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Com medo de fazer pesquisas sobre assuntos em que reina o ativismo com força judicial, um grupo de 40 acadêmicos decidiu criar uma revista científica que permitirá a publicação de estudos anônimos, sobre temas delicados, assinados por pseudônimos.

O Jornal das Ideias Controversas (“Journal of Controversial Ideas”) será lançado no início de 2019. De acordo com um dos seus editores, Jeff McMahan, professor de filosofia moral na Universidade de Oxford, a medida vai permitir que pesquisadores possam divulgar estudos polêmicos, sejam contra ideias de direita ou de esquerda, ou que possam sofrer censura das instituições onde trabalham.

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No programa de rádio “University Unchallenged”, da BBC, McMahan afirmou que há muitas pressões sofridas pelos cientistas nas universidades, o que os leva a não aprofundar no conhecimento em alguns temas, por medo do que possa acontecer.

“O medo vem da crítica tanto da esquerda quanto da direita. As ameaças de fora da universidade tendem a ser mais da direita. As ameaças à liberdade de expressão e à liberdade acadêmica que vêm de dentro da universidade tendem a ser mais da esquerda”.

Para garantir a seriedade dos trabalhos enviados, será estabelecido um conselho editorial internacional. Entre os envolvidos no projeto estão acadêmicos “controversos”, como a professora de Bioética Francesca Minerva, da Universidade de Ghent, e o filósofo Peter Singer, da Princeton University. Francesca é coautora de um artigo polêmico, pelo qual pediu desculpas depois – “Aborto pós-natal: por que o bebê deveria viver” – e Singer também assusta por defender o infanticídio e a eutanásia.

À BBC, McMahan, apesar de ser favorável ao aborto, defendeu a liberdade do grupo de estudantes da Oxford Students For Life, que foi impedido de defender a vida desde a concepção, na Irlanda, por um grupo de feministas, e continua sendo perseguido por suas posições – ou seja, sem liberdade acadêmica. Mencionou também que gostaria de defender a liberdade de Nigel Biggar, também professor de Oxford, que escreveu um artigo científico polêmico sobre a necessidade de lembrar e se orgulhar de avanços do governo britânico durante o regime imperialista – ainda que isso seja feito junto com o reconhecimento dos graves erros realizados no período – e que, por isso, quase perdeu o emprego pelas manifestações de grupos antirracistas.

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Críticas

Em artigo no “The Guardian ”, a jornalista sudanesa Nesrine Malik criticou a iniciativa e afirmou que a busca por um lugar seguro para publicar ideias polêmicas pode ser uma fuga medrosa da forte repercussão que alguns estudos devem causar. Segundo ela, eles querem publicar de forma irresponsável, sem arcar com as consequências. “É tudo o que o zeitgeist [termo alemão para ‘espírito da época’] condena: suscetível, superprotegido, incapaz de se envolver na agitação do mercado de ideias”.

Ela os acusou ainda de querer causar mais polarização para lucrar com isso, por meio de “forças do mercado”, além de poder provocar o “martírio” de alguém ou de um grupo que tenha sido apontado pela pesquisa. “Ninguém gosta da reação que qualquer pessoa com qualquer plataforma pública recebe nos dias de hoje (...) mas alguém não deve reivindicar o martírio e se esconder dele, especialmente se você estiver saindo do seu caminho para incitá-lo”.

Em resposta, Jeff McMahan, Francesca Minerva e Peter Singer enviaram uma carta ao “The Guardian ”. Eles refutam ter qualquer tipo de financiamento de “forças de mercado” e reafirmaram que entre os cerca de 40 pesquisadores participantes do grupo há acadêmicos com ideias muito diferentes.

“O nosso objetivo ao estabelecer a revista é apenas permitir que acadêmicos (...) tenham a opção de publicar sob um pseudônimo quando poderiam ser impedidos de publicar por medo de ameaças de morte (que dois de nós já recebemos), ameaças a suas famílias ou ameaças a suas carreiras. O uso do pseudônimo é opcional, não é obrigatório”, afirmam.

“Nossa intenção é publicar apenas artigos que forneçam razões, argumentos e evidências cuidadosamente desenvolvidos em apoio a conclusões que alguns possam achar ofensivas ou perniciosas. Não publicaremos trabalhos polêmicos, apenas pela polêmica ou ad hominem. Esses objetivos e restrições têm consistentemente guiado nossa própria escrita.”

Os editores disseram ainda que a revista será gratuita, sem fins lucrativos.

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