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| Foto: Felipe Mayerle/Gazeta do Povo

Nervos à flor da pele, ansiedade, lista mental do que não pode ser esquecido. O momento de reunião entre família e professores pode render uma dose extra de adrenalina quando não há confiança nessa relação. A missão de ensinar não é exclusiva da escola e nem a de educar deve ficar restrita à família. Cada um tem sua responsabilidade específica, mesmo com objetivos, métodos e conteúdos diferentes, seja no ensino formal, ou nas habilidades sociais.

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Diversos estudos já comprovaram o impacto positivo que tem o envolvimento da família no desempenho escolar da criança. O próprio Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) tem demonstrado que nas escolas onde há parceria com os pais e bom relacionamento com diretor e professores, o aprendizado dos alunos é melhor.

Mas o que pode parecer óbvio, não flui tão facilmente no dia a dia. Pesquisa do Observatório do Universo Escolar, em parceira com Ministério da Educação, mostrou que, para professores brasileiros, só 13% das escolas têm um relacionamento próximo com as famílias, sendo que 43,7% dos pais de alunos da rede pública afirmaram que participariam mais da vida escolar do filho se a escola promovesse mais encontros e palestras interessantes.

Pais por perto ajudam ou atrapalham? Depende

Um grande estudo feito nos Estados Unidos analisou o comportamento de pais de diferentes perfis em relação à escola e avaliou as notas dos alunos ao longo de 30 anos. As conclusões decepcionaram alguns educadores: a proximidade dos pais, que frequentavam reuniões, faziam trabalho voluntário na escola e ajudavam nos estudos, teve pouca influência nas notas. Apenas dois aspectos tiveram efeito positivo comprovado no desempenho escolar: quando os pais liam em voz alta para os filhos pequenos e quando conversavam com os mais velhos sobre temas do futuro, como carreira.

Entre crianças mais velhas, a partir do 6º ano, o efeito foi até negativo quando os pais acompanhavam as lições de casa. Muito provavelmente por gerar dependência e não incentivar a autonomia dos estudantes. O estudo, publicado pela editora de Harvard e comentado pelos autores em artigo no jornal “The New York Times” avaliou apenas o resultado em leitura e matemática, por isso foi criticado. Principalmente porque a maior participação dos pais pode influenciar outros aspectos, como habilidades sociais ou autoestima.

Uma das maiores queixas das escolas diz respeito à omissão das famílias. Responsáveis pelo ensino dos filhos até o século 19, as famílias perderam esse papel quando a escola assumiu com força o ensino de modo formal e massivo. O movimento agora é o de recuperar essa relação, tarefa desafiadora frente a tantos compromissos dos pais. Nesse cenário, a construção de bons hábitos entre família e escola só pode ser bem-sucedida se o foco for o bem da criança. “É preciso fechar esse triângulo saudável e promover sempre uma relação de confiança entre pais, escola e o próprio aluno. A família precisa se sentir à vontade para vir à escola ou atender ao pedido de vinda quando a escola considera necessário”, explica a gestora do ensino fundamental do Colégio Positivo Maria Fernanda Suss.

Em meio a esse debate sobre funções, pais ainda não compreenderem que parte do aprendizado do filho é de sua responsabilidade, explica a professora das séries iniciais da Educação Básica Selma Inês, autora do livro “Reunião de Pais - organização e planejamento”, da Wak Editora. “O mais comum são pais dizerem que função de educar é da escola e que eles não têm tempo pra se preocupar com isso, pois trabalham o dia inteiro. Mas a missão de educar não é exclusiva da escola, pertence também à família e à sociedade”.

Para isso, as escolas também precisam agir no sentido de atrair e acolher os pais, como afirma a psicopedagoga Marta Relvas, neurobióloga da aprendizagem. “Passamos por um momento de conflito muito grande, e o aluno é o único que não tem culpa de nada. Se há pouca interação com pais dentro do projeto político pedagógico da escola essa falha é da própria escola também. A escola deveria ser também para pais, pois eles muitas vezes nem se lembram de que já foram alunos”, diz.

Há várias maneiras de encerrar os conflitos e iniciar um diálogo em prol do aproveitamento escolar.

Levantamos com especialistas quais motivos levam ao estresse nas relações e as dicas para que juntas, casa e escola, possam favorecer o desenvolvimento das crianças e jovens. Confira:

Pais que fazem a lição de casa dos filhos

Alguns pais não se preocupam por questões importantes para a aprendizagem, como a lição de casa – inclusive, reclamam na escola pelo excesso de tarefas. A professora Selma Inês conta que esses mesmos pais acabam preenchendo as questões no lugar dos filhos. “Tem criança que chega com a lição feita com aquela letra redondinha, perfeita demais para ter sido feita por ela, ou outra que se nega a copiar do quadro porque a mãe diz que não precisa, já que depois ela tem outros meios para conseguir, como pedir o conteúdo para outras mães pelo whatsapp”, afirma. O resultado é perverso: uma criança que não vê os pais tratando a escola, o professor ou as tarefas como algo importante, vai ter mais dificuldades nos estudos.

Se o filho é mais velho, logo chega aquela mensagem ou ligação: “o professor me expulsou da sala porque blábláblá eu não fiz nada”. Será? Alguns motivos óbvios podem levar um adolescente a inventar desculpas ou pequenas (ou grandes) mentiras.

Professores devem reclamar menos do comportamento e apostar mais no ensino

Os assuntos que prevalecem nas reuniões individuais da escola com os pais são os relacionados ao comportamento, e não à aprendizagem, de acordo com uma pesquisa realizada com quase mil educadores pelo Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e da Fundação Victor Civita. Além das cobranças e reclamações, algumas escolas tentam inclusive interferir na vida das famílias. “Em uma reunião as professoras chegaram a me sugerir que parasse de trabalhar fora para poder cuidar dos meus dois filhos no contraturno e perguntaram se o pai deles não dava conta de manter a família”, contou uma mãe, que preferiu não de identificar.

Para que isso não ocorra, ambas as partes devem ser objetivos e claros para que o momento de conversa tenha foco na aprendizagem da criança, e o que pode ser feito em casa e na escola para melhorar isso. É interessante preparar previamente esse encontro e levar as dúvidas já anotadas. O horário das reuniões também é determinante para a participação: se a escola não disponibiliza horários viáveis para os pais que trabalham, isso deve ser negociado.

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Reunião da turma não é espaço para questões individuais

A reunião de pais e mestres é uma excelente oportunidade pra rever conceitos, formar e mudar de opinião, refletir sobre prática e atitude, aprofundar o conhecimento, esclarecer dúvidas e estreitar relações, segundo Marta Relvas. Como reuniões da turma toda costumam ser sobre aspectos gerais, os pais precisam estar atentos para aguardar o final para falar com o professor sobre alguma questão particular do desempenho do seu filho. Os pais precisam ser cuidadosos também ao abordar o pai ou a mãe de alguma criança com quem seu filho possa ter algum problema de relacionamento; o ideal, nesses casos, é fazê-lo na presença de um professor, que pode atuar como mediador. Esse é bom momento para alinhar expectativas e conhecer como é estruturado o dia a dia da turma dentro da escola.

Aproxime-se

Conheça o trabalho da Associação de Pais e Mestres da escola, que não deve se restringir a arrecadar dinheiro ou organizar festas. Essa proximidade pode render benefícios não só para a própria comunidade escolar como favorecer o comprometimento dos filhos com os estudos. Algumas escolas têm outras atividades voltadas para as famílias, como grupos de discussão ou de voluntariado. Se não houver, busque se informar como pode iniciar um. Essa proximidade pode fortalecer o relacionamento com outras famílias e o vínculo do aluno com a escola.

Chega de desculpas

A família deve ensinar, desde cedo, que o filho precisa assumir a responsabilidade pelo que faz ou deixa de fazer. Professores reclamam das desculpas que acabam chegando com frequência em sala de aula. Dependendo da idade do aluno, do início do fundamental ou na graduação, a resposta pode variar entre “meu cachorro (ou gato) comeu a lição” até “meu filho rasgou” ou “a janela do ônibus estava aberta, choveu e molhou o trabalho”.

Respire fundo

Em caso de conflito, é fácil agir “à la leoa” em defesa do filhote. É importante agir racionalmente e manter o equilíbrio emocional ao questionar a escola. Assim como professores precisam agir como pacifistas das relações até com os pais. “Acontece de estarmos tentabdo lidar com um comportamento negativo do aluno e quando chega a família vemos que são iguais, fazem as mesmas coisas bizarras. É preciso estar equilibrado e focar na aprendizagem do aluno para não se render a essa intolerância que estamos vivendo em todos os lugares”, diz Marta Relvas.

Analise os dois lados

Se o filho é mais velho, logo chega aquela mensagem ou ligação: “o professor me expulsou da sala porque blábláblá eu não fiz nada”. Será? Alguns motivos óbvios podem levar um adolescente a inventar desculpas ou pequenas (ou grandes) mentiras. Professores têm recebido cada vez mais ameaças e reações violentas de pais que não se preocupam em descobrir a verdade. Papel de pai não se restringe a defender os filhos, mas engloba, entre outras funções importantes, a de encorajar seus filhos para que possam cuidar das suas relações e enfrentar os conflitos. Hoje na escola, amanhã no trabalho e em todas as outras áreas da vida.

Toda a hora é hora, mas com bom senso

Não adianta querer esclarecer todas as dúvidas quando a criança está entrando em sala, mas momentos informais, como a entrada e a saída, podem ser aproveitados para troca de informações rápidas. Verifique se a escola tem um sistema de agendamento de reuniões, telefone par agendar um horário ou se informe se o professor troca mensagens por e-mail com as famílias. Às vezes um telefonema ou recado já ajudam a tirar uma dúvida sobre a lição do dia seguinte. O que não pode é chegar ao final do ano sem esse diálogo. Também é papel da escola estar disponível para atender às famílias.

Confie nos profissionais

Quando o rendimento não vai bem, muitas vezes não se trata de um problema sério de aprendizagem, mas de falta de rotina de estudo, de um olhar mais atento da família, lembra a gestora escolar Maria Fernanda Suss. Nesses casos, é importante o diálogo com a escola para que se entenda o momento daquele aluno. Toda família quer o melhor para o filho, mas no que se refere à aprendizagem, os profissionais estão dentro da escola. “Acontece de aparecer um pai querendo dar pitaco no andamento das atividades, mas quando percebemos esse movimento da família interferir no trabalho da escola, sempre há chamada para posicionamento. A família tem que confiar nos profissionais que se baseiam na experiência e nos conhecimentos de base científica para agir daquela forma”, e esse posicionamento vai gerando segurança na família, segundo Mariana.

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