Personagens que ficaram famosos de forma trágica no noticiário nacional por terem familiares vítimas de crimes chocantes converteram sua visibilidade em votos para se eleger em Câmaras Municipais nas eleições municipais do último domingo (6). Entre os destaques estão Ana Carolina Oliveira (Podemos), mãe da menina Isabela Nardoni, que morreu em 2008 após ser jogada do 6º andar do prédio onde o pai morava com a mulher, em São Paulo, e o engenheiro Leniel Borel (Progressistas), pai do menino Henry Borel, morto em 2021 no Rio de Janeiro, pela mãe e pelo padrasto, que era vereador.
A bancária Ana Carolina Oliveira foi a segunda vereadora mais bem votada no maior colégio eleitoral do Brasil, Sâo Paulo, com 129.563 votos. Ela foi a terceira melhor colocada no ranking nacional, no que pode ser considerado um fenômeno das eleições municipais. Com uma proposta de defesa das crianças e adolescentes e contra a violência infantil, Ana Carolina se tornou influenciadora digital, com 1,5 milhão de seguidores apenas no Instagram, e atuação em outras redes sociais. Ela sempre empunha a bandeira de "dar voz a vítimas que sofrem em silêncio".
Na opinião do professor de Ciências Políticas do IBMEC de Belo Horizonte, Adriano Cerqueira, é comum nas eleições que apareçam figuras que "ganham o coração" do cidadão comum, que se sensibiliza com as tragédias pessoais e histórias de superação. Para ele, um dos fatores fundamentais do sucesso dessas candidaturas também se deve à exposição na mídia causada pela grande repercussão dos casos em que estão envolvidas, como o caso de Ana Carolina.
"Isso as deixa mais visíveis, mais conhecidas. Se elas conseguirem engatar alguma proposta relacionada à questão [o caso de que foram vítimas, e prometem combater a violência], torna mais fácil a sua eleição". Para o cientista, essa dita "vitimização" ajuda principalmente se o candidato eleito consegue desenvolver ações efetivas relacionadas às propostas de campanha.
No Rio de Janeiro, o pai do menino Henry Borel, o engenheiro Leniel Borel (Progressistas) foi eleito vereador com 34.359 votos, o oitavo melhor votado para a Câmara Municipal na capital fluminense.
Henry, de quatro anos, foi morto em 2021 no apartamento onde estava com a mãe, Monique Medeiros, e o então padrasto, Dr. Jairinho, que também era vereador no Rio de Janeiro e teve o mandato cassado em 2021. O homicídio até hoje tem detalhes não esclarecidos.
Na mesma esteira de vítima de um crime brutal contra uma criança, e colega de legenda de Ana Carolina Oliveira, no Podemos, Keiko Ota, se elegeu suplente de vereadora em São Paulo, com 12.480 votos. Keiko é mãe do menino Ives Ota, que foi sequestrado e morto em 1997, aos oito anos de idade, em São Paulo.
Veterana na política, Keiko já foi deputada federal por dois mandatos consecutivos, entre 2011 e 2019, e sempre atuou em defesa de penas mais rigorosas para crimes hediondos. Também adepta das redes sociais, Keiko tem pouco mais de 15 mil seguidores numa das redes que utiliza, e sempre lembra do legado de Ives e do trabalho do Instituto Ives Ota, criado por ela para atender vítimas de casos de violência.
Como vereadora, Keiko Ota promete seguir trabalhando na área de segurança, e também defende vítimas de violência doméstica como uma das bandeiras de campanha.
Também no Rio de Janeiro, a viúva da vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018 no centro da cidade, também se reelegeu vereadora neste domingo (6). Mônica Benício, do PSOL, defende causas feministas e direitos humanos, e conquistou votos de 25.382 cariocas. Em 2020, ainda sob o impacto do atentado que resultou na morte da companheira Marielle, ela se elegeu com 22 mil votos para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Analistas dizem que apelo de tragédias comove, mas não garante medidas efetivas
Na opinião do cientista político Alberto Carlos Almeida, da Consultoria Brasilis, a comoção gerada por casos marcados por violência extrema é resultado basicamente da exposição na mídia, que dá visibilidade a esses candidatos, mas não garante exatamente um bom desempenho na atuação pública.
"Vai ter de tudo aí dentro, gente que fará um bom trabalho e gente que não fará. De um modo geral, são sempre pessoas que nunca se envolveram com política, portanto, será mais frequente o fracasso do que o sucesso", avalia Almeida.
Já o consultor político Paulo Kramer, professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), destaca que além da super exposição midiática, que inicialmente atrai os eleitores, o desempenho de candidatos eleitos no rastro de tragédias e dramas pessoais vai depender das estratégias adotadas durante os mandatos.
"O que varia de candidato para candidato é a estratégia de ‘campanha permanente’ que cada um adota depois de eleito. Para se reeleger, a pessoa precisa ter trabalhado para se provar uma presença positiva e marcante no dia a dia da sociedade, esteja ou não essa presença ligada aos acontecimentos que possibilitaram a primeira eleição", pontua Kramer.
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