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Ministros Luiz Eduardo Ramos e Paulo Guedes (à dir.): governo intensificou articulação em prol da nova CPMF e da desoneração da folha.
Ministros Luiz Eduardo Ramos e Paulo Guedes (à dir.): governo intensificou articulação em prol da nova CPMF e da desoneração da folha.| Foto: Sergio Lima/AFP

O ministro da Economia, Paulo Guedes, intensificou a articulação política para criar um novo imposto sobre transações digitais, semelhante à antiga CPMF, e ganhou aliados de peso no Congresso. Dos líderes governistas ao relator do Orçamento, parlamentares aliados começam a defender publicamente o novo imposto para desonerar a folha de pagamentos, uma ideia da equipe econômica para incentivar a geração de empregos formais no pós-pandemia. O novo imposto e a desoneração fazem parte do restante da reforma tributária do Executivo, que deve ser desengavetada em breve.

O tema vem sendo tratado em reuniões entre a cúpula do Executivo e parlamentares desde o fim da semana passada. Essas reuniões estão acontecendo pela manhã no Palácio do Planalto, com a ala política do governo, e pela tarde ou noite no Ministério da Economia, com técnicos da pasta, para discussão dos detalhes da proposta. O objetivo é que o texto esteja fechado para ser encaminhado na próxima semana à comissão mista do Congresso que discute a reforma tributária.

"Descobrimos 38 milhões de brasileiros que eram invisíveis. Temos que ajudar essa turma a ser reincorporada no mercado de trabalho, então temos que desonerar a folha. Por isso que a gente precisa de tributos alternativos para desonerar a folha e ajudar a criar empregos”, afirmou Guedes, após reunião entre a cúpula do governo e lideranças parlamentares nesta quarta. "Queremos desonerar, queremos ajudar a buscar emprego, facilitar a criação de empregos, então vamos fazer um programa de substituição tributária", completou, prometendo que não haverá aumento de carga.

As declarações de Guedes foram feitas ao lado do líder do governo Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), e dos ministros Fábio Faria (Comunicações) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), após aval do presidente da República, Jair Bolsonaro, com quem se reuniram pela manhã. No ano passado, Bolsonaro tinha proibido o governo de falar em “volta da CPMF”. Tanto que Marcos Cintra foi demitido do cargo de secretário especial da Receita Federal por defender publicamente o imposto.

Imposto pode ter duração de seis anos

Antes mesmo das declarações desta quarta, o líder Ricardo Barros já tinha declarado apoio público à nova CPMF. Em live promovida pela Genial Investimentos, ele afirmou que está negociando com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), propor o novo imposto por apenas seis anos, numa espécie de transição. Maia é contra a volta da CMPF e prometeu não pautá-la enquanto for presidente da Câmara.

“Nós estamos trabalhando com o presidente Rodrigo Maia para fazer esse imposto [digital] por um período de transição de seis anos”, declarou Barros. “O objetivo do novo imposto ou imposto de transações digitais ou sei lá qual nome vai ser dado é financiar a desoneração da folha de pagamentos. É desejo do presidente Bolsonaro desonerar a folha”, completou.

A equipe econômica queria que a nova CPMF fosse permanente, e não transitório. Mas a ideia de Barros foi bem aceita, já que pode ajudar a desinterditar o debate. A alíquota estudada é de 0,2% e a arrecadação anual estimada é de R$ 120 bilhões. O dinheiro serviria majoritariamente para compensar a perda de arrecadação da Previdência Social com a desoneração da folha, mas o restante poderia ser usado para financiar outras ações do governo. O governo deve desonerar totalmente a folha pra quem ganha até um salário mínimo e parcialmente para salários acima do piso.

Barro revelou, ainda, que o governo prepara um estudo para subsidiar o debate. “Estamos fazendo um estudo também para mostrar que esse imposto é mais justo do que a tributação na folha de pagamento. É preciso de elementos de convencimento para que ele [Rodrigo Maia] possa mudar de posição”, afirmou.

Segundo apurou a Gazeta do Povo, esse estudo está em fase final de elaboração pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, em parceria com a Receita Federal. O objetivo será mostrar, com dados, como os impostos que incidem sobre a folha desestimulam a formalização e que um imposto pequeno, de 0,2%, sobre bases amplas, não prejudicará a sociedade, como alegam os opositores. O estudo será divulgado assim que se bata o martelo sobre a data de envio da proposta ao Congresso.

O ministro Paulo Guedes, desde o governo de transição, afirma que os impostos sobre a folha são armas em massa de destruição de emprego. Ele reconhece que a nova CMPF é um imposto “feio”, mas diz que não é tão cruel como tributar a folha. Por fim, alega que a única maneira de desonerar a folha para criar milhões de empregos é criar esse tributo “pequeninho” sobre uma base ampla (transações digitais).

"Tributar folha de pagamento é mais destrutivo que criar imposto sobre transações digitais. Não adianta interditar esse debate. Ou vamos ter que falar sobre imposto sobre transações para desonerar a folha, ou não podemos falar em desonerar a folha", declarou recentemente, numa indireta ao presidente da Câmara, o principal opositor da criação do novo imposto digital.

Apoio de outros parlamentares

Além de Barros, outros importantes aliados do governo passaram a defender a criação da nova CPMF. Entre eles, o líder do PP e principal expoente do Centrão, deputado Arthur Lira (AL); o vice-líder do governo no Senado, senador Chico Rodrigues (DEM-RR); e o relator do Orçamento de 2021 e da proposta do Pacto Federativo, senador Márcio Bittar (MDB-AC), que também é vice-líder do governo no Congresso.

“Qual o problema que se criticava tanto a CPMF? Era porque era para saúde e ninguém via a saúde melhorar. Mas se falamos de criar um imposto que não seja só virtual, mas também sobre operações financeiras de 0,2%, 0,1%, especialmente para esse fim social, quem iria ficar contra? A esquerda, a direita, o centro, o presidente da Câmara, o presidente do Congresso? E o ministro iria ter uma saída para iniciar a discussão [da desoneração]”, disse Lira em entrevista ao jornal Valor Econômico.

À Gazeta do Povo, o senador Chico Rodrigues disse que o momento do país pós-pandemia justifica a criação do imposto. “Eu entendo que depois dessa pandemia, nessa proposta de retomada do crescimento econômico, esse imposto sobre produtos digitais tem que existir porque é uma forma de compensação para a nossa economia, que saiu fragilizada dessa crise."

“Será uma forma de termos a contribuição de todos, do mais humilde ao mais forte empresário. Eu não vejo nenhum mal em incluir [o novo imposto] na reforma tributária. É um importante recurso que vai ser dividido com toda a população brasileira”, completou.

Em agosto, também à Gazeta do Povo, Márcio Bittar defendeu o imposto, desde que com uma alíquota baixa e sem aumentar a carga tributária. “Com uma alíquota pequena, de 0,2%, você aumenta a base de contribuição sem aumentar a carga tributária. Tem muita gente que hoje sonega imposto, empresa que não paga. Vamos ter de entrar nessa discussão”, afirmou.

Nova CPMF ainda está longe de ser consenso

Apesar de ter ganhado aliados, a ideia ainda está longe de ser consenso na Câmara. Até parlamentares do Novo, partido que normalmente tem alinhamento de ideias com o ministro Paulo Guedes, têm se posicionado contra a volta do imposto.

“Não há tributo mais cumulativos que uma CPMF, ela vai contaminando toda a economia, tira a transparência, gera distorções incorrigíveis e tira completamente a competitividade da economia brasileira. Recriar esta ‘jabuticaba tributária’ é condenar o Brasil a ser um eterno exportador de commodities, sem qualquer valor agregado”, escreveu, no Twitter, o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP).

Presidente da comissão mista da reforma tributária, o senador Roberto Rocha (PSDB) afirmou a jornalistas nesta quarta-feira (23) que não há “ambiente político” para se discutir a criação de uma nova CPMF. “É muito delicada [a criação da nova CPMF]. Acho que isso pode, de alguma forma, contaminar a reforma. Não há ambiente político para se discutir.”

Ele ponderou que, na realidade, o objetivo final do governo não é criar um imposto, e sim desonerar a folha, e para isso precisaria desse imposto. Mas reforçou que não é o momento adequado para se falar do tema.

“A maneira que ele [governo] encontra para desonerar a folha é criando essa movimentação financeira. Ou faz assim, ou aumenta no IVA, aumentando a carga tributária. Mas esse é um assunto delicado, que não me parece oportuno discutir agora, nesse momento", disse Rocha.

O senador afirma que não vai esperar o governo se decidir sobre a nova CPMF. Ele disse que o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da reforma tributária na comissão mista do Congresso, deve apresentar seu parecer na próxima semana. A votação no colegiado está prevista para 7 de outubro.

O governo, por outro lado, também promete apresentar a sua proposta na semana que vem. Mesmo que a comissão conclua seus trabalhos antes, o texto da reforma tributária que sairá da comissão terá de ser aprovado na Câmara e no Senado, onde pode sofrer modificações.

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