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| Foto: ARUN SANKARAFP

Uma das principais brigas que a gerente de operações, Zsófia Alapi, tinha com a filha de 13 anos, Kinga Alapi, era sobre o tempo que a adolescente “perdia” frente ao computador ao invés de estudar. Mas isso é questão do passado: neste ano as brigas diminuíram consideravelmente, afinal Kinga ingressou no ensino médio e passou a fazer a lição de casa nas... redes sociais. 

“Não podemos lutar contra as redes sociais. É onde o adolescente passa a maior parte do tempo e também algo que fará parte da vida adulta. Então melhor conscientizá-lo para o uso saudável”, diz a coordenadora da escola húngara Leövey Klára Gimnázium, Rózsa Tőke. 

Tendência

Na Hungria, escolas tipo gimnázium estão abraçando essa ferramenta de diversas formas. Por exemplo, na Leövey, os adolescentes estão proibidos de usarem smartphones e computadores durante a aula, mas podem acessar o conteúdo dado em classe após o horário escolar em grupos de Facebook.

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Cada disciplina tem seu grupo, mediado por dois ou três professores. Os adultos postam a lição de casa, assim como materiais complementares. Mas as postagens não são limitadas apenas aos professores: todos podem interagir. 

“Facilita muito porque é algo que já fazemos normalmente. Normalmente falamos com nossos amigos por Whatsapp quando temos alguma dúvida, mas acho melhor nos grupos porque se parece com um banco de dados que sempre podemos pesquisar. E tem também o professor que sempre nos ajuda”, fala Kinga. 

Os alunos curtiram a nova proposta com a mesma velocidade de um like, mas os pais demoraram um pouco mais para se adequarem. “No começo achei super estranho. Minha filha falava ‘estou no Face fazendo a lição de casa’. Sempre achava que ela estava me enganando e pedi para ela me mostrar. Falei com os professores e vi que era uma boa prática”, diz a mãe de Kinga, Zsófia.

Os pais não têm acesso aos grupos – os únicos adultos que podem ingressar são os professores e auxiliares. Rózna conta que aplicou essa metodologia pela primeira vez há pouco mais de cinco anos; hoje já está acostumada a encarar as dúvidas dos pais.

“São gerações muito diferentes. A Hungria e a Europa estão muito diferentes. Eu mesma levei um tempo até me acostumar com esta ideia, mas meus quarenta anos como educadora me ensinaram que não dá para lutar contra o futuro”, explica. 

Prevenção

Outra escola que aderiu as redes sociais no seu dia-a-dia, foi a Budai Jazno Gimnázium. Eles criaram grupos de Facebook para realizar debates com temas como gravidez, drogas e bullying. 

“Percebemos que assim a internet se torna uma extensão do ambiente escolar. Então escolhemos trabalhar esses temas que já são delicados em uma plataforma mais informal”, explica a orientadora Judith Szanta, que usou a plataforma Sarahah para responder dúvidas dos alunos escolheu o site por manter a identidade do aluno em sigilo. 

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“Demos uma aula explicativa sobre o sistema reprodutor e ninguém me perguntou nada. Assim que cheguei em casa e acessei o Sarahah vi que tinham mais de cem mensagens com dúvidas honestas”, explica. 

Além de estabelecer um elo entre docente e aluno, Szanta acrescenta um benefício também para o professor. “Eram perguntas que não ocorriam há anos. Percebi as falácias na minha explicação muito mais rápido e já aprimorei para a turma seguinte”, diz.  

Como trabalhar com as redes sociais 

Para a pesquisadora da Unicamp, Cristiane Dias, o maior benefício é o debate que se cria ampliando o conhecimento do aluno, mas primeiro é necessário aprender a “ler a internet”. 

“Não lemos mais da mesma forma que líamos no século passado. Temos que mostrar a elas que diferentes formas textuais demandam diferentes formas de leitura. E a internet é uma delas”, diz Cristiane. 

Do mesmo jeito que a internet promove o debate, é importante que o professor também encontre um modo de ensino menos engessado.

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“Acho que o principal cuidado para que qualquer trabalho com redes sociais funcione é não descaracterizá-la. Este é o maior desafio: encontrar uma forma de não ‘didatizar’ as redes sociais e, ao mesmo tempo, fazer com que o aluno perceba que ali ele também pode aprender e produzir conhecimento”, pondera a pesquisadora. 

Números

Segundo dados do IBGE, divulgados em fevereiro deste ano, o Brasil tem 116 milhões de usuários de internet. Isso representa uma porcentagem de 64,7% da população com acesso à internet. Deste total, 94,6% acessa a internet pelo celular.

O Brasil ainda está no quarto lugar de países que mais acessam à internet, segundo relatório sobre economia digital divulgado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês). Mas por que a internet ainda é vista como inimiga? 

“Podemos estar à frente de muitos países no que diz respeito a um processo formativo para o digital, tanto no que se refere à compreensão, leitura, formação crítica, mas também no que diz respeito à produção de tecnologias inovadoras”, conclui Cristiane. 

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