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“Hoje em dia, o inglês é uma língua de ciência e, portanto, a generalidade da bibliografia usada no processo de ensino-aprendizagem é em língua inglesa, mesmo ao nível de licenciatura”, diz  Madalena Alarcão, vice-reitora da Universidade de Coimbra. | Bigstock
“Hoje em dia, o inglês é uma língua de ciência e, portanto, a generalidade da bibliografia usada no processo de ensino-aprendizagem é em língua inglesa, mesmo ao nível de licenciatura”, diz  Madalena Alarcão, vice-reitora da Universidade de Coimbra.| Foto: Bigstock

Com clima ameno e preços mais baixos do que os seus vizinhos europeus, Portugal tem atraído muitos brasileiros que querem estudar fora, mas não desejam abrir mão do português. Só nos últimos três anos, a procura de estudantes do Brasil por instituições universitárias portuguesas cresceu 38%, segundo dados do setor. Mas o que poucos sabem é que, apesar do inglês não ser um pré-requisito em muitos cursos no país, a língua é fundamental para sobreviver no meio acadêmico. 

Cursando o mestrado de Design de Moda na Universidade de Lisboa, o mineiro Frederico Cangussu, de 33 anos, sentiu na pele a dificuldade de não saber inglês estudando em Portugal. Quando havia escolhido o curso ainda no Brasil, sequer imaginava que seria preciso ter proficiência na língua. 

No curso estava escrito que as aulas seriam em português, mas quando cheguei vi que quase todos os materiais que os professores fornecem para as aulas estavam em inglês. Até mesmo os livros disponíveis na biblioteca da faculdade são na língua inglesa.

Para driblar esse contratempo, Frederico decidiu se matricular em um curso de idiomas e começa as aulas ainda no mês que vem. “Quando a gente escolhe um curso em Portugal nem imagina isso por ser um país de mesma língua. Mas a verdade é que se o inglês é um diferencial no Brasil, em Portugal é um requerimento básico.” 

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Embora tenha feito inglês por muitos anos no Brasil, a designer paulistana Cecília de Lucca, de 28 anos, se viu obrigada a fazer um curso de inglês para desenferrujar seus conhecimentos quando estudava comunicação de tendências em Portugal. “Muitos dos materiais que tive que ler para as aulas da pós-graduação e do mestrado estavam em inglês. E não eram leituras simples, mas artigos acadêmicos e trechos de livros teóricos. Houve inclusive uma disciplina que foi parcialmente ministrada em inglês por conta de duas alunas estrangeiras.” 

“Acho que os brasileiros chegam aqui sem ter muita noção do quanto o inglês é necessário, especialmente porque isso não costuma constar na descrição dos cursos. Mas esse contato com o inglês de forma cotidiana fez com que eu melhorasse bastante nesse quesito, tanto de vocabulário quanto me fazendo perder a insegurança para conversar no dia a dia e quando viajo pela Europa”, conta Cecília. 

Entre Brasil e Portugal 

Vivendo em Portugal há pouco mais de três anos, a publicitária mineira Suzana, de 39 anos, doutoranda em Estudos Culturais na Universidade de Lisboa, acredita que as universidades do país partem do pressuposto que um aluno universitário deve apresentar um bom nível de inglês, o que faz com que o idioma não seja uma exigência para a candidatura e ingresso em cursos de pós-graduação, mestrado ou doutorado. 

“A verdade é que em qualquer pós-graduação stricto sensu, seja ela no Brasil, em Portugal ou em qualquer lugar do mundo, o domínio de uma segunda língua para mestrado e de dois idiomas para o doutorado existem por uma razão específica: o aluno vai ter que ler um repertório muito extenso em outros idiomas que não o português. Além da leitura de livros e artigos, outras situações na vida de estudante ou pesquisador demandam um bom conhecimento de inglês, como palestras, visitas de alunos de universidades estrangeiras, workshops, congressos, entre outros”, afirma a doutoranda. 

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Para a jornalista mineira Ana Possas, de 33 anos, mestranda em Estudos da Cultura e Comunicação na Universidade de Lisboa, a exigência é diferente em Portugal porque no Brasil há muitos textos e livros traduzidos para o português. “Mas, para mim, a questão no Brasil é mesmo a oportunidade da prática. A gente pode até estudar inglês a vida inteira, mas se está em uma cidade pouco turística ou em um pequeno centro, acaba não tendo com quem praticar o idioma”, conta ela, que atualmente namora um italiano com quem se comunica em inglês. 

Fluente no idioma, o analista de relações internacionais paulistano Lucas Sobral, de 26 anos, diz ter se surpreendido com a exigência do inglês nas aulas no mestrado em Economia Internacional e Estudos Europeus no ISEG (School of Economics and Management). 

“Se eu tivesse alguma dificuldade na língua, isso certamente seria um empecilho difícil de ser superado. Vi isso acontecer com um amigo brasileiro que começou um curso na área de Tecnologia da Informação e foi obrigado a abandoná-lo ainda no primeiro semestre.”  

O que dizem as universidades 

De acordo com a assessoria da presidência do ISEG, que integra a Universidade de Lisboa, o inglês ganhou maior importância em Portugal nas ultimas décadas, ocupando o lugar que era antigamente da língua francesa. “Isso conduziu à crescente criação de programas completos em língua inglesa nos vários ciclos de estudo posicionando favoravelmente o ISEG na atração de candidatos de muitas nacionalidades.” 

Dos sete cursos de graduação oferecidos pelo ISEG atualmente, dois são em inglês. O mesmo se passa com os mestrados (dos 18, cinco são lecionados na língua inglesa) e os doutorados (dos nove disponíveis, dois são em inglês). Já o MBA é totalmente ministrado no idioma. 

“Os nossos programas, mesmo aqueles em língua portuguesa, incluem componentes internacionais, como visitas a determinadas instituições e empresas, formações complementares noutros países e possibilidades de intercâmbio”, afirma a assessoria da presidência do ISEG. 

No caso da Universidade de Coimbra, mesmo que a língua oficial seja o português, é esperado que a comunidade acadêmica seja fluente em diversos idiomas, principalmente o inglês. “Hoje em dia, o inglês é uma língua de ciência e, portanto, a generalidade da bibliografia usada no processo de ensino-aprendizagem é em língua inglesa, mesmo ao nível de licenciatura”, afirma a vice-reitora Madalena Alarcão. 

Já a Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (Nova SBE) apresenta todas as aulas em inglês, exceto durante o primeiro ano da graduação, quando ainda existe a opção de algumas aulas serem lecionadas em português, segundo informações da assessoria. 

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Na Universidade do Algarve (UALg), o idioma também é indispensável, sendo que 18% dos seus cursos entre graduação e pós-graduação já são ministrados totalmente na língua inglesa. “Hoje o inglês é fundamental para a UALg, já que a universidade tem um grande contingente de estudantes internacionais, de mais de 70 nacionalidades. O inglês é língua de comunicação à escala global, sendo essencial que os nossos alunos fiquem habilitados para trabalhar em qualquer parte do mundo”, afirma o coordenador de comunicação André Botelheiro. 

E no mercado de trabalho... 

O inglês é fundamental tanto nos estudos quanto para procurar emprego em Portugal. “Há até mesmo anúncios de vagas escritos em inglês”, relata Cecília. E com o boom turístico no país, a língua é até necessária para trabalhar em empregos considerados menos qualificados, como nas áreas de serviços e atendimento ao público. 

É o caso da produtora audiovisual Isis Prujanski, de 29 anos, que começou a trabalhar em um café assim que chegou em Portugal. “Esses empregos são as melhores oportunidades que temos ao chegar no país na condição de imigrante, mas tenho certeza que não teria acesso a essa vaga que estou sem dominar inglês, a começar porque meus patrões são estrangeiros. Neste período de adaptação até conseguir trabalhar na minha área, eu acabaria ficando presa a vagas mal remuneradas se não tivesse inglês.” 

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