Nesta semana, algo inédito ocorreu na longa história da luta pela legalização do homeschooling no Brasil. O Poder Executivo, por meio do líder do governo na Câmara dos Deputados, deputado Vitor Hugo (PSL-GO), apresentou um requerimento de urgência para o projeto de lei 2401/2019. Trata-se da proposta de regulamentação do ensino domiciliar desenvolvida pelo próprio governo Bolsonaro e enviada ao Congresso Nacional no ano passado. Se o requerimento for aprovado, o projeto ganha tramitação mais célere, indo direto para o plenário da Casa, sem a necessidade de passar pelo vagaroso caminho das comissões que, aliás, sequer foram instaladas em 2020, devido à pandemia do coronavírus.
É a primeira vez que um governo dá tal importância ao tema que tramita na casa há 26 anos. Se o tempo percorrido surpreende alguns, o número de propostas, bem como o perfil de seus autores, costuma resultar em surpresa ainda maior. Ao menos 15 projetos de lei foram apresentados com intuito de produzir a primeira legislação sobre ensino domiciliar no Brasil, protocolados por parlamentares filiados a partidos das mais variadas orientações ideológicas.
O primeiro deles - após a promulgação da Constituição de 1988 - foi do então deputado federal João Teixeira (PL-MT). O projeto de lei 4657/1994 chegou a tramitar por cerca de um ano até ser arquivado ao fim daquela legislatura, procedimento padrão para todas as propostas cuja tramitação não for concluída até o fim do mandato parlamentar.
Foram necessários seis anos até que a regulamentação voltasse a ser proposta e, em 2001, o deputado Ricardo Izar (PTB-SP) protocolou o PL 6001/2001. Curiosamente, dois anos depois, o mesmo parlamentar, na mesma legislatura, apresentou mais um projeto sobre o tema, com texto idêntico ao anterior. Foi o PL 1125/2003, que foi devolvido ao autor pela Mesa Diretora da Casa, por motivos óbvios. No intervalo entre o original e a cópia, surgiu o PL 6484/2002, do deputado Osório Adriano (PFL-DF), que foi apensado ao primeiro de Izar. Ao fim daquela legislatura, ambos foram arquivados.
Em 2008, com Lula na presidência da República, foi um deputado petista quem abraçou a causa da legalização do homeschooling. Henrique Afonso, do PT do Acre, apresentou o PL 3518/2008, mas não obteve sucesso em fazê-lo avançar. Um ano depois, outro parlamentar filiado a um partido de esquerda inovou ao investir não num projeto de lei, mas sim numa proposta de emenda constitucional (PEC). Foi o então deputado, e hoje empresário do ramo de educação, Wilson Picler (PDT-PR). Infelizmente, a PEC 444/2009 teve o mesmo destino de propostas anteriores e foi arquivada quando aquela legislatura acabou.
Passaram-se três anos até que o deputado Lincoln Portela (PL-MG) colocasse uma nova proposta em tramitação, o PL 3179/2012. Embora antigo, o texto tramita até hoje já que Portela foi reeleito deputado duas vezes seguidas e pediu o desarquivamento do projeto a cada início de novo mandato. O PL 3179/2012, aliás, é a proposta que encabeça a comissão especial criada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em dezembro de 2019, com o objetivo de analisar todos os projetos sobre ensino domiciliar na Casa. A instalação da comissão, porém, nunca chegou a acontecer.
Ao 3179/2012 foram apensados todos os projetos que vieram em seguida relacionados ao tema do homeschooling. É o caso do PL 3261/2015, de autoria do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o PL 10185/2018, do deputado Alan Rick (DEM-AC), o PL 5852/2019, do deputado Pastor Eurico (Patriotas-PE), o PL 3262/2019 da deputada Chris Tonietto (PSL-RJ), o PL 6188/2019, do deputado Geninho Zuliani (DEM-SP) e até mesmo a proposta do Poder Executivo, que é o texto para o qual foi solicitada a tramitação em regime de urgência.
Convém mencionar ainda os dois projetos cuja tramitação teve início no Senado, e não na Câmara. Ambos são de autoria do atual líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e, embora os dois tratem de ensino domiciliar, têm textos e objetivos distintos. O primeiro é o PLS 490/2017, que estabelece a regulamentação propriamente dita e está na Comissão de Direitos Humanos, sob relatoria da senadora Soraya Tronicke (PSL-MS). O outro é o PLS 28/2018, que explicita no Código Penal que o ensino domiciliar não caracteriza abandono intelectual. Esse aguarda designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Diante do volume de propostas, da frequência crescente com que foram apresentados, da conscientização dos parlamentares sobre a injusta perseguição contra famílias educadoras e da relevância que o tema ganhou neste período de pandemia, pode-se dizer com tranquilidade que nunca houve momento mais propício e maduro para a aprovação de uma lei do homeschooling como agora.
Estabelecer a urgência para o 2401/2019 é o primeiro passo para colocar fim na persistente e triste omissão do Poder Legislativo acerca do tema.
*Jônatas Dias Lima é jornalista e assessor parlamentar na Câmara dos Deputados, onde atua junto à Frente Parlamentar em Defesa do Homeschooling. E-mail: jonatasdl@live.com.
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