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No DF, a Câmara Legislativa aprovou uma nova lei que inclui a “Educação Moral e Cívica” como conteúdo obrigatório nas escolas públicas e privadas da capital federal. | Fernando Frazão/Agência BrasilFernando Frazão/Agência Brasil
No DF, a Câmara Legislativa aprovou uma nova lei que inclui a “Educação Moral e Cívica” como conteúdo obrigatório nas escolas públicas e privadas da capital federal.| Foto: Fernando Frazão/Agência BrasilFernando Frazão/Agência Brasil

Uma nova lei aprovada no Distrito Federal incluirá a “Educação Moral e Cívica” no currículo das escolas a partir do ano letivo de 2019. 

Especialistas ouvidos pela reportagem, no entanto, afirmam que a medida indica um retorno à educação brasileira do regime militar e não oferece benefícios concretos para os estudantes. 

Histórico

A “Educação Moral e Cívica” foi parte do currículo obrigatório das escolas brasileiras durante o regime militar, com o decreto-lei número 869, de 1969, durante o governo do general Costa e Silva. O período é considerado um dos mais rígidos do regime, principalmente pela criação do AI-5, o Ato Institucional que garantia poder de exceção aos governantes. 

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Na sua configuração original, o ensino de moral e cívica ocorria em duas etapas. A primeira, no ensino primário, ensinava a ética cristã e os valores tradicionais da família brasileira. A segunda etapa, já no ensino secundário, trabalhava conceitos históricos, geográficos, políticos e jurídicos. 

A disciplina se tornou optativa em 1992, sete anos após o fim do regime militar. Em 1993, o presidente Itamar Franco revogou o decreto-lei.

Presente

No Distrito Federal, a Câmara Legislativa aprovou uma nova lei que inclui a “Educação Moral e Cívica” como conteúdo obrigatório nas escolas públicas e privadas da capital federal. O objetivo é incluir como conteúdo transversal nas disciplinas já existentes ou em novas disciplinas incluídas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC). 

O deputado Raimundo Ribeiro, relator do projeto, defende a disciplina como uma forma de ensinar valores morais e éticos e suplementar a educação feita pela família. 

“Hoje ninguém sabe o valor de um símbolo como o Hino Nacional Brasileiro. Noções básicas de direitos que devem ser transmitidas para todas as pessoas também não são repassadas. Tudo isso deveria compor uma gama de conteúdos que precisam ser transmitidos, para formar uma sociedade que adote como principio maior o da solidariedade”, afirma. 

A retomada do conteúdo, segundo o deputado, não é um retorno à educação brasileira da ditadura militar: para ele, que viveu o regime, trata-se de valorizar o amor à pátria – e isso inclui o patriotismo dos militares: 

Em momento algum, o que presidiu a minha ação tem relação com a questão militar. Agora, não posso deixar de elogiar os militares – e não me refiro à época do regime militar, mas sim a todos os momentos da história brasileira: eles remetem ao patriotismo, sentimento de pertencimento e entrega à pátria. 

Controvérsia 

Para o professor Célio da Cunha, docente na UnB e doutor em educação pela Unicamp, o retorno da disciplina pode reviver memórias do regime militar que ainda marcam a sociedade brasileira. 

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“É um retrocesso. O Brasil já tem uma experiência de triste memória dos anos do regime militar. O retorno da educação moral e cívica não acrescenta nada ao sistema educacional. Pode até suscitar polêmicas que esperávamos que já estivessem superadas”, diz. 

Especialistas também consideram a proposta um retrocesso pedagógico; de acordo com Erasto Fortes, doutor em Educação pela Unicamp e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), a experiência do Brasil com a “Educação Moral e Cívica” foi “terrível”. 

Existem inúmeros estudos e pesquisas mostrando que era um processo de adestramento da juventude para a doutrina de segurança nacional, de interesse do estado ditador. É um retrocesso. 

Consequências 

Entre os objetivos da disciplina estão promover a formação básica e levar aos alunos uma educação permeada por cidadania, patriotismo e bons costumes. Mas eles podem estar além do que a escola é capaz de oferecer hoje, de acordo com Verônica Branco, professora de Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR). 

“Se não conseguimos fazer as crianças aprenderem matemática e português, haja vista as avaliações que participamos em larga escala, não resolverá nossos problemas colocar uma disciplina de comportamento”, diz. 

“É uma medida muito simplória que parte de um político que acredita que saturar o currículo da escola resolverá o problema da educação brasileira”, completa.

Para Erasto Fortes, os objetivos da proposta do deputado Ribeiro – aumentar o patriotismo e incumbir valores morais nos estudantes – são válidos, mas redundantes, pois a escola já desempenha esse papel com o currículo atual. 

“Não há sentido que se crie outra disciplina ou um tema transversal para algo que já é feito na escola”, diz. 

Para Célio da Cunha, o ensino de valores morais positivos, defendido pelo deputado Ribeiro, não precisaria estar atrelado à educação moral cívica: esses assuntos já estão devidamente contemplados nas diretrizes curriculares do país e na grade comum curricular nacional. 

“O objetivo do deputado é válido: educação com valores humanos, educação cidadã, reconhecimento da diversidade. Mas esses assuntos já estão devidamente contemplados nas diretrizes curriculares do país e na grade comum curricular nacional”, diz Célio. 

“Fazer a criança cantar hino nacional e hastear a bandeira é algo que já existe nas escolas e nem por isso temos um maior patriotismo por parte dos alunos”, conclui Verônica Branco. 

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