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MC Diguinho no videoclipe de “Surubinha de leve” | Reprodução
MC Diguinho no videoclipe de “Surubinha de leve”| Foto: Reprodução

“De ladinho ah - 

Segredo, silêncio 

Não geme, quietinha 

Confia em mim 

Não vou te machucar novinha 

Relaxe, se acalme 

Não grite, calada” 

Sim, esse é o trecho de uma música – e, sim, é daquilo mesmo que o “eu-lírico” está falando. 

A obra foi executada no ano passado, em uma festa do tradicional colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. E é um sintoma de um problema que os pais e professores não podem ignorar: a profusão cada vez mais rápida de músicas cada vez mais explícitas a jovens cada vez mais novos. 

Por que não tem tanto espaço nos meios de comunicação convencionais, esse tipo de música pode ser ignorado pelos pais. Mas um passeio pelo YouTube ajuda a dar uma dimensão do sucesso do funk contemporâneo: artistas como G15 e MC Diguinho, poucos conhecidos fora de seus públicos, têm vídeos com dezenas, às vezes centenas de milhões de visualizações.

Comparada à letra de algumas músicas populares entre os jovens, aliás, o exemplo citado no início da reportagem é uma valsa de Strauss. 

Longe vai o temo do duplo sentido. Algumas músicas mais populares da atualidade não deixam qualquer espaço para a dúvida. Como “Deu Onda”, de G15, um dos maiores sucessos de 2017.

Que vontade de f...,  garota 

Eu gosto de você, fazer o quê? 

Meu p... te ama

Apenas um dos vídeos dessa música tem 32 milhões de visualizações.  O último lançamento da banda U2 no YouTube não chegou a 10 milhões. 

Outra música de sucesso, lançada há pouco mais de um mês, mês, reuniu 14 milhões de visualizações em três semanas, até ser tirada do ar pelo YouTube. No refrão, MC Diguinho canta:

Só surubinha de leve com essas filha da p... 

Taca bebida, depois taca a p...

E abandona na rua

Nas redes sociais, é fácil medir a popularidade desse estilo de música dentro do ambiente esoclar. “Não aguento mais ver as pessoas da minha escola cantando surubinha de leve”, publicou uma jovem no Twitter em 20 de janeiro.

“Na escola de ensino fundamental I, ao lado da minha casa, crianças de (no máximo) 10 anos estão cantando: "Meu p... te ama, meu p... te ama!’”, queixou-se outra internauta no ano passado.

O problema é mais comum no estilo funk – embora não se restrinja a ele.

O que fazer quando os alunos estão ouvindo músicas com termos chulos que fazem referência à sexualidade exacerbada, ao uso de álcool e ao consumo de drogas? 

O caminho da lei não parece ser viável. Uma proposta que criminaliza o funk chegou até o Senado Federal por meio de uma proposição que obteve rapidamente as 20 mil assinaturas assinaturas exigidas para ser debatida no Congresso. Mas, como era de se esperar, o assunto foi enterrado

Ao mesmo tempo, é questão de bom senso: expor crianças a um conteúdo explícito e chocante até mesmo para adultos não pode ser tolerado. 

Restam dois caminhos às escolas: um deles é o de proibir.

Para Neide Noffs, professora do Departamento de Formação Docente, Gestão e Tecnologias da PUCSP da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, a ideia pode parecer tentadora em princípio: “Não dá para antecipar as coisas tanto quanto estão antecipando nessas músicas”. As consequências, para ela, incluem “a gravidez precoce, o aborto, a vulgarização das meninas, a pedofilia, o aborto, o acesso às drogas”. 

Mas a professora, que já lecionou em escolas onde o funk era a cultura predominante entre os alunos, enfatiza uma aspecto essencial quando se lida com pré-adolescentes e adolescentes: a rebeldia: “Quanto mais você suprime, mas a juventude quer. O adolescente vive da contradição e do enfrentamento da autoridade”, afirma ela. 

Para a professora, a melhor saída é mostrar aos alunos que existem outras expressões culturais e artísticas: “A escola deveria fazer um projeto de trabalho voltado para a discussão dos diferentes movimentos musicais e discutir a letra das músicas”, diz. 

Na opinião da especialista, “a escola deve cultivar os valores de uma juventude mais saudável”.

Família

Professor de Psicologia Clínica na Universidade de Brasília, Aderson Luiz Costa Júnior concorda com Neide: para ele, é inegável que algumas letras de música são inadequadas para menores de idade. Mas a proibição pode ser inócua. “Hoje, diferentemente de algumas décadas atrás, as fontes de informação são múltiplas”, diz ele.  

Para o professor, o caminho mais simples pode não ser o mais adequado. “A imposição de uma proibição pode gerar a necessidade de burlar a regra. E adolescentes vão encontar uma maneira de burlar a regra dentro da escola”. Ele concorda que o diálogo é mais eficaz: “A escola pode criar, por um exemplo, um evento extracurricular para discutir o conteudo dessas músicas”.

Embora soe frustrante, o papel limitado que a escola pode exercer nesse caso aponta para os primeiros responsáveis por direcionar os jovens nesse aspecto: os pais.

Para Áderson Luiz Costa Júnior, a família é o fator preponderante nessa equação: “Dependendo do contexto familiar em que se encontra o adolescente, pode ser extremamente perigoso, mas quando há um, controle familiar o grau é bem reduzido”.

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