Ainda com possibilidade de mudanças até a votação, o relatório mais recente do deputado Arthur Maia (DEM-BA) da PEC da reforma administrativa prevê uma série de benefícios para as carreiras policiais, que as distinguem das demais funções no serviço público. O texto tem previsão de ser votado nesta terça-feira (21), mas ainda deve receber uma atualização, após a falta de entendimento de líderes partidários em relação a mudanças propostas pelo relator na versão apresentada na semana passada.
Na quinta-feira (16), após o adiamento da votação do parecer, Maia retirou a versão mais recente de seu relatório, substituindo-a por uma anterior até que seja apresentado um novo texto, que ainda tem pontos em negociação. Entidades que representam as forças policiais se mobilizam para preservar os dispositivos que beneficiam as categorias.
Entre as alterações propostas — e que geraram o impasse que levou ao adiamento da votação do relatório — está a mudança da Polícia Federal (PF) de órgão da segurança pública para instituição de função jurisdicional. Com isso, o controle externo da PF passaria do Ministério Público para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), alterando a sistemática atual de fiscalização da instituição.
Na versão mais recente, o relatório também prevê foro privilegiado para o delegado-geral da PF, que teria prerrogativa de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), e para os delegados-gerais das polícias civis, que responderiam no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O acesso ao cargo de delegado-geral da PF também passaria a ser restrito a integrantes da última classe funcional do cargo de delegado da instituição.
Além disso, policiais que ingressaram na carreira antes da reforma da Previdência de 2019, conforme o texto, terão direito à integralidade e paridade nas aposentadorias. A manutenção dos benefícios tramita na Justiça, mas, com a mudança, esses policiais teriam garantido constitucionalmente os mesmos reajustes dos servidores em atividade quando estiverem aposentados.
Policiais militares e bombeiros militares já tinham direito à aposentadoria integral, uma vez que foram incluídos nas regras das Forças Armadas na reforma da Previdência.
Outra concessão do relator foi a mudança no valor da pensão por morte para dependentes de policiais civis e federais, que passa a ser vitalício e equivalente à remuneração do agente em caso de morte no exercício da função. A reforma da Previdência havia definido que o benefício seria proporcional ao tempo de serviço.
Desde a primeira versão do parecer de Maia, cargos ligados à segurança pública já estavam incluídos no rol daqueles considerados exclusivos de estado, o que significa que não poderão ser ocupados por servidores com contrato temporário. Além de policiais civis, federais e rodoviários, o relator incluiu na segunda versão de seu substitutivo guardas municipais, policiais legislativos e agentes socioeducativos na mesma classificação.
Em uma versão preliminar do primeiro substitutivo apresentado por Maia, no dia 31 de agosto, havia ainda a previsão de poder ao diretor-geral da PF de escolher delegado que assumiria determinado inquérito. O dispositivo, que poderia abrir brecha para ingerência política no órgão, foi retirado no dia seguinte. “Foi um equívoco”, alegou o deputado.
As mudanças são alvo de críticas por analistas que acompanham a tramitação da PEC. Logo após a apresentação da segunda versão do relatório de Maia, o Centro de Liderança Pública (CLP) disse considerar “impossível que se defenda a aprovação desta PEC”. Em parecer técnico, atacou diretamente a “série de privilégios para as polícias”.
“O mais grave [do parecer] é a tentativa de mudar a Constituição para fazer do Brasil uma república de policiais. O relatório se esmera em conceder privilégios a grupos ligados à segurança pública”, diz artigo assinado pela economista Ana Carla Abrão, pelo ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e pelo jurista Carlo Ari Sundfeld.
“Cria monopólio de acesso ao cargo de delegado-geral da Polícia Federal, imuniza com foro privilegiado os delegados-gerais das polícias civis dos Estados, dá aposentadorias e pensões especiais a policiais e outros agentes de segurança, e assim por diante. Nada a ver com reforma administrativa. É pura captura do Estado por grupos de servidores armados”, consideram os autores.
Entidades como a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) e a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol), por sua vez, defendem a manutenção dos dispositivos. Importante segmento da base eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, as categorias teriam respaldo do Palácio do Planalto na negociação com Maia.
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