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| Foto: RODOLFO BUHRERRODOLFO BUHRER

O jurista Ives Gandra Martins tem três motivos para estar insatisfeito com a proliferação de cursos, em universidades públicas, destinados a estudar o “golpe de 2016”. 

Como um dos responsáveis pelo impeachment de Dilma Rousseff, um constitucionalista reverenciado e professor experiente, ele critica duramente o que enxerga como não apenas um ato inconstitucional, mas uma farsa montada para fazer militância política sob a aparência de educação. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele explica sua posição sobre o assunto.

A criação de cursos para estudar o “golpe” contra Dilma Rousseff fere a Constituição? 

Vamos admitir que eu seja favorável a abrir uma cadeira analisando porque a ditadura é melhor do que a democracia. Vamos defender a ditadura. Seria constitucional, perante uma Constituição que diz que somos um regime democrático? Quando se diz que o Congresso Nacional, que aplicou o impeachment, fez um golpe, essa cadeira está dizendo o seguinte: o Senado e a Câmara são golpistas e não estamos em uma democracia. 

Ora, os valores democráticos têm que respeitar a Constituição. Não posso ter uma cadeira universitária que diga que os poderes instituídos são golpistas, não valem nada. Isso não é liberdade universitária. Posso, como cidadão, expor minha opinião. Mas não criar uma cadeira universitária dizendo que a Câmara e o Senado são instrumentos da ditadura. Acho que o ministro da Educação tem razão e não poderia se instituir essa cadeira. O Supremo Tribunal Federal examinou o processo de impeachment, o presidente do Supremo é quem presidiu a sessão. 

Como vou dizer que foi um golpe, quando o poder Judiciário, o poder Executivo e o poder Legislativo participaram, dentro dos artigos 85 e 86 da Constituição? Esses professores querem autonomia para dizer o seguinte: o Brasil não existe, não temos poderes. Oras! Eu considero que essa não é uma autonomia universitária, é uma irresponsabilidade universitária. 

Especialmente porque essas universidades são financiadas por um dos poderes “golpistas”, certo?

Sim, universidades financiadas com impostos. “Nós, que vivemos às custas do dinheiro desses poderes, queremos dizer que esses poderes não valem nada no Brasil”. 

Primeiro, é uma afronta à democracia. A tese do golpe não é verdade. Aquilo que se aplicou é a Constituição, e os três poderes participaram. 

Segundo: a autonomia universitária não pode permitir a irresponsabilidade universitária. A meu ver, tem que ser examinado se esses professores universitários podem continuar professores em um país democratico. Eles não são. Eles estão dizendo: não respeitamos os poderes. O que existe é nossa opinião sobre os poderes. Considero de uma irresponsabilidade total. No STF, 8 dos 11 ministros foram colocados pelo Lula e pela Dilma. 

O que o senhor está dizendo é que, ao chamar o impeachment de golpe, eles estão automaticamente conclamando uma derrubada da ordem vigente?

Então eles dizem o seguinte: vamos por todos os poderes para fora e eu, professor, que não represento nada e não fui eleito com 140 milhões de eleitores, estou dizendo que todos os poderes são ilegítimos. É o fim da picada. Isso demonstra que eles não estão preparados para serem professores universitários. 

Eu tenho que lutar dentro da democracia para fazer prevalecer minha ideia, mas não eliminar os poderes por uma opinião meramente pessoal, dizendo “não aceito”. A Constituição foi feita pelos constituintes, dos quais o PT também participava, eleitos por todos os eleitores brasileiros. Mas eles dizem “como eu sou eu, tenho um valor muito maior do que mais de 100 milhões de eleitores, a Constituição não vale nada. Vale o que eu digo”.

Como professor, como o senhor enxerga esse episódio?

Isso não é professor universitário em nenhum lugar. São apenas ativistas políticos. Fui professor universitário por 57 anos. Professor universitário tem a missão de formar gerações, não deformá-las. Eles têm todo direito de ser ativistas, mas não podem falar em nome da autonomia. O artigo 207 da Constituição, que estabelece a autonomia universitária, não foi colocado pelo constituinte com essa intenção.

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