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| Foto: CARL DE SOUZAAFP

O assunto do novo ano letivo nas universidades públicas brasileiras é a criação de cursos destinados a estudar o “golpe” contra Dilma Rousseff. 

Primeiro foi a UnB, onde a disciplina “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” foi oferecida pelo Instituto de Ciência Política para alunos de graduação. O ministro da Educação, Mendonça Filho, reagiu contra o que chamou de “prática de apropriação do bem público para promoção de pensamentos político-partidários”, e prometeu acionar o Ministério Público Federal, a Advocacia-Geral da União, a Controladoria-Geral da União e o Tribunal de Contas da União. 

Como reação, outras universidades públicas decidiram criar cursos ou disciplinas parecidas com a da UnB: Unicamp, UFBA, UFAM e UEPB se juntaram à instituição de Brasília.

No fim, o debate ultrapassou a política e chegou ao Direito: a autonomia universitária assegura o direito de criação de matérias assim? 

O professor Valmir Pereira, idealizador do curso da UEPB, tem certeza que sim. "Nossa atitude é em solidariedade a um colega e a uma instituição que estão sofrendo com a volta daquela postura da ditadura militar, com interferência na autonomia da universidade e na liberdade de cátedra do professor", disse ele à Gazeta do Povo

Segundo o docente, o uso de “golpe” em vez de “impeachment”, é uma tomada de posição. “Eu não usaria uma palavra neutra, porque a palavra neutra seria para esconder um fato. O uso da palavra “golpe” é uma demarcação do campo, para dizer que nós estamos em oposição”, reconhece ele.  

É verdade que o artigo 207 da Constituição garante “autonomia didático-científica” às universidades. Mas também é verdade que, no artigo 206, a mesma Constituição prevê que o ensino se dê com “pluralismo de ideias”. 

De forma mais ampla, o artigo 1º da Constituição trata o “pluralismo político” como “fundamento” da República. 

O jurista Alexandre Magno, especialista em direito educacional, acredita que as universidades se excederam ao criar cursos sobre o “golpe”: “Isso vai contra o princípio do neutralismo estatal, de que as entidades estatais não podem ter posições políticas ou ideológicas”, afirma. 

Segundo Magno, outra consequência do uso da palavra “golpe” sem questionamentos é a ofensa à liberdade de opinião dos alunos. 

“O aluno que considera o processo de impeachment legítimo fica obrigado a se manifestar de forma contrária à sua própria consciência”, diz o jurista. 

O professor Valmir garante que isso não acontecerá, e afirma que alunos a favor do impeachment podem participar do curso. "Serão muito bem-vindos e terão espaço para sua opinião. Vamos observá-los do ponto de vista da argumentação, a força e a consistência dos argumentos que eles vão utilizar para defender o ponto de vista deles", diz. 

Para além do debate jurídico, a criação de cursos (alguns deles, valendo créditos para a formatura) sobre o “golpe de 2016”, com bibliografias pinçadas para apresentar apenas um lado do debate, tem uma consequência imediata: fica mais difícil negar a existência de aparelhamento ideológico nas universidades públicas brasileiras. 

Histórico 

A discussão sobre o limite entre a liberdade de cátedra e a neutralidade do Estado já chegou à Justiça antes. Em 2013, a Justiça Federal determinou o fechamento do “Centro de Difusão do Comunismo” na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).

Há menos de um ano, o Ministério Público Federal processou os responsáveis pelo Colégio Pedro II (que é federal), alegando que a direção permitiu o funcionamento de um núcleo do Psol na instituição de ensino. O juiz, entretanto, negou o pedido.

Por outro lado, o Ministério Público Federal não viu razões para agir quando a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) promoveu a realização de um ato em favor da volta de Dilma Rousseff à Presidência.

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