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Damares Alves e Bolsonaro
A ministra Damares Alves e o presidente Bolsonaro durante cerimônia de lançamento do programa Abrace o Marajó , em 2020.| Foto: Alan Santos/PR

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves (sem partido), tem demonstrado insegurança sobre a possibilidade de disputar o Senado. A aliados, ela coloca em dúvidas sua pré-candidatura pelo temor de abandonar a pasta sem encontrar um substituto alinhado à sua gestão. O desejo dela é de que todas as políticas implantadas sejam mantidas, o que inclui ações voltadas para idosos, pessoas com deficiência, indígenas e a comunidade LGBT.

Em entrevista ao blog do Camarotti, no G1, Damares disse não ter tanta certeza de sua candidatura: "Não tenho nenhuma motivação em ser candidata. [Mas] eu ainda não me decidi. Mas, se quiser seguir meu coração, eu fico aqui [no governo]".

Apesar disso, o presidente Jair Bolsonaro (PL) insiste que a ministra concorra e pressiona pela candidatura. Em reunião com lideranças evangélicas há duas semanas, ele falou que ela será candidata e que conta com sua total confiança.

A insistência tem razões eleitorais e políticas. Bolsonaro está convencido de que a ministra pode não apenas ser eleita senadora, como também seria uma importante cabo eleitoral para puxar votos à sua reeleição e ajudar a eleger e reeleger deputados federais além do estado pelo qual se candidatar.

Bolsonaro não é o único que atua para convencê-la. Sua própria equipe também trabalha nos bastidores para auxiliá-la na construção de palanque, chapa e de seu sucessor. Pouco a pouco, tentam convencê-la e o primeiro passo foi dado.

Uma vez que os arranjos de sua candidatura estejam concluídos e ela própria se sinta convencida, Damares definiu que lançará seu nome pelo estado do Amapá, afirmam interlocutores dela à Gazeta do Povo. "Se eu for candidata, eu vou ganhar", disse a ministra ao G1.

Como a candidatura de Damares pelo Amapá pode ajudar Bolsonaro

A certeza da vitória no Amapá é, apontam interlocutores, o principal motivo pelo qual Bolsonaro insiste em montar chapa com a ministra no estado. "Sem ela, não há nenhum nome viável para derrubar o [senador] Davi Alcolumbre [União Brasil-AP], diz um assessor.

Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Alcolumbre e Bolsonaro cortaram laços ao longo do ano passado, a ponto de o ex-presidente do Senado ter travado por meses uma sabatina e atuado contra a aprovação da indicação de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Eleito em 2014, Alcolumbre vai tentar se reeleger para mais oito anos no Senado e a intenção de Bolsonaro é evitar tal cenário após o distanciamento político entre ambos. Para isso, Damares é uma peça chave. O governo acredita que a ministra pode ser eleita com os votos de eleitores evangélicos e de outras religiões.

O Amapá conta com 189 mil evangélicos, diz um interlocutor da ministra. Em 2014, Alcolumbre foi eleito com o apoio do segmento religioso e obteve 131,7 mil votos. Ou seja, contas feitas no governo sugerem que ela poderia ser eleita ao obter o apoio dos evangélicos. "Estamos falando de um cenário em que Damares pode chegar com os votos de evangélicos, católicos e espíritas ao seu lado. É a única que pode fazer frente ao Alcolumbre, são o que os números nos mostram", diz um assessor.

É por esse mesmo cálculo eleitoral que a ministra não levou adiante a ideia de uma candidatura por São Paulo, seu atual domicílio eleitoral. "Não teria lógica ela sair por São Paulo, são 6 milhões de votos. A única alternativa dela é no Amapá, porque tem projetos lá e significa que o suplente virá de lá também", sustenta um interlocutor. Em 2020, 517.102 eleitores amapaenses estavam aptos a votar.

Ainda não existe uma costura eleitoral que assegure a viabilidade da candidatura da ministra, mas aqueles que atuam na coordenação eleitoral dela sondam influentes líderes religiosos e conservadores no estado para garantir uma composição vencedora, inclusive com a bênção de lideranças da bancada evangélica do Congresso.

A escolha por um suplente amapaense é uma condição inegociável para a candidatura de Damares, sobretudo pelo fato de ela não ter ligações diretas com o estado. O governo está convencido, porém, de que ela poderia ser mais uma candidata a se beneficiar da legislação pouco exigente que possibilita as candidaturas "nômades" no Brasil e ter um arranjo político bem negociado é pré-requisito.

Por qual partido ela vai se candidatar e como isso ajuda Bolsonaro

O arranjo eleitoral construído para Damares passa, naturalmente, pela escolha de um partido. A definição de sua legenda dirá muito sobre as chances de viabilidade ou não de sua candidatura. E a definição disso também interessa a Bolsonaro, que deu sinal verde para que ela negocie com o Republicanos.

O presidente da República até conversou com aliados do partido para auxiliá-la em uma acomodação na legenda, que filiou na última semana o vice-presidente Hamilton Mourão. O Republicanos tem requerido espaço no governo e cobiça o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos por entender que há sinergia ideológica com os valores evangélicos defendidos.

O Republicanos é comumente associado à Igreja Universal do Reino de Deus, embora tenha parlamentares de outros segmentos evangélicos. Pouco a pouco, o partido se distanciou do governo, a ponto de assessores da Damares afirmarem que a legenda já se encontra fora da base do governo. No Planalto, interlocutores afirmam que o partido permanece na base, ainda que numa condição de apoio crítico.

De toda forma, a relação entre a cúpula do Republicanos e o governo está esfriada. Por isso, Bolsonaro vê com bons olhos a filiação da ministra ao partido e está apto a negociar a sucessão do ministério a alguém do partido ou com o aval da cúpula, desde que tenha o apoio de Damares.

"A Damares tem sido um nome utilizado para unificar e trazer de novo o Republicanos para a base. Eles já pularam do barco e não apoiarão o governo, nem serão contra, se dizem neutros. O nome dela é muito precioso para isso. Automaticamente, o presidente melhora o relacionamento com a sigla e o Centrão mais à direita para que tenha, sim, espaço neste governo, coisa que, de fato, pouco ocorreu até o momento", diz um interlocutor da ministra.

O Republicanos tem no ministro da Cidadania, João Roma, seu quadro no primeiro escalão ministerial do governo. Porém, caciques do partido apontam que ele não foi uma indicação direta da cúpula, que se ressente do pouco espaço concedido pelo governo ao longo da gestão Bolsonaro. Não à toa, o ministro, que pode ser candidato ao governo da Bahia, tem dado sinais de que pode se filiar ao PL.

O Planalto adota, porém, uma postura de cautela, embora admita que existe a possibilidade de o Republicanos ficar com a pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos. "A Damares é o nome ideal para apaziguar a relação, que está desgastada e não é boa, mas ainda não dá para dizer que eles já romperam", afirma um interlocutor palaciano.

Como Damares pode ajudar a eleger aliados e reeleger Bolsonaro

Além da expectativa de tirar Davi Alcolumbre do Senado e de impedir a neutralidade do Republicanos no cenário eleitoral, Bolsonaro também acredita que Damares possa ajudar a reelegê-lo. A despeito do Amapá ser um estado com um colégio eleitoral inferior a 550 mil votos, a leitura feita no governo é de que sua candidatura pode puxar votos além do estado e ajudar a eleger e reeleger aliados.

O Planalto entende que o nome de Damares atingiu um alcance nacional. Não à toa, ela chegou a ser cotada e sondada como vice em uma chapa com Bolsonaro. Tê-la como candidata ajudaria, portanto, a ampliar a bancada conservadora e evangélica na Câmara, destacam interlocutores.

A análise feita por Bolsonaro e seus coordenadores eleitorais é de que as chances de sua reeleição e de ampliar a base na Câmara e no Senado aumentam com a presença de nomes de peso. Principalmente se contar com o apoio de ministros do governo. "Quanto mais ministros na disputa eleitoral, maior será a defesa do legado da gestão Bolsonaro nas urnas", defende um interlocutor palaciano.

A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que lançou a Frente Lealdade Acima de Tudo em apoio à candidatura de Bolsonaro, concorda que uma candidatura de Damares tem potencial para puxar votos não apenas no Amapá, mas também em outros estados e além da comunidade evangélica.

"Ela tem um trabalho com mulheres, indígenas, comunidade LGBT, inclusive uma secretária LGBT. Também tem trabalho com mães que têm filhos com doenças raras, com autismo, com síndrome de down, surdos, cegos. O público dela é muito grande, ela atende praticamente todo mundo", afirma Zambelli à Gazeta do Povo.

A parlamentar diz que Damares poderia sair tanto para deputada federal por São Paulo e ajudar a puxar ainda mais votos no estado, mas ela entende que é estratégica a candidatura da ministra no Amapá. "Ela tem o perfil para o Senado, é conhecida suficientemente para a disputa. É interessante sua candidatura no Amapá, pois além de ser bastante conhecida, ela enfrentaria uma pessoa [Alcolumbre] que queremos tirar da política de forma democrática", afirma.

A aliada do governo lembra, ainda, que Damares foi assessora parlamentar no Senado, quando trabalhou com o ex-senador Magno Malta (PL-ES). "Ela conhece o Legislativo, como funciona as coisas, sabe desde desenhar um projeto de lei até como fazer politicamente para ser aprovado", destaca. "Acho que só existe um ponto negativo dela vir candidata ao Senado: talvez ninguém teria o mesmo zelo que ela tem com o ministério como um todo", complementa.

O deputado e pastor Marco Feliciano (PL-SP), presidente da Igreja Assembleia de Deus de Orlândia e vice-líder do governo no Congresso, é outro aliado da base a elogiar a ministra e encorajar sua candidatura à reportagem. "A Damares foi uma leoa como pastora, como ministra e assim será como senadora da República. O povo evangélico e o povo conservador vão ganhar muito com ela no Senado", avalia.

Como a ministra pode ajudar politicamente em caso de eleição

A eleição de Damares também é incentivada por Bolsonaro por uma análise política. Caso seja reeleito e a ministra se eleja senadora, ele tem a convicção de que ela ajudaria a fortalecer a base do governo no Senado. O Planalto não quer repetir o isolamento vivido na Casa, onde notou que muitos senadores não eram oposição, mas também não se posicionavam favoravelmente ao governo e ao presidente.

A ideia de eleger Damares ajudaria o governo a ter um senador a mais para defender Bolsonaro e as pautas do governo. E não apenas isso, mas também a agenda conservadora. Em reuniões privadas, Bolsonaro tem demonstrado preocupações com o avanço de agendas identitárias da esquerda na América do Sul, como o aborto.

A alguns aliados, Bolsonaro disse que vislumbra na eleição de Damares a possibilidade de ter algum senador com o discurso político de fazer frente ao Foro de São Paulo. Para ele, boa parte dos aliados apoiados por ele ao Senado são identificados com a direita política, mas não com a pauta identitária mais conservadora.

"Esses ministros e outros aliados que estão indo ao Senado apoiados por ele não são pessoas que têm a causa contra o aborto, as drogas, que fazem militância e entendem a importância de tudo isso. Se o presidente for reeleito e não tiver pelo menos alguém no Senado que entenda a necessidade de combater o aborto e ideologias de gênero, o próprio governo sai enfraquecido, porque o eleitor comum cobra isso", afirma um interlocutor de Damares.

Para assessores da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, a ministra poderia reeditar a candidatura de Magno Malta no Senado no aspecto da agenda conservadora. "Ninguém peitava o Magno Malta para falar de aborto, ideologia de gênero, essas coisas. Ele fazia um barulho que chamava a atenção de todo mundo e constrangia outros senadores, inclusive de oposição. O que está em jogo é ter uma 'nova' Magno Malta", diz um interlocutor.

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