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Imagem de sala de aula com distanciamento nos EUA, do último dia 17 de março.
Imagem de sala de aula com distanciamento nos EUA, do último dia 17 de março.| Foto: AFP

Brasil e mundo afora, a vacinação de profissionais da educação tem sido encarada como condição obrigatória para a reabertura das escolas. Em 16 de março, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi presencialmente à pasta da Saúde solicitar que professores fossem priorizados no Plano Nacional de Imunização (PNI) do governo federal. Parte da categoria - os profissionais da educação básica - já consta na lista, ocupando a 19ª posição.

Para alguns especialistas, priorizar o grupo na fila de imunização é imprescindível para que a retomada das atividades presenciais em escolas seja possível. Por outro lado, há aqueles que, embora concordem que profissionais da educação devem ter prioridade, defendem que sua vacinação não pode ser um condicionamento para a reabertura das escolas no país. Ainda mais frente à incerteza em relação à disponibilidade das vacinas para a população.

A categoria tem resistido e defendido que apenas a imunização garantiria uma volta às aulas segura e rápida. E o retorno, por consequência, possibilitaria menos perdas de aprendizagem para os alunos e menos prejuízos à sociedade como um todo. Uma vez vacinados, professores também podem se tornar barreiras para que o vírus não se espalhe entre a comunidade escolar.

"Queremos que a saúde de todos seja protegida. Mas os professores, em especial, deveriam ter prioridade, para conseguirmos garantir menos perdas de aprendizagem", afirma Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A tendência é de que o fechamento das escolas aprofunde ainda mais gargalos que já estavam presentes na educação. A OCDE, por exemplo, estima uma queda de pelo menos 1,5% no PIB mundial até o fim do século em decorrência da interrupção das aulas.

Segundo a especialista, outros benefícios podem ser colhidos, indiretamente, com a vacinação dos professores. Como, por exemplo, a garantia de que crianças com problemas de saúde mental não sejam ainda mais prejudicadas. Isso também diminuiria o risco de violência doméstica envolvendo crianças. "A escola não é apenas um lugar para aprender. Existe, nela, uma rede de proteção social", diz Claudia.

"Vacinação não pode ser condição obrigatória"

Em recomendação para o planejamento de retorno às atividades escolares presenciais no contexto da pandemia de Covid-19, o Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz, afirma que a vacinação, embora seja medida fundamental para o controle da pandemia, não pode ser condição obrigatória para a reabertura das escolas.

"Condicionar o retorno às atividades presenciais nas escolas à vacinação parece ser incoerente com base em algumas evidências já destacadas anteriormente", diz a Fiocruz, em referência a estudos científicos que sugerem que a reabertura das escolas não está "associada a uma transmissão significativa na comunidade".

"A transmissão secundária significativa da infecção por SARS-CoV-2 ocorre, prioritariamente, em ambientes escolares quando as estratégias de proteção e redução dos riscos não são implementadas ou não são seguidas", ressalta o instituto.

"A polarização entre posições de abertura sem critério ou de fechamento até que tenhamos estratégias de vacinação mais massivas, além de comprometer, por mais um ano, as funções sociais das escolas na comunidade, impedem que esse importante equipamento possa, ao implantar junto à unidade de saúde do território, estratégias de mitigação dos riscos tais como promoção da segurança alimentar, prevenção da violência, resgate do calendário vacinal e busca ativa para redução da evasão e do abandono escolares, contribuir com o aprendizado para diferentes setores da sociedade", diz a Fiocruz.

O planejamento do retorno a partir de um diagnóstico local, com preparação dos ambientes e engajamento da comunidade escolar, já seria capaz, segundo o instituto, de garantir segurança da saúde dos envolvidos.

O órgão também lembra, com base em dados do Ministério da Saúde brasileiro, que crianças e adolescentes continuam representando os menores percentuais em relação a casos notificados, internações e óbitos em diferentes regiões. "O impacto nas populações mais jovens continua baixo", diz o instituto, ao mesmo tempo em que reconhece que o tema é permeado por incertezas.

Perguntado se professores devem ser prioridade na fila da vacina, Márcio Nehab, pediatra e infectologista do IFF/Fiocruz e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), afirma que não é possível ser taxativo.

"A resposta não é sim ou não. Não é 8 ou 80. Essas discussões sobre o que se considera como serviço essencial e quem deve ser prioridade na fila de vacinação não seriam necessárias se tivéssemos vacina para todos. Frente à escassez, é preciso ser simples e pragmático. Primeiro, temos que vacinar quem morre, ou seja, idosos e pessoas que têm comorbidades. Não dá para furar essa fila", opina.

Na sequência, os profissionais de saúde que estão na linha de frente devem ser vacinados para estarem aptos para cuidar dos pacientes, diz Nehab. "Neste caso, é importante lembrar que nem todos estão na frente do caos, como médicos veterinários e psicanalistas, por exemplo. São pessoas que não estão atendendo pacientes com Covid-19 e que não deveriam ter prioridade", afirma ele. "Depois, é importante, sim, que profissionais da educação básica sejam priorizados, enquanto os do ensino superior podem continuar atuando de forma remota. Na minha opinião, professores devem ter prioridade, mas eles não podem colocar a vacinação como condição para o retorno".

Nehab lembra ainda da ausência de dados a respeito da efetividade das vacinas disponíveis no país, alertando profissionais de educação que têm a vacina como panaceia. "Não adianta só vaciná-los. Não tem nem tempo para medirmos a efetividade da vacina, é algo muito recente. Não temos experiência para afirmar com certeza que elas protegerão inclusive contra as variantes do coronavírus. Colocar pressão para que o retorno aconteça apenas com isso é uma certa falta de conhecimento sobre o que deve ser feito depois da imunização. Embora os profissionais devam ficar mais seguros, terão que continuar usando máscaras, respeitando o distanciamento e todas os protocolos de segurança".

Segundo dados do Ministério da Saúde, aproximadamente mil profissionais de saúde morreram de Covid-19 desde o início da pandemia. No mundo, o número de mortes chegou a 17 mil, de acordo com informações da Anistia Internacional (AI).

"Médicos e enfermeiros não tiveram opção. A maioria não parou de trabalhar quando não tinha nem vacina nem mesmo EPI. Metade dos médicos ainda não foi vacinado. E muitos morreram ao longo do caminho", afirma.

O discurso do MEC sobre a vacinação de profissionais da educação básica

Em 16 de março, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi pessoalmente à pasta da Saúde, então capitaneada por Eduardo Pazuello, solicitar que professores fossem priorizados.

A jornalistas que estavam no local, Ribeiro afirmou que foi até lá para solicitar que "eles analisem a possibilidade de vacinar todos os professores, para que a gente possa retomar a questão das aulas presenciais. Esse foi o nosso objetivo. A resposta é que está sendo analisado, o mais cedo possível, e que isso vai entrar na escala, eu creio, que para abril, antes de maio, isso vai ser possível".

"Nós estamos aí, todo mundo, naturalmente, precisa da vacina e eu queria dar essa oportunidade para os professores. Mas nós temos em torno de 2 milhões e meio a três milhões de professores que poderiam ser alvo dessa vacinação", disse o titular da Educação.

Na lista de prioridades do chamado Plano Nacional de Imunização (PNI) do governo federal, profissionais da educação básica - professores e funcionários das escolas públicas e privadas - ocupam a 19ª posição. São, ao todo, 2.707.200 de pessoas. A classe já chegou a ocupar, no fim do último ano, o 15º lugar.

Em seguida, na 20ª posição, aparecem os profissionais da educação superior, contabilizando ao todo 719.818 de pessoas a serem vacinadas.

"Em termos de saúde pública, quem tem mais risco é o indivíduo que pega Covid-19 no meio de uma cela com outros 60 presos. Em comparação com um professor, por exemplo, essa pessoa privada de liberdade tende a estar mais exposta", diz Marcio Nehab.

Nos Estados Unidos, país que conta com uma vacinação mais acelerada, a Chicago Teachers Union, um sindicato de professores de Chicago, estaria orientando seus membros a não informarem se foram vacinados contra Covid-19, segundo noticiou a CBS. Isso tem dificultado a retomada das aulas. Professores norte-americanos foram incluídos na chamada fase "1b", a segunda, do plano de vacinação dos EUA. "Se isso for verdade, trata-se de descompromisso profissional e falha ética", critica Claudia Costin.

Em território alemão, outro caso de priorização dos professores, profissionais de educação foram alocados no terceiro grupo, chamado de "alta prioridade", para receber a vacinação do país.

Leia a Recomendação para o planejamento de retorno às atividades escolares presenciais no contexto da pandemia de Covid-19 do Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz;

Plano Nacional de Imunização do governo federal:

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