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Granja de frangos em Quilombo, no Oeste de Santa Catarina: carne de aves é o carro-chefe das exportações para os países árabes | Albari Rosa/
Gazeta do Povo
Granja de frangos em Quilombo, no Oeste de Santa Catarina: carne de aves é o carro-chefe das exportações para os países árabes| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

Uma preocupação começa a tomar conta dos exportadores para os países da Liga Árabe: como vão ficar as vendas para o bloco de 22 países que se estende do Norte da África ao Oriente Médio a partir de 1° de janeiro, quando Jair Bolsonaro toma posse na presidência.

 Um dos pontos de atenção é a provável transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém e reconhecer que esta é a capital de Israel, seguindo um movimento iniciado pelos Estados Unidos em maio. 

 “O novo governo brasileiro vai estar em sincronia com os Estados Unidos e já sinalizou que vai ter um bom relacionamento com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. Isto pode ter impactos no relacionamento com os países árabes”, diz Tanguy Baghdadi, professor de política internacional do Curso Clio. 

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O especialista não descarta, inclusive, na adoção de retaliações caso a transferência da embaixada e o reconhecimento da capital se confirme. Um alerta de que um movimento como esses pode afetar o relacionamento com os países árabes foi dado na segunda pela Liga Árabe: uma carta assinada pelo secretário geral da organização, Ahmed Aboul-Gheit, foi encaminhada a Bolsonaro por intermédio do Ministério das Relações Exteriores. 

Carne, milho e soja estão entre os principais produtos comprados pelos países árabes

Os países árabes são um importante parceiro comercial do Brasil. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior, 5% dos US$ 220 bilhões exportados pelo país tiveram como destino aquela região. Os principais produtos comercializados (60% do total) são açúcar, carne bovina e de frango, milho e soja. 

No sentido contrário, 4,1% das importações brasileiras vêm dos países árabes. O principal produto adquirido é o petróleo (61%), usado na fabricação de combustíveis, e vindo da Arábia Saudita e da Argélia. Outro importante produto adquirido da região é o fosfato, usado como matéria-prima em fertilizantes. 

 “Em um dos piores cenários pode haver um boicote à carne brasileira”, diz Pio Penna Filho, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (IRI/UnB). Um dos segmentos mais atingidos seria o do frango. Três quintos das exportações saem de dois estados: Paraná e Santa Catarina. E, indiretamente, os reflexos poderiam se estender à cadeia do milho e da soja, matéria-prima usada nas rações.

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 O Brasil é um dos maiores exportadores de proteína animal para os países árabes. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior, entre janeiro e novembro foram vendidos US$ 3,02 bilhões em carne, 11,1% a menos do que nos mesmos meses de 2017. 

 Segundo a Câmara de Comércio Árabe Brasil, essa queda está relacionada a uma normatização adotada pela Arábia Saudita no início do ano, que vetou o método usado pelas agroindústrias brasileiras na insensibilização elétrica das aves no pré-abate. Eles consideram que essa prática não é condizente com a religião islâmica. 

 Frigoríficos de médio e grande porte se adaptaram às exigências, mas questionaram por causa da maior taxa de condenação de carcaça. Quem deixou de exportar foram pequenos frigoríficos, que foram substituídos por outros da Turquia, Estados Unidos e Dinamarca. 

 As exportações de carne bovina também tiveram uma queda de 11% neste ano, segundo a Secex. “Elas foram fortemente impactadas pela greve dos caminhoneiros”, diz Rubens Hannun, presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira. 

 Segundo o dirigente, os passos que a diplomacia brasileira vai tomar a partir de 1° de janeiro estão sendo olhados com muita atenção pelos concorrentes do Brasil. “O produto brasileiro tem uma boa imagem na região. Os árabes são simpáticos aos brasileiros. Mas quem disputa mercado com o Brasil está muito atento e pode ocupar o espaço brasileiro.” 

 Não é só a carne que está ameaçada

Futuros negócios em outras áreas também poderiam ser comprometidos, avalia a Câmara de Comércio. Hannun avalia que há possibilidade, nos próximos quatro anos, de se abrirem outras frentes de negócios com os 22 países, elevando as exportações para US$ 20 bilhões. Entre janeiro e novembro deste ano, segundo a Secex, as vendas para a região atingiram US$ 10,5 bi, 16,2% a menos do que nos mesmos meses de 2017. 

 Outros produtos que ainda não são muito relevantes na pauta de exportação brasileira aos países árabes, mas que a entidade enxerga com grande potencial de penetração nos países árabes, principalmente em decorrência da grande similaridade dos padrões de qualidade de produção Halal e de produtos “sustentáveis”, são os cosméticos e os produtos e fármacos. 

 Outra área que está em expansão nas economias árabes é a construção civil (de infraestrutura, habitação, empreendimentos comerciais e turismo). Isto, segundo a entidade, abre um grande janela de oportunidade para esse setor naquela região. 

 Dado o impacto, Penna Filho, da UnB espera que haja pragmatismo por parte do governo Bolsonaro e que não decida pelas mudanças. Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, disse que a decisão já foi tomada e a questão agora é quando vai ocorrer a mudança. 

“O agronegócio poderia ter um prejuízo enorme por causa de uma mudança no padrão da política externa brasileira que, desde 1947/8, defende a existência do estado israelense e do palestino. Seria uma medida tomada em troca de quê?”, questiona o professor da UnB. 

 Investimentos na região também seriam comprometidos, ressalta a Câmara de Comércio: “eles podem ser afetados negativamente com um possível embargo ao Brasil, pois isso implicaria em uma alteração de acesso e saída de produtos elaborados nos países árabes que poderiam ter como destino o Brasil, a exemplo da planta industrial da Vale em Omã ou da Marcopolo, no Egito.”

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