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Vista aérea de São Paulo: disputa na capital paulista promove lideranças para o cenário político nacional.
Vista aérea de São Paulo: disputa na capital paulista promove lideranças para o cenário político nacional.| Foto: Diogo Moreira/Divulgação Governo de São Paulo

Mais do que a disputa por uma prefeitura, as eleições municipais em São Paulo são uma espécie de laboratório para a política nacional. A prova está no histórico: desde a redemocratização, três prefeitos da capital paulista disputaram a Presidência. E o pleito desse ano – independentemente do resultado no segundo turno – confirma essa tendência.

De um lado, Bruno Covas, não disputa apenas a prefeitura, mas também espaço dentro do PSDB. O partido hoje está dividido entre a ala liberal, representada pelo governador paulista João Doria (PSDB), e a ala social-democrata, representada pelo prefeito.

“Se [Covas] se reeleger prefeito de Sâo Paulo, ele deixará de ser pupilo de Doria e pode ocupar uma posição importante de disputa dentro do partido. Pode vir a ser um quadro importante se conseguir controlar a máquina do partido” afirma Eduardo Grin, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV EAESP).

A fala mansa e a postura de equilibrista, de quem se esquiva do confronto, pode ser um ponto forte de Covas, segundo o cientista político. “Essa eleição deixou claro o que a população está pedindo: façam política, mas com respeito, disputem ideias, não destruam os outros porque seu adversário não é um inimigo mortal” afirma o especialista da FGV.

Boulos dá trabalho a Covas – e pode ser protagonista em 2022

Do outro lado, o candidato do Psol, Guilherme Boulos, pode não ser o próximo prefeito de São Paulo, mas seu desempenho o projeta nacionalmente, como potencial candidato em 2022. No primeiro turno, Boulos obteve votação bastante superior ao dos adversários diretos: o postulante do Psol teve 20,24% dos votos, contra 13,64% de Márcio França (PSB) e 10,5% de Celso Russomanno (Republicanos).

No segundo turno, mesmo se não vencer, Boulos deve dar trabalho a Covas. A última pesquisa XP/Ipespe mostra que o candidato do Psol tem 41% das intenções de voto, e está tecnicamente empatado com o tucano, que tem 48%. No Datafolha divulgado na quinta-feira (26), Boulos tem 46% dos votos válidos e Covas, 54%. Já na pesquisa Ibope de quarta (25), a vantagem do tucano é maior: Covas aparece com 57% dos votos válidos, contra 43% de Boulos (a metodologia das três pesquisas está abaixo).

Os índices de intenção de voto para o candidato do Psol já são um feito, considerando o tamanho do partido a que ele está filiado e a sua posição na extrema esquerda do espectro ideológico. O desempenho constitui, além disso, uma reviravolta considerando o próprio histórico de Boulos.

“Mesmo que não ganhe a eleição em São Paulo, Boulos é hoje o principal quadro do Psol no cenário nacional. Tendo o apoio do partido ele será, com certeza, um protagonista das negociações de uma frente de esquerda, mas acho improvável que seja ele a pessoa que sintetize essa união porque ele está muito à esquerda e a frente deve achar um nome moderado, que atenda a todos os interesses” avalia Grin.

O psolista já disputou a Presidência em 2018, mas seu desempenho foi o pior da história do partido: ele teve 617 mil votos, ou 0,58% do total de válidos, o que o colocou na décima posição entre os candidatos. Daqui a dois anos, a situação pode ser bem diferente e colocá-lo numa posição de liderança na esquerda, frente ao encolhimento do PT.

Além disso, de 2018 para cá, muita coisa mudou. Boulos abandonou o tom agressivo, adotou uma imagem moderada e sua campanha nas redes sociais tem se demonstrado um case de sucesso. Ele soube, ainda, preencher o vácuo deixado pelo PT. Se, em 2018, o Psol parecia um puxadinho do partido de Lula, hoje a situação já não é mais assim.

Os prefeitos que se tornaram presidenciáveis

Caso se projete como uma liderança nacional depois das eleições de 2020, Boulos não será o único a percorrer esse caminho. Desde a redemocratização, três prefeitos de São Paulo – Paulo Maluf, José Serra (PSDB) e Fernando Haddad (PT) – tentaram chegar ao Planalto. Todos foram derrotados. O oposto ocorreu com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que disputou a prefeitura paulistana em 1985, mas perdeu para Jânio Quadros (PTB).

No espectro da esquerda, Haddad ganhou relevância nacional após comandar a prefeitura paulistana, entre 2013 e 2016. Apesar de ter sido ministro da Educação nos dois governos Lula, entre 2005 e 2012, o advogado e professor não era um quadro do partido conhecido em nível nacional.

Quando deixou o governo federal para disputar a prefeitura, em 2012, apenas 55% dos paulistanos sabiam quem ele era. A disputa naquele ano, contra José Serra, foi acirrada. No fim das contas, o petista conseguiu a vitória no segundo turno, quando derrotou o tucano com mais de 55% dos votos.

Haddad não conseguiu se reeleger e saiu da prefeitura em 2016, derrotado por João Doria (PSDB). Dois anos depois, com Lula impedido de concorrer à presidência por causa das condenações no âmbito da operação Lava Jato, o PT apostou suas fichas no ex-prefeito paulistano.

Quando o petista iniciou a campanha presidencial de 2018, apenas 59% dos eleitores o conheciam. A disputa foi para o segundo turno, mas ele acabou sendo derrotado por Jair Bolsonaro (sem partido), que obteve 55% dos votos.

São Paulo é vitrine para as eleições presidenciais 

A eleição para a prefeitura de São Paulo foi uma vitrine também para outros políticos, em seguida, disputarem a Presidência. O então senador Fernando Henrique Cardoso (na época no PMDB) tentou se tornar prefeito da capital paulista, mas foi derrotado por Jânio Quadros, em 1985.

Mas, no caso de FHC, não foi a eleição municipal a conduzi-lo à Presidência. Após a tentativa frustrada, ele se tornou líder do governo de José Sarney no Congresso e, em 1988, ajudou a fundar o PSDB. Quando Itamar Franco assumiu a Presidência, após o impeachment de Fernando Collor, ele foi nomeado ministro da Fazenda e chefiou a elaboração do Plano Real. Foi o trunfo que o levou ao Palácio do Planalto em 1994.

Também na década de 1980, Paulo Maluf foi mais um prefeito de São Paulo que tentou a Presidência. Ele comandou a cidade de 1969 a 1971 e, de novo, entre 1993 a 1997. Entre os dois períodos, ele perdeu a eleição de 1988, quando foi derrotado por Luiza Erundina – hoje vice de Boulos.

A primeira tentativa de Maluf de chegar ao Palácio do Planalto foi no final da ditadura, quando foi escolhido candidato a presidente pelo PDS, partido que sucedeu a antiga Arena. Sua candidatura, no entanto, desagradou a Frente Liberal, que deixou o PDS para apoiar Tancredo Neves, candidato do PMDB, que foi eleito presidente, com José Sarney como vice. Maluf se candidatou a presidente ainda em 1989, ocasião em que foi eleito Fernando Collor.

As tentativas dos tucanos

Embora os tucanos dominem as eleições estaduais em São Paulo, tendo ganhado as últimas sete consecutivas, o mesmo não se repete na capital. Desde a redemocratização, o PSDB ganhou duas vezes – em 2004 e em 2016. O PT três: 1988, 2000 e 2012. Caso Covas seja reeleito, os tucanos vão igualar os petistas.

José Serra foi o único tucano eleito prefeito de São Paulo em 2004 que também disputou a Presidência. Ele ficou no cargo pouco mais de um ano, quando abandonou o posto para se candidatar ao governo do estado, em 2006. Nas eleições presidenciais de 2010, Serra enfrentou Dilma Rousseff (PT) no segundo turno, mas foi derrotado pela petista, que obteve mais de 55% dos votos.

Hoje as ambições tucanas para a Presidência residem no governador de São Paulo, João Doria, que já foi prefeito paulistano por dois anos. Eleito em 2016, ele cedeu o cargo em 2018 para Covas. Para chegar ao Planalto, ele defendeu recentemente a criação de uma frente ampla, que englobe a centro-esquerda.

Metodologia das pesquisas citadas na reportagem

  • Sob encomenda da XP Investimentos, o Ipespe ouviu 800 eleitores de São Paulo, por telefone, entre os dias 24 e 25 de novembro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95,45%, com margem de erro de 3,5 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SP-09138/2020.
  • Sob encomenda da Folha de S. Paulo e da TV Globo, o Datafolha ouviu 1.512 eleitores de São Paulo entre os dias 24 e 25 de novembro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SP-02193/2020.
  • Sob encomenda da TV Globo e do jornal O Estado de S. Paulo, o Ibope ouviu 1.001 eleitores de São Paulo entre os dias 23 e 25 de novembro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SP-09681/2020.
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