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Levitt: “Poupar não é algo natural ao ser humano” | Julio Fernandes/Divulgação
Levitt: “Poupar não é algo natural ao ser humano”| Foto: Julio Fernandes/Divulgação

BRASÍLIA - Coautor dos bestsellers Freko­nomics (2005) e Superfreakno­mics (2009), em parceria com o jornalista Stephen Dubner, o economista Steven Levitt é pesquisador da chamada Economia Comporta­mental. Professor da Universidade de Chicago, nos Esta­dos Unidos, ele procura nos números a explicação para a maneira de agir da sociedade, bem como soluções para uma série de problemas.

Suas pesquisas, muitas vezes emprestadas de outros economistas e estudiosos, já mostraram o lado oculto e supreendente de várias questões. Exemplo? No segundo livro – o melhor dos dois, na opinião do próprio Levitt –, o economista chega à conclusão de que homens-bomba deveriam ter seguro de vida. Afinal, isso é o que menos se espera de um terrorista suicida; portanto, é o que mais dificultaria sua descoberta pelas forças de segurança dos EUA.

Mas, depois de algum tempo (e de um site e um programa de rá­­dio, tudo resultante dos livros), o economista revela que desistiu de mudar o comportamento das pessoas. Em entrevista à Gazeta do Povo, durante uma conferência de seguros realizada em junho, em Brasília, ele disse que acredita cada vez mais em novas tecnologias e cada vez menos em fatos para convencer as pessoas a fazer o certo e resolver seus problemas.

Você costuma dizer que os números, e apenas os números, sem as emoções, mostram a verdade sobre as coisas. Esse é, mais ou menos, o pano de fundo para todos os estudos excêntricos de Freakonomics?

Pessoas podem analisar números conforme seus interesses. Mas acredito realmente que eles são a chave para mostrar a verdade sobre alguma coisa, se é que você está buscando isso. E a maioria das pessoas está tentando buscar a verdade, as respostas que melhor atendem seus interesses. E eu também acredito que os números são a melhor defesa contra outros números. Quanto mais simples é a forma como você apresenta os dados, mais fortes eles ficam. Muito mais que qualquer técnica matemática sofisticada de fazê-lo.

Mas mesmo assim, apresentando os números, os fatos, nem sempre você consegue convencer as pessoas da "verdade"?

Ah, sim, é muito difícil mudar o comportamento das pessoas. Eu, na verdade, desisti disso, o que é engraçado, porque é disso que economia se trata, de incentivos que mudam hábitos. Recen­temente travei uma discussão com o departamento de trânsito de Chicago porque analisei os números de acidentes envolvendo cadeirinhas e cintos e descobri que os resultados são os mesmos. As cadeirinhas não são mais eficientes que os cintos para prevenir a morte de crianças de mais de 2 anos de idade em acidentes de carro. As cadeirinhas têm um índice de fatalidade de 18,2% e os cintos, de 18,1%. Com isso não quis dizer que as pessoas não precisam usar cadeirinhas para crianças com mais de 2 anos; apenas disse que elas não são, necessariamente, mais seguras que o cinto. Mesmo depois de mostrar isso, o chefe do departamento disse em seu discurso: "Como avô de quatro netos e chefe do departamento de trânsito, tenho o dever de manter a população segura na estrada" e pronto, tudo continua igual. O que ele deveria ter dito é: "Porque sou um avô de quatro netos e chefe do departamento de trânsito e tenho o dever de manter a população segura na estrada é que não tive tempo de olhar os dados, portanto admito que precisamos pensar mais sobre isso".

Se os números não são suficientes para mudar comportamentos, o que serás?

Eu estou cada vez mais inclinado a acreditar em novas tecnologias. Se você tem um problema, não tente convencer as pessoas; descubra uma tecnologia capaz de resolver a situação. No caso da corrupção, por exemplo, se houvesse uma nova tecnologia capaz de evitá-la, teria muito mais impacto que tentar convencer as pessoas com fatos. Uma possibilidade seria ter toda conversa entre governante e cidadão gravada e, automaticamente, transcrita para a internet. Isso provavelmente faria mais pelo fim da corrupção do que qualquer outra coisa, mesmo a democracia.

Mas você acredita que, de alguma forma, seus textos, discursos e livros ajudam na educação financeira das pessoas?

Não, de maneira alguma. Nos Estados Unidos nós quase não levamos educação financeira às crianças nas escolas e, em geral, é mais fácil ensinar as crianças do que os adultos. Mas não acho que o que faço tenha essa função ou que alguém que tenha lido meu trabalho esteja em melhor posição para tomar uma decisão sobre alguma coisa. Na verdade, em minha opinião, a saída para boas maneiras financeiras está em tirar das pessoas médias seu poder de decisão. Se o governo acredita que elas gastam muito em coisas de que não precisam, então deve achar maneiras não de obrigá-las, mas de incentivá-las a guardar dinheiro. A dificuldade de poupar é algo universal, porque poupar simplesmente não é algo natural ao ser humano. Todo mundo pensa sobre hoje, e não sobre o futuro. O único lugar onde as pessoas poupam é onde não têm nada para comprar, como na antiga Rússia comunista.

Mas, economicamente, sempre ouvimos a máxima de que vale a pena poupar.

Depende. Você quer ser rico no futuro? Um dos meus conselhos aos jovens professores que começam na Universidade de Chicago é gastar mais dinheiro. Quando estudantes, eles vivem como graduandos, com uma rotina realmente barata, e, quando se tornam professores, tendem a viver ainda como graduandos, embora sua renda esteja bem maior. O que quero dizer é que você passa um tempo guardando dinheiro, mas em algum ponto tem de gastar. Provavelmente o que você quer é gastar muito quando é jovem, guardar lá pelos 30 anos de idade e voltar a gastar quando estiver velho.

Depois de dois livros de sucesso, um site e até programa de rádio, qual o seu mais novo projeto?

Bom, eu geralmente trabalho em mais de um projeto ao mesmo tempo, porque a maior parte deles acaba falhando. Mas o mais, digamos, ambicioso é um que envolve uma escola para alunos e pais na periferia de Chicago. Estamos tentando descobrir se podemos ensinar os pais a serem melhores pais e, ao mesmo tempo, estamos tentando fazer com que eles sejam menos relevantes na vida dos filhos. São crianças bem jovens às quais estamos tentando oferecer professores muito bons, ótimos modelos, para que elas possam se desenvolver de qualquer jeito, apesar dos pais.

E por que resolveu trabalhar com essa questão?

Basicamente, pais ruins são ruins para seus filhos. Pais que não investem, não se importam com seus filhos, quase garantem que eles não terão uma saída na vida. No fim, o que estamos tentando provar é que, se você pegar essas crianças e der a elas a oportunidade, independentemente de como sejam seus pais, elas vão se dar bem. É claro que é só uma tentativa. Quem sabe 15% ou 20% deles falhem, mas se um conseguir se sair bem, estamos no lucro. Isso é economia real.

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