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Navio em construção no Atlântico Sul, em Pernambuco. | Fotos Públicas
Navio em construção no Atlântico Sul, em Pernambuco.| Foto: Fotos Públicas

A indústria naval brasileira experimentou uma reviravolta nos últimos tempos. Da euforia da retomada na última década, quando crescia 19,5% ao ano, o setor passou a um quadro de demissões em massa e incertezas, em razão dos casos de corrupção que assolam a Petrobras e parte de seus fornecedores.

Pernambuco

Em Pernambuco, o Estaleiro Atlântico Sul (EAS) –controlado por Queiroz Galvão e Camargo Correa, listadas na Lava-Jato, além da parceira japonesa Ishikawajima (IHI) – suspendeu o contrato com a Sete Brasil. Com isso, 780 trabalhadores foram demitidos e outros mil correm o risco de perder o emprego. Procurado, o EAS não retornou.

A recuperação do setor, praticamente inexistente desde os anos 1980, foi um dos pilares do governo de Luiz Inácio Lula da Silva desde o primeiro mandato em 2003, quando anunciou em palanques a construção de plataformas para a Petrobras no país. Da pujança naval, resta agora apenas a lembrança das promessas e o silêncio das autoridades, além de milhares de desempregados.

Produção de sondas para por falta de pagamento

  • maragojipe (BA)

Quem chega ao estaleiro Paraguaçu, da Enseada Indústria Naval, logo nota o silêncio das máquinas, os equipamentos guardados, as salas fechadas e os guindastes ainda por montar. O estaleiro, que começou a ser construído em abril de 2012 para fabricar seis sondas do pré-sal, teve de pisar no freio por falta de dinheiro, afetado pela crise de seu único cliente, a Sete Brasil.

Sem caixa, o consórcio dono do Paraguaçu (Odebrecht, OAS, UTC e a japonesa Kawasaki) teve de cancelar a construção do empreendimento. Apesar de estar com 82% das obras concluídas, ainda faltam partes essenciais como a finalização do megaguindaste – o maior da América Latina, com 150 metros de altura, necessário para montar as sondas – e a construção do dique seco. O projeto previa investimentos de R$ 2,7 bilhões.

A falta de verba forçou a paralisação na construção das duas primeiras sondas no início de fevereiro. No caso da primeira, batizada de Ondina, falta a finalização dos módulos. Hoje, os 576 funcionários remanescentes fazem apenas a manutenção dos equipamentos.

Desde o início do ano passado, os estaleiros já demitiram cerca de 28 mil trabalhadores. Se somados os reflexos no setor de máquinas e equipamentos, o número de desempregados já supera os 34 mil. E a crise não deve parar por aí. Estima-se que ao menos outros 12,2 mil empregos estão em xeque nos principais polos navais do Brasil, dizem os sindicatos.

Os pequenos municípios de Maragojipe, na Bahia, e Rio Grande, no Rio Grande do Sul, ajudam a ilustrar esse cenário. Nas duas localidades, as demissões já se refletem na economia.

O corte de vagas é resultado do cancelamento de encomendas da Petrobras, com a Operação Lava Jato. Há ainda o imbróglio envolvendo a Sete Brasil, criada para construir 29 sondas para o pré-sal e que tem a Petrobras entre seus sócios.

Citada na delação premiada de Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, a Sete Brasil enfrenta problemas de caixa em razão do atraso do BNDES em liberar um financiamento de US$ 21 bilhões. A crise já forçou um dos bancos a solicitar pagamento antecipado de um empréstimo ao Fundo Garantidor da Construção Naval.

Com as denúncias de corrupção, a Petrobras reduziu os investimentos em 30% este ano, para US$ 31 bilhões, e trabalha na redução de seu novo plano de negócios, o que já é sentido pelos estaleiros.

Além disso, a crise financeira na Sete Brasil afetou em cheio cinco estaleiros, que estão sem receber desde novembro: a dívida chega a US$ 1,25 bilhão.

Um dos casos mais graves é o do Paraguaçu, em Maragojipe, que, após ter 7,2 mil trabalhadores, conta hoje com 576 operários. Ela é controlada por Odebrecht, OAS e UTC, proibidas de serem contratadas pela Petrobras por formação de cartel.

Rio Grande atraiu operários, agora desocupados

  • rio grande (RS)

No auge da produção de seu polo naval, na década passada, Rio Grande atraiu 10 mil operários de fora do estado. Mas o sonho de trabalhadores como o mineiro Milton Guimarães e o baiano Wlisses Michel Gomes de fincar raízes na cidade está chegando ao fim: desempregados, os dois “trecheiros” – como são conhecidos os trabalhadores nômades que percorrem o país em busca de oportunidade em obras – já arrumam as malas para pegar a estrada.

Desde novembro de 2013, quando as obras da P-58 foram concluídas, o nível de ocupação nos estaleiros de Rio Grande não para de cair. De 24 mil trabalhadores diretos em janeiro daquele ano, o polo emprega pouco mais de 8 mil hoje, dos quais menos de 2 mil são de outros estados. A cidade tem hoje um contingente de 3 mil desempregados de fora do estado, e de 4 mil que nasceram na cidade.

O último baque foi a conclusão da P-66, em dezembro, que deixou Milton, de 30 anos, e Wlisses, de 37 anos, a ver navios.

Logo que terminou a montagem da P-66, a presidente Dilma Rousseff e a então presidente da estatal, Graça Foster, foram a Rio Grande assinar os contratos de construção das plataformas P-75 e P-77 por meio de um consórcio entre Queiroz Galvão, Camargo Correa e Iesa (QGI). A previsão era para que as obras começassem no fim do ano passado, mas as investigações interromperam a transferência de recursos para as empresas e os projetos foram temporariamente suspensos.

A Camargo Correa desistiu do negócio e a Inepar, controladora da Iesa, entrou em recuperação judicial. Restou a Queiroz Galvão, que ainda negocia o preço do contrato.

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