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Ministro Barbosa: “houve surpresa, mas estamos trabalhando”. | Ueslei Marcelino/Reuters
Ministro Barbosa: “houve surpresa, mas estamos trabalhando”.| Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Apesar de todos os alertas, o pior cenário chegou para a economia brasileira. Após nove dias da decisão da presidente Dilma Rousseff de enviar o projeto de Orçamento com déficit em 2016, a agência internacional de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) retirou do Brasil o grau de investimento – uma espécie de selo de bom pagador que dá confiança aos investidores para aplicarem o dinheiro num país.

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A decisão expõe uma derrota anunciada. O mercado já tinha colocado a possibilidade de rebaixamento nos preços dos ativos, mas os juros e o dólar devem abrir nesta quinta (9) em forte alta como reflexo da decisão.

O Brasil agora entrou para a categoria de país com risco especulativo, o que vai encarecer o custo de financiamento das empresas brasileiras e obrigar muitos investidores estrangeiros a se desfazerem de suas aplicações do país. A S&P rebaixou o rating do Brasil de BBB- para BB+ e manteve a perspectiva negativa da nota.

A perda ocorreu sete anos depois da mesma S&P ter colocado, pela primeira vez, o Brasil no seleto grupo de países com a nota de grau de investimento. Não foi fácil o Brasil ter chegado a esse nível, já que por muito tempo carregou o estigma de ter pedido moratória da dívida externa na década de 80.

Moody’s

Horas antes de a S&P informar que rebaixou a nota do Brasil a grau especulativo, o vice-presidente de comunicação estratégica da Moody’s disse que a agência mantinha o selo de bom pagador ao país. Em palestra para empresários brasileiros em Nova York, Eduardo Barker afirmou que, com a perspectiva da nota do país estável, a Moody’s revisaria o conceito do país antes do prazo previsto de 12 meses apenas se acontecesse um “evento brusco”.

“Os desafios políticos do Brasil continuam a aumentar, pesando sobre a capacidade e a vontade do governo em apresentar um orçamento para 2016 ao Congresso coerente com a correção política significativa sinalizada durante a primeira parte do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff”, disse a agência no comunicado divulgado nesta quarta-feira (9), no início da noite.

A S&P espera que a contração econômica do Brasil seja mais profunda e longa e que o país enfrente dois anos consecutivos de retração do Produto Interno Bruto (PIB). Para 2015, a agência projeta que o PIB irá recuar 2,5%. Em 2016, a retração deve ser de 0,5%. A S&P acredita que o país somente voltará a crescer, ainda que modestamente, em 2017.

Surpresa

A decisão da agência impõe um golpe para a presidente Dilma Rousseff, que não conseguiu nesses oito primeiros meses do ano sinalizar confiança e rumo em meio ao agravamento da crise política de governabilidade. Fiador da manutenção do grau de investimento, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, perdeu uma das suas principais bandeiras quando desembarcou no governo.

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, reconheceu que a notícia foi recebida com surpresa pelo Planalto. “Houve surpresa, mas estamos trabalhando”, disse, após reunião com a presidente Dilma Rousseff.

Segundo ele, a mensagem do governo após o rebaixamento é de tranquilidade e de segurança para todos, “porque continuamos com o esforço de melhorar a situação fiscal do Brasil”. De acordo com o ministro, o mais importante é que o governo brasileiro continua a honrar todos os seus contratos.

Decisão reflete retrocesso fiscal, dizem analistas

O rebaixamento do grau de investimento do Brasil pela Standard & Poor’s (S&P) e a manutenção da perspectiva negativa para o rating do país são, segundo a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, uma dupla resposta ao retrocesso da situação fiscal e econômica no último mês.

Zeina lembrou que, quando a agência colocou em negativa a perspectiva do Brasil, deixou bem claro que via esforço do país em promover o ajuste fiscal, mas que vislumbrava dificuldade na sua execução. “Com o envio ao Congresso de um orçamento negativo, o governo confirmou a previsão da S&P de que o Brasil mostrava dificuldade de executar o ajuste fiscal”, disse a economista. Para ela, o governo não encaminhou nenhuma medida que seria tomada para corrigir o orçamento deficitário.

Pressão adicional

Em entrevista à Gazeta do Povo na tarde desta quarta-feira (9), horas antes de a S&P rebaixar a nota brasileira, o economista Otaviano Canuto, diretor-executivo pelo Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI), disse que, embora a perda já estivesse “precificada” pelo mercado, sua eventual confirmação traria uma pressão adicional.

“Com a materialização da perda, alguns dos investidores institucionais que ainda detêm em carteira os títulos do Brasil passariam a ser obrigados a vendê-los. Isso significaria uma segunda onda, um segundo choque”, explicou.

Segundo Canuto, boa parte dos investidores institucionais estrangeiros (fundos de pensão, por exemplo) só podem investir em países que tenham o grau por duas agências de rating, o que ainda é o caso do Brasil, uma vez que Moody’s e Fitch mantém o país entre os destinos considerados seguros para se investir.

Processo para garantir meta fiscal será completado, diz Levy

Depois do rebaixamento do rating brasileiro pela S&P, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, reafirmou, em nota, o compromisso do governo brasileiro com a consolidação fiscal. A nota foi distribuída pelo Palácio do Planalto – Levy estava nesta quarta em São Paulo.

De acordo com o ministro, o processo para garantir a meta de superávit primário de 0,7% no ano que vem será completado nas próximas semanas, com o envio de propostas na área de gastos e receitas discutidas com o Congresso Nacional, além de ações de caráter estrutural nos próximos meses.

“O governo entende que o esforço fiscal é essencial para equilibrar a economia em um ambiente global de incerteza e, juntamente com iniciativas microeconômicas, aumentar a produtividade do país e criar as condições para a retomada do crescimento na esteira do fim do boom das commodities”, afirmou o ministro.

Levy destacou as medidas macroeconômicas tomadas desde o começo do ano, como a redução de subsídios, o corte de R$ 78 bilhões de despesas discricionárias e votação de medidas do ajuste fiscal. “Esse esforço complementa as medidas macroeconômicas tomadas desde o começo do ano que já tem se refletido no processo de reequilíbrio das contas externas e na queda das expectativas de inflação para 2016 e 2017”, completa.

Proposta de reter recursos do Sistema S ganha força

Uma das propostas em estudo pelos técnicos do Congresso para reduzir o déficit do Orçamento 2016, calculado em R$ 30,5 bilhões, é a retenção de até 30% do valor repassado ao Sistema S, como Sesi, Senai e Senac. As entidades recebem recursos para promover a qualificação de trabalhadores da indústria e do comércio.

A medida, que depende de mudança na Constituição, já foi apresentada ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) contou que se reuniu com o ministro, na última semana, quando apresentou a ideia de criar uma espécie de Desvinculação de Receitas da União (DRU) para permitir ao governo reter parte dos valores destinados ao Sistema S. O líder do governo na Comissão Mista de Orçamento, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), também defende a medida como forma de fechar as contas do orçamento.

Em resposta a pedido de informação formulado pelo senador, a Controladoria Geral da União (CGU) revelou que em 2014 as entidades do Sistema S tiveram receita de R$ 31,09 bilhões. Neste ano, a receita das entidades somará R$ 36 bilhões.

Um dos argumentos é que parte expressiva dos valores destinados ao Sistema S não está sendo usada. “Se o governo pegar parte dessa contribuição não irá onerar o Sistema S, porque ao menos R$ 18 bilhões estão aplicados em bancos. Ou seja, não estão sendo usados na formação dos trabalhadores”, disse Oliveira.

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