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A queda nas taxas de natalidade e o envelhecimento da população vão reduzir a força de trabalho do Brasil nas próximas décadas. Para não empobrecer, o país terá de produzir mais com menos gente, ou seja, ficar mais produtivo. Não será fácil, a julgar pelo comportamento recente – e não tão recente assim – dos indicadores brasileiros.

Dados preliminares indicam que, em 2016, a produtividade da nossa economia recuou pelo terceiro ano seguido, o que não ocorria desde o início da década de 1980. Segundo estimativas da organização norte-americana The Conference Board, que pesquisa e reúne dados de centenas de países, cada brasileiro ocupado gerou, em média, o equivalente a US$ 16,6 por hora trabalhada no ano passado. O rendimento, 4% menor que o de 2015, foi o mais baixo desde 2008.

“Hostil à inovação”, Brasil precisa abrir economia, diz especialista

No fim do ano passado o governo anunciou uma série de medidas “microeconômicas” para reduzir a burocracia. A ideia é facilitar a abertura e o fechamento de empresas, o pagamento de impostos, as operações de exportação e importação. Trata-se de um primeiro passo para remover obstáculos que tomam tempo e recursos que as empresas poderiam estar destinando à inovação.

“Nossa economia é hostil à inovação, pelo custo, pelo tempo, pela burocracia, pela dificuldade de contratar e demitir. Por tudo, enfim, que interfere na vida das empresas, que têm suas iniciativas permanentemente corroídas pelo sistema regulatório”, diz o professor da USP Glauco Arbix, que presidiu o Ipea entre 2003 e 2006 e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) de 2011 a 2015.

Outro problema, diz Arbix, é que as empresas brasileiras se acostumaram a depender do Estado e da baixa concorrência, numa estrutura que vem se sedimentando desde a década de 1930. “Ficamos muitas décadas dependendo de uma economia altamente protegida, subsidiada e controlada. O primeiro passo é abrir a economia. A competição precisa fluir, para permitir um fluxo não só de bens, mas de conhecimento. Quem importa conhece produtos novos e aprende processos novos.”

O Brasil ocupa a 52.ª posição dentre os 68 países que têm esse dado na base da Conference Board. A produtividade da economia dos Estados Unidos, na parte de cima da tabela, foi de US$ 67 por hora no ano passado, o que significa que são necessários quatro brasileiros para produzir o mesmo que um norte-americano.

INFOGRÁFICO: confira uma comparação da produtividade por países

Indústria ganha eficiência com medidas simples

Problema crônico

O retrocesso recente do Brasil é consequência da recessão, mas antes dela a produtividade já era baixa. O indicador não cresce de forma sustentada desde o fim da década de 1970, época em que “apenas” três brasileiros bastavam para gerar a riqueza produzida por um trabalhador dos EUA.

Nossa economia conseguiu absorver muito pouco das inovações tecnológicas das últimas décadas, muito bem aproveitadas por países como a Coreia do Sul. Há três décadas, a produtividade do país asiático equivalia a 45% da brasileira – dois sul-coreanos produziam pouco menos que um trabalhador do Brasil. Hoje é o contrário.

A produtividade avançou pouco até mesmo na última fase de bonança do Brasil. Os ganhos de eficiência foram responsáveis por apenas um terço da expansão do PIB ocorrida entre 2000 e 2009, segundo estudo dos pesquisadores Fernanda De Negri, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e Luiz Ricardo Cavalcante, consultor do Senado. Os dois terços restantes vieram do aumento da população ocupada.

Em outras palavras, o país só cresceu tanto porque havia mão de obra disponível para produzir, prestar serviços e vender mais. Será mais difícil repetir o desempenho quando não houver tanta gente à disposição. Hoje pouco mais de 69% da população tem entre 15 e 64 anos, e essa proporção deve chegar ao teto de 70% entre 2022 e 2023, segundo projeções do IBGE. Depois, com o fim do chamado “bônus demográfico”, passará a cair.

Vários fatores estão por trás da baixa produtividade da economia brasileira. Entre os principais estão os baixos índices de inovação das empresas, as carências de infraestrutura e um ambiente de negócios marcado por muita burocracia e pouca segurança em relação às regras do jogo. Mas o maior desafio está na educação – ponto forte da Coreia do Sul, que explica boa parte de sua ascensão.

Nota vermelha

Testes nacionais e internacionais reiteram que o brasileiro deixa a escola ou a faculdade sabendo menos que o básico, e com grande dificuldade para interpretar informações e aplicar o conhecimento no dia a dia. As notas vêm melhorando lentamente, ou até piorando. O Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) de 2015 revelou que, na comparação com 2012, os estudantes brasileiros estagnaram em leitura e ciências. E em matemática, regrediram a níveis próximos aos de 2006.

“Para produzir mais e com mais qualidade lá na frente, esse jovem que hoje está na escola precisará inovar. Mas não conseguirá sem uma educação consistente”, diz Wilson Risolia, líder da Falconi Educação, braço da consultoria de produtividade Falconi. “Se não desarmar essa armadilha, o país nunca conseguirá crescer de forma sustentada. Em algum momento, sempre vai esbarrar nesse gargalo de mão de obra, nessa baixa capacidade de inovação.”

Indústria ganha eficiência com mudanças simples

O aumento da produtividade da indústria depende, muitas vezes, da compra de máquinas e equipamentos mais eficientes – investimento que despencou em meio à recessão. Mas mudanças simples nos processos de produção, que saem quase de graça, podem ajudar bastante.

A Daiken Elevadores, de Colombo, na região de Curitiba, aumentou em 30% a produtividade do setor de soldagem ao eliminar uma das etapas de produção. Participante do programa Brasil Mais Produtivo, do governo federal, ela foi auxiliada durante três meses por um consultor do Senai.

“Temos três soldadores, e o acabamento era feito por uma quarta pessoa, que às vezes ficava ociosa e às vezes, muito ocupada. Notamos que tirar a peça da estação de solda e levar até a bancada de acabamento levava mais tempo que o acabamento em si. Decidimos então que os próprios soldadores fariam o acabamento. O número de pessoas no setor caiu de quatro para três, e a velocidade aumentou”, conta o diretor geral da Daiken, Osmar Yamawaki.

Em 2015, antes da mudança, a empresa teve de fazer hora extra até março para dar conta da demanda do fim do ano anterior. Desta vez, mesmo com um aumento de 20% no número de pedidos, pôde dar 15 dias de férias coletivas – e tem peças prontas até o fim de janeiro.

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