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Covid-19: higienização de ponto de ônibus em Curitiba
Higienização em Curitiba: prefeitos se apoiam em medidas contra a crise sanitária para buscar reeleição.| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

A pandemia da Covid-19 não deve passar despercebida pelas campanhas de candidatos a prefeito de todo o Brasil, nem pelos votos dos eleitores. Mais que isso, a tendência é de que o tema seja recorrente no debate eleitoral até a data da votação no primeiro turno, em 15 de novembro. E o roteiro já está desenhado.

De um lado, os prefeitos que tentam a reeleição devem exaltar as medidas tomadas no combate à crise sanitária. De outro, adversários provavelmente irão apontar os eventuais equívocos dos governos locais. O quanto essa questão vai ser decisiva no pleito, porém, é algo difícil de prever.

Os primeiros debates televisivos deram uma amostra de como a Covid-19 vai permear os encontros. Quem tenta mais quatro anos de governo se fia nos números da saúde, mesmo que aparentemente não apresentem muita vantagem, e nas medidas que teriam sido responsáveis por evitar mais casos e mortes. E quem tenta derrubar os atuais prefeitos aponta ações pontuais que poderiam ter sido tomadas.

A cidade de São Paulo foi a mais atingida pelo novo coronavírus. Até 9 de outubro, segundo dados do governo estadual, a capital paulista tinha 298.405 casos registrados, com 13.056 mortes.

Apesar dos números, no debate da Band, realizado em 1º de outubro, o prefeito da capital paulista, Bruno Covas (PSDB), defendeu a própria atuação. “Aqui na cidade de São Paulo temos pautado nossas decisões alinhadas à área de saúde e os resultados estão aí. A cidade de São Paulo é a única capital que está reduzindo a quantidade de mortes por coronavírus na região Sudeste”, disse.

Na mesma linha, o candidato à reeleição no Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), usou os dados para se posicionar como um bom gestor da crise. “Nós tratamos 120 mil pessoas que tiveram a doença e tivemos 0,1% de mortes comparada com a população. Esse é um índice extraordinário”, celebrou. A cidade do Rio acumulou 110.202 casos e 11.313 mortes até 9 de outubro.

Na outra ponta, os adversários dos candidatos à reeleição não pouparam críticas na condução da crise sanitária. Em Porto Alegre, Manuela D’Ávila (PCdoB) atacou o atual prefeito Nelson Marchezan (PSDB). “O governo municipal lutou contra as testagens para as trabalhadoras e trabalhadores da saúde. Sabemos que a segurança na pandemia passava por uma política ampla de testagem, o que não foi feito em Porto Alegre. O prefeito lutou contra”, afirmou Manuela.

Em Curitiba, o prefeito Rafael Greca (DEM) – que testou positivo para a Covid-19, precisou ser internado no hospital e não participou do debate da Band – também foi criticado pelos adversários. “Infelizmente [o prefeito] demorou um pouco para tomar as atitudes e acabamos fechando precocemente a cidade, o que acarretou, depois, no aumento da virulência sem estarmos preparados”, disse João Guilherme (Novo).

Candidatos à reeleição podem se beneficiar da visibilidade advinda da pandemia

Esse jogo entre certo e errado deve seguir até o fim da campanha. Mesmo assim, segundo especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, os candidatos à reeleição estão em aparente vantagem, pois a pandemia catapultou os prefeitos a uma posição de destaque, com mais espaço nos veículos de imprensa e nas redes sociais, exatamente em ano eleitoral.

“Quando acontece uma calamidade pública ou algo que coloque a cidade sob risco, cria-se o que se chama a jornada do herói. O herói aparece para defender a cidade. E cria-se uma saga que favoreceu os prefeitos. Todos os prefeitos que tinham um trabalho razoável se beneficiaram dessa saga do herói. O que temos visto é que a maioria dos prefeitos começaram um processo de crescimento de imagem e reputação principalmente entre os meses de abril e junho”, aponta a cientista política, especialista em comportamento do eleitor e diretora do Instituto Pesquisas de Opinião (Ipo), Elis Radmann.

Para o presidente do Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (Camp), Bruno Hoffmann, a pandemia também ajudou a recolocar sob os holofotes quem andava esquecido. “O que vimos é que boa parte deles acabou utilizando isso como uma oportunidade, porque era uma liderança de certa forma apagada e virou a grande liderança local sobre o que fazer e os próximos passos. Vimos muitas lideranças ganhando reconhecimento maior pelo simples fato de ser o porta-voz do ponto de vista local”, analisa.

O desafio dos candidatos à reeleição é, portanto, transformar esse capital acumulado ao longo da pandemia em votos. Isso porque o aumento de popularidade de imagem pode não se concretizar nas urnas, especialmente onde a condução da questão foi muito severa.

Alguns mandatários adotaram medidas mais restritivas de circulação de pessoas e precisaram conter as consequências econômicas. Outros optaram por menos restrição, com o funcionamento quase pleno da economia local. Essa dicotomia entre saúde e economia, propagada desde o início da pandemia pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), não vai escapar ao certame.

“Todo herói pode se tornar vilão. Os prefeitos que foram extremamente duros nas medidas restritivas e perderam a harmonia entre saúde e economia tendem a pagar um preço. Os que tiveram maior habilidade entre administrar saúde e economia se posicionaram bem para o processo de reeleição”, projeta Elis.

Segundo Másimo Della Justina, cientista político e professor da PUCPR, o voto neste ano de pandemia tende a ser mais individualizado. Por isso, as consequências econômicas da pandemia terão peso nas urnas. “O eleitor percebe onde existe falácia e manipulação política nas dicotomias que se criam. O que interessa é o que acontece em casa, o que está na mesa, se existe alimento”, diz.

Pesquisas apontam que vantagem de prefeitos é relativa

Nas principais capitais onde há candidatos à reeleição, as pesquisas eleitorais não apontaram uma uniformidade em uma possível vantagem aos atuais prefeitos.

Ao mesmo tempo em que há cidades como Belo Horizonte e Curitiba, nas quais Alexandre Kalil (PSD) e Rafael Greca (DEM), respectivamente, lideram com folga — Kalil tem 58% segundo o Ibope, e Greca soma 47%, de acordo com o mesmo instituto —, há outras em que a situação está mais embolada. Em São Paulo, por exemplo, o atual prefeito Bruno Covas (PSDB) e Celso Russomanno (Republicanos) estão empatados dentro da margem de erro, com 21% e 26%, segundo pesquisa do Ibope.

Em algumas capitais, a situação está mais complicada para os prefeitos atuais. No Rio de Janeiro, o Ibope apontou o atual mandatário Marcelo Crivella (Republicanos) – também desgastado com escândalos de corrupção – com 12%, enquanto o líder na pesquisa é Eduardo Paes (DEM), com 27%. Em Porto Alegre, Nelson Marchezan (PSBD) aparece com 19%; Manuela D’Ávila (PCdoB) tem 24%, de acordo com levantamento do Ibope.

Sem uma relação clara entre pandemia e voto, serão nos primeiros debates e sabatinas que os candidatos vão sentir a reação dos eleitores e poderão planejar estratégias para abordar o assunto. “Isso mostra a importância da análise de dados, através de pesquisas, grupos focais, e até mesmo por monitoramento de redes sociais”, comenta Hoffmann.

A tendência é de que os candidatos que tentam derrubar os atuais prefeitos usem o tema, mas com moderação. A pandemia já faz parte da rotina dos brasileiros há pelo menos sete meses e é notório um cansaço em relação a tudo o que se relaciona a ela. Por isso, quem souber levantar o assunto sem sobrecarregar o eleitor, pode ter vantagem.

“Se o candidato insistir na politização, na ideologização e na partidarização do debate, além das mentiras, ele pode não colher frutos. Bater muito nessa questão pode acabar não somando votos”, acredita Della Justina. “Os adversários que souberem fazer crítica construtiva e mostrar o caminho, podem ter êxito. Os adversários que ficarem trabalhando no obituário da Covid, as pessoas vão desligar”, concorda Elis.

Metodologia das pesquisas citadas

  • A pesquisa do Ibope, encomendada pela TV Globo, ouviu 805 eleitores em Belo Horizonte entre os dias 30 de setembro e 2 de outubro de 2020. O nível de confiança do levantamento é de 95%, e a margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação MG-08595/2020.
  • A pesquisa do Ibope, encomendada pela RPC TV, ouviu 602 eleitores de Curitiba entre os dias 4 e 5 de outubro de 2020. O nível de confiança do levantamento é de 95%, e a margem de erro é de 4 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) sob a identificação PR - 08260/2020.
  • A pesquisa do Ibope, encomendada pela TV Globo e pelo jornal O Estado de S. Paulo, ouviu 805 eleitores de São Paulo entre os dias 30 de setembro e 1 de outubro de 2020. O nível de confiança do levantamento é de 95%, e a margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SP-09520/2020.
  • A pesquisa do Ibope, encomendada pela TV Globo, ouviu 805 eleitores no Rio de Janeiro entre os dias 30 de setembro e 2 de outubro de 2020. O nível de confiança do levantamento é de 95%, e a margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação RJ-08365/2020.
  • A pesquisa do Ibope, encomendada pelo grupo RBS, ouviu 805 eleitores em Porto Alegre entre os dias 3 e 5 de outubro. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação RS-07152/2020.
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