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Imagem de abril de 2018, na UFFS: alunos se manifestam contra professor de direita.
Imagem de abril de 2018, na UFFS: alunos se manifestam contra professor de direita.| Foto: Reprodução / Facebook

Fundada há dez anos, a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) vive um dos momentos mais tumultuados de sua história. O reitor indicado pela presidência e nomeado no dia 30 de agosto, Marcelo Recktenvald, precisou despachar em um gabinete provisório dentro da Procuradoria Federal de Chapecó (SC) entre 30 de agosto e 20 de setembro, enquanto a reitoria permaneceu ocupada por manifestantes. Em mais de uma ocasião, se viu cercado por manifestantes e precisou de escolta policial para garantir sua integridade física. Recktenvald ficou em terceiro colocado na votação interna da instituição, com 21,4% dos votos, mas seu nome foi o escolhido.

Uma carta pública, assinada por 28 dos 54 membros titulares do Conselho Universitário da instituição, pede a renúncia do reitor, alegando que sua nomeação configura “clara violação à autonomia da UFFS e desrespeito para com a comunidade universitária” – na verdade, é prerrogativa do presidente da república escolher qualquer um dos nomes da lista tríplice. Nesta segunda (30), mesmo tendo sido escolhido conforme previsto em lei, o Consuni da UFFS votou pela “destituição” de Recktenvald, decisão contrária à do presidente, sem previsão legal.

Mais recentemente, o professor Jefferson Saccol, que também foi Diretor-Geral da Faculdade Santa Rita de Chapecó e participou da equipe de transição do novo reitor, foi hostilizado por um grupo de alunos, que formou um “corredor polonês”. As ameaças interromperam o trabalho do docente.

Um caso anterior aos incidentes relacionados à indicação do novo reitor, sugerem que a perseguição de cunho político dentro da UFFS é mais antiga. Em entrevistas à Gazeta do Povo, o professor Fernando de Moraes Gebra contou sua história.

Sequência de ataques

Fernando de Moraes Gebra tem 39 anos, é pós-doutor em Estudos Românicos pela Universidade de Lisboa, doutor em Letras pela Universidade Federal do Paraná, mestre pela Universidade Estadual de Londrina e graduado pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). É membro do Instituto de Estudos Pessoanos e Modernistas (IEMO), vinculado ao Centro de Humanidades (CHAM), da Universidade Nova de Lisboa. Possui publicações científicas em reconhecidos livros e periódicos nacionais e europeus.

Professor e pesquisador da UFFS sem dedicação exclusiva desde 2013, ele afirma que as perseguições começaram em outubro de 2016, quando estudantes e militantes invadiram a universidade em protesto ao impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). “Fui contra a ocupação da reitoria da parte de alunos e integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Foi quando os ataques tiveram início”.

No ano seguinte, Fernando foi testemunha de defesa de uma ex-aluna, a hoje deputada Ana Caroline Campagnolo, que processou sua professora de mestrado. “Eu testemunhei em juízo que a Ana, enquanto foi minha aluna, manteve uma conduta exemplar. Isso irritou ainda mais a militância”.

Em 2017, o professor se posicionou contrário à criação do curso de pós-graduação A Esquerda no Século XXI, que custaria, no total, R$ 7.200 para cada aluno e contaria com aulas da ex-presidente e do ex-governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra (PT), além do líder do MST, João Pedro Stédile. “Recebemos e-mails oferecendo ingressos a professores e a alunos para assistir às aulas desse curso, de clara orientação ideológica, ou seja, era praticamente um convite para que os alunos, ao invés de comparecerem às nossas aulas, participassem desse curso de militantes, um verdadeiro engodo ou ainda uma péssima aplicação do dinheiro público”, explica o docente.

Depressão e ansiedade

Conservador, Fernando não se posicionava politicamente em sala de aula. “Faço minha militância no Facebook. Eu tenho o que ensinar, então dou aula. Quem faz militância em sala de aula é porque não tem o que ensinar. Há professores que instigam alunos a esse tipo de atitude deplorável. Nunca fiz comentários de política partidária em sala de aula, mantive sempre o decoro e o respeito pelos alunos, ensinando os conteúdos literários sem o viés político-ideológico”.

Mas uma discussão com uma militante que o professor desconhecia e que não tem nenhum vínculo com a UFFS, em abril de 2018, numa página da rede social, levou a uma série de agressões verbais em posts de ambas as partes. “A pessoa em questão ofendeu a minha mãe. Fui ofendido, perdi o controle e desferi algumas ofensas. Em resposta, um anônimo covarde criou uma página no Facebook para me perseguir”.

Em resposta, alunos desfilaram pelos corredores gritando palavras de ordem como “Hoje eu estou pistola, quero esse professor daqui pra fora!”. O caso foi levado ao colegiado do curso de letras, onde alguns alunos se posicionaram contrários ao docente, e outros o defenderam. “Eu adoeci com essas ameaças. Dado meu quadro clínico de depressão, minha situação ficou pior. Uma aluna, num grupo de WhatsApp, disse que um soco na boca poderia resolver o meu problema”.

Diante das ameaças verbais frequentes, e temendo por sua integridade física, o professor não teve outra opção a não ser solicitar afastamento das suas atividades laborais. “Tive de solicitar uma licença sem remuneração para preservar minha vida e minha saúde. Estou vivendo em Curitiba, onde tenho residência, em licença não remunerada, vivendo de aulas particulares. Meu padrão de vida caiu muito”. Fernando está agora tentando se transferir para outra universidade federal. “Quero continuar a carreira acadêmica. Sou professor e pesquisador, é minha vocação. Mas não posso mais atuar em Chapecó. Minha fé em Deus é o que me dá forças para seguir a minha vida profissional”.

Procurada, a UFFS não quis se manifestar sobre o caso.

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