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aço trabalhador
Aço é um dos produtos brasileiros que podem sofrer a retaliação de Donald Trump.| Foto: Bigstock.

O presidente norte-americano, Donald Trump, ameaçou taxar as importações brasileiras se o governo de Jair Bolsonaro não reduzir as tarifas impostas pelo Brasil ao etanol dos Estados Unidos. Trump não especificou quais produtos estão na mira, mas especialistas avaliam que aço e carnes podem ser afetados.

Ferro e aço representam 10% das exportações brasileiras para os EUA e, no primeiro semestre deste ano, somaram US$ 1,2 bilhão. As carnes bovina processada e suína têm um peso muito menor: as exportações com destino ao mercado norte-americano em 2020 giraram em torno de US$ 60 milhões, de acordo com Ministério da Economia. Não há dados disponíveis sobre a carne bovina in natura, que voltou a ser exportada para os EUA em fevereiro, após três anos de suspensão.

“A possibilidade de retaliação é real porque o tema é sensível, por causa do cenário eleitoral americano, mas não só por isso. O agro americano – açúcar, milho e soja principalmente – é um lobby bastante habilidoso. Independente das eleições, já tem uma pressão muito forte”, avalia Verônica Prates, especialista em comércio exterior da consultoria BMJ.

Atualmente, o Brasil aplica a isenção para importação de até 750 milhões de litros de etanol dos EUA por ano, mas a partir daí a tarifa é de 20%. A cota já foi flexibilizada, mas a embaixada norte-americana no Brasil tem feito apelos ao governo para derrubar as tarifas.

Apesar das ameaças de Trump, os principais produtos brasileiros exportados para os EUA – como petróleo e derivados, celulose, maquinários e aviões – devem ser poupados da taxação, de acordo com José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil.

Isso porque, em muitos casos, as exportações brasileiras são de empresas americanas instaladas no Brasil. “Seria um tiro no pé. Teoricamente não há produtos de peso que possam ser taxados que tenham impacto positivo nos Estados Unidos e negativo no Brasil. Hoje os produtos são mais pulverizados. Mas Trump é imprevisível”, afirma.

Nessa guerra comercial, os Estados Unidos são muito menos protecionistas que o Brasil. Em média, os EUA aplicam uma tarifa de 2,3% sobre os produtos importados. No Mercosul a taxa média é de 14%, segundo o Ministério da Economia.

O Brasil na guerra comercial EUA-China

Embora Bolsonaro reforce a todo momento sua amizade com Trump e a proximidade do Brasil com os EUA, a China é disparadamente o primeiro parceiro comercial brasileiro. No primeiro semestre de 2020, as trocas comerciais entre os dois países somaram cerca de US$ 60 bilhões, mais que o dobro da corrente de negócios com os EUA (US$ 26 bilhões).

“A gente não pode se dar ao luxo de escolher um lado. O mais saudável para o Brasil é não se posicionar. Mas, independente da guerra comercial, não é interessante para o Brasil ficar dependente de nenhum mercado comprador, seja Estados Unidos, seja China”, diz Verônica.

O país asiático comprou 35% das exportações brasileiras de janeiro a julho. Os EUA, menos de 10%. Se a balança comercial brasileira apresentou superávit de US$ 32 bilhões no primeiro semestre, a principal causa foi a forte redução das importações. Elas somaram US$ 93 bilhões, enquanto no mesmo período do ano passado foram de US$ 101 bilhões.

Por causa da pandemia, as exportações brasileiras como um todo também caíram. A redução é de quase 7% em relação ao ano passado, mas, para os Estados Unidos, a queda foi maior: -38% no primeiro semestre. Hoje o Brasil tem um saldo negativo de US$ 3 bilhões no comércio com os EUA.

“O Brasil infelizmente hoje não tem força política e econômica para contrariar os Estados Unidos”, avalia Castro. Sobre a amizade entre Trump e Bolsonaro, ele diz que o Brasil não tem escolha, mas que “em alguns casos o Brasil está sendo usado” pelo presidente americano na guerra contra a China.

Assim se explicariam os ataques a Pequim desferidos pelo chanceler Ernesto Araújo, o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). “No fundo, ele [Trump] quer que o Brasil fale e eventualmente pague o preço”, afirma Castro.

O que muda se Joe Biden for eleito

O candidato democrata Joe Biden, que lidera as pesquisas para a Casa Branca, escolheu a senadora Kamala Harris como vice na chapa. Kamala já criticou a política ambiental brasileira no ano passado, o que mostra que as relações entre os dois governos podem se complicar em caso de uma vitória democrata.

“O jogo do Brasil tem quer ser político. Os democratas são muito protecionistas, vamos ter que ter um jogo de cintura político e diplomático muito grande”, afirma Castro.

Hoje os dois países têm negociações em três frentes principais: facilitação do comércio, boas práticas regulatórias e comércio digital. A maior vitória até o momento foi a abertura, em fevereiro, do mercado norte-americano para a carne bovina brasileira.

“Tivemos avanços no governo Bolsonaro, mas demorou para a máquina pública e o empresariado se aproveitarem dessa circunstância e dessa janela. A eventual eleição de Biden muda um pouco as prioridades, mas mais para o lado de lá do que para o lado de cá”, explica Verônica.

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