• Carregando...
Ministro Paulo Guedes foi chamado de "desequilibrado" por Rodrigo Maia.
Ministro Paulo Guedes foi chamado de “desequilibrado” por Rodrigo Maia.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro da Economia, Paulo Guedes, participou de coletiva de imprensa nesta quarta-feira (30) para tentar mostrar que suas ideias ainda estão vivas dentro do governo e do Congresso. Mas o tiro pode ter saído pela “culatra”. Ele acabou confirmando que a decisão sobre a fonte de financiamento para o programa Renda Cidadã veio da ala política e não da equipe econômica. E, ao tentar rebater as críticas que têm sofrido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acabou sendo tachado de "desequilibrado" pelo deputado.

A briga entre Guedes e Maia vem de meses, e por vários motivos. Um deles é a reforma tributária. O ministro disse que o presidente da Câmara estava interditando o debate em torno da proposta do governo ao não topar pautar a criação da nova CPMF em troca da desoneração da folha para todos os setores. Em suas redes sociais, Maia respondeu dizendo que Guedes é quem estava travando a reforma tributária e lançou o questionamento aos seus seguidores: “Por que Paulo Guedes interditou o debate da reforma tributária?”

Nesta quarta-feira, Guedes foi para a tréplica, falando sobre outra interdição. Disse que ouviu boatos de que o presidente da Câmara teria feito um acordo com partidos da esquerda para não dar andamento aos projetos de privatização do governo. O texto que permite a venda da Eletrobras, por exemplo, está desde novembro de 2019 na gaveta de Maia aguardando despacho para iniciar a tramitação. “Não há razão para interditar as privatizações”, afirmou Guedes.

O presidente da Câmara, rapidamente, respondeu à acusação: "Paulo Guedes está desequilibrado. Recomendo ao ministro assistir o filme A Queda". O filme retrata a derrocada de Adolf Hitler na Segunda Guerra Mundial. O ministro, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que não comentaria a declaração.

A troca de farpas é mais um capítulo da briga pública entre os dois, que estão rompidos desde o início do mês, quando Maia anunciou que passaria a tratar dos assuntos econômicos apenas com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, articulador oficial do Palácio do Planalto.

Em entrevista à Globonews, Maia disse que o ministro proibiu seus auxiliares de falar com ele. "Eu não tenho conversado com o ministro Paulo Guedes. Ele tem proibido a equipe econômica de conversar comigo", disse. "Então, decidi que a relação da presidência da Câmara será com o ministro Ramos, e o ministro Ramos conversa com a equipe econômica, para não criar constrangimento mais para ninguém. Mas isso não vai atrapalhar os nossos trabalhos, de forma nenhuma", acrescentou.

Ministro passou por constrangimentos políticos nas últimas semanas

Antes dos embates desta semana, o ministro Paulo Guedes já demonstrava sinais de enfraquecimento político. Há 15 dias, ele foi contrariado publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro ao ter o projeto do Renda Brasil, que estava sendo gestado no Ministério da Economia, ser engavetado abruptamente. O Renda Brasil ia substituir o auxílio emergencial e o Bolsa Família.

A decisão de Bolsonaro aconteceu após a equipe econômica propor congelar aposentadorias e pensões por dois anos e restringir o Benefício de Prestação Continuada (BPC). O BPC é pago para idosos e pessoas com deficiência pobres. "Até 2022, no meu governo, está proibido falar em Renda Brasil, vamos continuar com o Bolsa Família e ponto final", disse o presidente em vídeo, ameaçando dar um "cartão vermelho" a quem propusesse algo do tipo.

O presidente disse que foi surpreendido pelas ideias da equipe econômica para viabilizar o Renda Brasil e classificou as medidas como "devaneio de alguém que está desconectado com a realidade".

Na semana passada, um novo episódio de desprestígio: Guedes foi tutelado pelas alas política e militar do governo. Em um rápido pronunciamento no Palácio do Planalto, ele foi interrompido pelo ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), após ordem do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

Guedes tinha assumido o microfone, após fala de Barros, para falar com a imprensa sobre "tributos alternativos para desonerar a folha". Enquanto falava, Barros sussurra ao fundo: “Tá bom. Tá bom”. Ramos, então, pôs a mão no ombro do ministro, encerrando a entrevista e saindo todos em retirada. Guedes, com as mãos para o alto, brinca: “agora tem articulação política”. O flagra foi feito pela CNN.

Forma de financiamento do Renda Cidadã não teve aval de Guedes e equipe

Se não bastasse a briga pública com o presidente da Câmara, a equipe econômica ficou em segundo plano na elaboração do Renda Cidadã. Guedes confirmou que é contra a ideia de limitar o pagamento de precatórios (valores devidos pelos governos a pessoas físicas e jurídicas após sentença definitiva na Justiça) para financiar o Renda Cidadã.

Um dia antes, o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, já tinha afirmado que a solução de financiamento do Renda Cidadão foi “política”. Ele também deixou claro que não participou das discussões finais sobre o programa, ao admitir que não leu o texto final que será encaminhado ao Congresso.

Com a reação negativa do mercado financeiro aos fatos desta semana, Guedes tentou esfriar a polêmica participando de surpresa nesta quarta de coletiva de imprensa sobre os dados do Caged. A participação do ministro não estava na agenda e a coletiva começou oito minutos antes do horário agendado.

Guedes disse que houve um mal-entendido sobre o anúncio, o que não aconteceu de fato. A ala política do governo anunciou claramente na segunda-feira (28) que havia chegado a um acordo sobre como financiar o Renda Cidadã: travar o pagamento de precatórios a 2% da receita corrente líquida, além de usar 5% da renda destinada ao Fundeb, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica recém-renovado pelo Congresso Nacional.

O anúncio foi feito no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente, com transmissão oficial pelos canais de comunicação do governo. Quem deu a notícia sobre o acordo foi o senador Márcio Bittar (MDC-AC), que é quem vai apresentar o texto. Ele estava ao lado do presidente, da cúpula do governo e de líderes partidários. Guedes participou desse anúncio e, na ocasião, se limitou a falar sobre a desoneração da folha, ideia que ainda nem saiu do papel, por falta de acordo político.

Nesta quarta, Guedes contrariou o próprio anúncio do governo e falou que os precatórios não serão usados como fonte de financiamento para o Renda Cidadã. Ela informou que a equipe econômica continua trabalhando na ideia de unificar 27 programas sociais para dar vida à renda básica. A ideia de pôr fim a programas sociais existentes já foi barrada pelo presidente Jair Bolsonaro, que considera tirar dos “pobres para dar aos paupérrimos”.

"Despesa permanente precisa ser financiado com despesa permanente. Não pode ser financiado por puxadinho, por ajuste. Não é assim que se financia o Renda Brasil. É com receitas permanentes. Não estamos nos desviando dos nossos programas”, declarou a jornalistas, tendo saído da coletiva sem responder perguntas, deixando as questões da imprensa para seus secretários que falavam sobre o Caged.

Já o senador Márcio Bittar passou o dia prometendo entregar a sua proposta para o Renda Cidadã, sem recuar na questão dos precatórios. Bittar não vê problema em limitar o pagamento de precatórios e diz que essa é a única solução para viabilizar o programa sem romper o teto de gastos. Até o fechamento desse texto, a proposta não tinha sido protocolada no Senado.

O teto de gastos é considerado pela equipe econômica o principal pilar fiscal do nosso país. Eles atribuem ao teto a confiança que os investidores ainda têm no país. Eles não admitem que o teto seja flexibilizado ou até mesmo enterrado. Segundo interlocutores da pasta, Guedes poderia pedir demissão do governo caso o teto fosse furado.

Bolsonaro e Bittar ainda não se pronunciaram após as declarações de Guedes contra o uso dos precatórios. E, como o texto ainda não veio a público, permanece a dúvida sobre qual será a fonte de financiamento do programa: a defendida pela equipe econômica ou a apresentada pelo restante do governo na segunda-feira?

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]