. O Paraná tem vantagens competitivas em relação a Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, e ao mesmo tempo está perto dos grandes centros consumidores. Não vejo como o estado não volte ao cenário industrial e, por consequência, à oferta de oportunidades para profissionais", diz o diretor regional da Fesa, uma das mais atuantes empresas brasileiras de recrutamento de executivos. "Tenho convicção de que nos próximos anos teremos uma intensa demanda por capital intelectual."

Nesta entrevista, Oyamada fala sobre o desenvolvimento do mercado paranaense e do modelo de gestão de pessoas nas empresas brasileiras. Na opinião do especialista, muito se evoluiu, mas ainda é preciso que os processos de recrutamento fiquem mais transparentes – de modo que os candidatos possam questionar tanto quanto são questionados. "O telefone do bom executivo está tocando. Então ele está, sim, no direito de fazer as perguntas que achar necessárias para a melhor opção."

O que mudou na última década em relação ao mercado de trabalho e o que podemos esperar para o futuro?

Felizmente, o modelo autocrático e burocrático do passado não tem mais espaço. Os profissionais de hoje procuram ambientes nos quais se sintam mais engajados na organização e efetivamente desafiados, em empresas que busquem se reinventar a cada dia. Além disso, o bom executivo está procurando se aprimorar, com relações profissionais nas quais ele aprenda. Não cabe mais a situação: eu preciso de você para ensinar o meu time. A relação de troca é muito importante e, cada vez mais, será dessa forma.

O modelo de seleção também mudou...

Está mudando, porque o profissional quer saber a quem vai se reportar, que tipo de aprendizado terá e que desafios enfrentará. Porém algumas organizações ainda se colocam na posição de recrutadoras. Esquecem que o profissional está em busca da melhor oportunidade e pode escolher também. Nesses casos, não há diálogo aberto entre as partes e a empresa nem sempre percebe que deve fornecer atributos para atrair executivos. Ainda percebo muitos processos seletivos que são conduzidos unilateralmente. A contratante se acha no direito de explorar intensamente as perspectivas do profissional, mas ouve pouco.

Esse diálogo é um ponto em que as grandes empresas ainda precisam evoluir?

Não tenho dúvida que sim. Expli­camos ao cliente, em todo processo seletivo, que ele precisa definir os atributos a serem apresentados aos candidatos. É muito engraçado: nem sempre há a clareza que se imagina. Mas é natural que você queira saber da organização tanto quanto a empresa quer saber de você. Na minha função de contratar um executivo de peso, eu não serei bem-sucedido se a empresa não tiver a humildade para abrir uma conversação que mostre para onde ela quer ir, qual a sua fraqueza, suas estratégias e seus projetos. São pontos delicados, mas importantes para que o profissional questione: o que ainda é preciso fazer nesta organização?

Essa abertura é incomum?

Eu sinto que as organizações são muito tímidas em olhar e reconhecer suas próprias fraquezas. Em um mundo competitivo no qual vivemos, em um ambiente macroeconômico onde há um blackout de capital humano, a oferta de bons profissionais é menor que a demanda. O telefone do bom executivo está tocando. Então, ele está sim no direito de fazer os questionamentos que achar necessários para fazer a melhor opção.

As novas gerações mudaram a maneira de encarar a carreira?

Quando coloco uma escala de prioridades de um executivo, o salário vai aparecer em quarto ou quinto lugar. Em primeiro lugar provavelmente está um ambiente dinâmico e desafiador, onde haja qualidade nas relações. Sem dúvida, ainda há situações nas quais as pessoas se apegam à remuneração como fator de atração. Mas a partir de um determinado ponto da escala profissional, a remuneração não é um fator preponderante. Ela é importante, mas eu diria que já foi mais. Hoje, se vê muito executivo preocupado com questões de sustentabilidade, de responsabilidade social e ambiental das organizações, como ela conduz a gestão de talentos e como lida com as suas lideranças.

Isso significa que, de alguma forma, o conceito da busca de qualidade de vida no trabalho está mais amplo?

Essa expressão é muito abrangente e também uma armadilha. Vi candidatos perderem boas oportunidades por falarem muito em qualidade de vida. Em um ambiente competitivo, capitalista e globalizado, muitas vezes até hostil nas organizações, achar que você vai trabalhar menos, ter férias de 30 dias e uma agenda flexível quando bem entende, é uma ilusão. Isso não existe. Muitos candidatos não sabem o que é qualidade na organização. E, de fato, é algo muito mais abrangente. Quando falo em qualidade de vida no trabalho, estou pensando em variáveis, como um ambiente desafiador, relações transparentes e uma estratégia organizacional definida.

Neste novo contexto, as habilidades que se procura em um gestor são as mesmas de dez anos atrás?

Sou um pouco radical neste tema. Desde os primórdios, os bons líderes têm as mesmas características, seja na igreja, na política, em casa ou nas organizações: visão de longo prazo, capacidade de influência altíssima, conseguem aglutinar terceiros para um mesmo objetivo e são grandes observadores. Os líderes são pessoas que sabem lidar com talentos e ainda navegam na cruz organizacional com muita habilidade: da mesma forma que descem ao chão de fábrica, sobem ao acionista e conversam com seus pares. São pessoas com linguagem acessível.

Você não citou a formação acadêmica tradicional. Ela é menos importante hoje do que era no passado?

Ela é importante sim. É inegável que faz uma grande diferença ter um MBA ou um curso em Harvard. O grande aprendizado acadêmico é, primeiro, um domínio conceitual das coisas e a visão dos erros e acertos do passado. Além disso, a razão de sucesso de um bom curso de MBA é a chance que o executivo tem de trocar informações. O modelo educacional das dez melhores escolas dos Estados Unidos, por exemplo, mostra grande preocupação com o intercâmbio, a troca de experiências. Você tem lá um maestro, que é o professor, fazendo com que os executivos da Índia troquem ideia com os americanos, chineses ou brasileiros. O executivo reforça o conceitual, abre espaço para novas leituras, novos intercâmbios e não fica rodando em torno dos seus próprios conceitos. Por outro lado, a gente tem executivos de primeira sem um bom MBA. São os que apresentam as características dos bons líderes.

É possível imaginar que a saída da diretoria de grandes empresas do Paraná, como a Kraft Foods, por exemplo, traz mais do que as perdas óbvias – como os postos de trabalho que se fecham, por exemplo. Perde-se essa "tecnologia de gestão". Ou isso não tem fronteiras?

É uma pena que estejamos perdendo organizações, porque perdemos postos de trabalho e, de certa forma, o legado. Mas por outro lado, do ponto de vista do executivo, uma condição indispensável de sucesso chama-se mobilidade. E isso vale para qualquer profissional. Sinto que o curitibano tem um apego à cidade. E isso, muitas vezes, torna-se um obstáculo de carreira. Ao longo do tempo, a economia se interioriza e, da mesma forma que uma cidade do interior precisa de médicos, precisa de executivos. O último grande ciclo de investimentos que o Paraná teve, por exemplo, não ficou só em Curitiba. Houve investimentos em Ponta Grossa, Londrina e Maringá. Em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul acontece a mesma coisa – as grandes empresas não estão só em Florianópolis ou Porto Alegre. O executivo não pode ignorar o movimento das organizações. Também não podemos ignorar o movimento de descentralização, de globalização. Se a sua organização está colocando um pé no Chile, vai precisar de executivos. Se você não se permitir fazer isso, com certeza vai ser preterido em outra situação, porque alguém se habilitou.

Pensando na descentralização e interiorização das companhias, as perspectivas para o mercado de trabalho no Paraná são positivas?

São muito positivas. Estamos falando em um crescimento do PIB brasileiro em cerca de 7%, e muitas organizações chegando efetivamente ao limite de sua capacidade instalada. Portanto, não há como elas não contemplarem fortemente planos de investimento, principalmente se forem mantidos os fundamentos macroeconômicos no novo governo – e essa é a expectativa. O país recebe capital estrangeiro como nunca, os fundos de private equity estão investindo pesado e o país é, de fato, a bola da vez. Além disso, os investimentos em infraestrutura terão de ocorrer, independente de governo – seja pela iniciativa privada ou por parcerias público-privadas (PPPs). Por isso tudo tenho convicção de que nos próximos anos teremos uma intensa demanda por capital intelectual. E no Paraná, particularmente, vejo um potencial de atração de capital muito forte. O estado está próximo dos grandes centros consumidores, São Paulo e Rio de Janeiro, e, sem dúvida, tem vantagens competitivas em relação aos outros.

O que pode nos atrapalhar?

Falta para nós, naturalmente, investimento portuário e aeroportuário – isso para mim é algo crítico. Mas eles terão de vir. Então, não vejo co­­mo o Paraná não ofereça chances para executivos. Há uma bela janela de oportunidade.

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