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– Vou te contar um segredo. Vou torcer pela Coreia.

– Você está louco.Vão te matar.– Por isso é segredo.

– Você é brasileiro. Não está pegando nenhuma coreana, que eu saiba. Estamos num bar com uns 600 machos que vão te arrancar o couro se souberem. Você só pode estar zoando comigo.

– Sério. Resolvi ontem. Viu a torcida deles? Menos de 50 pessoas. E dizem que são uns chineses que eles contrataram lá na África para torcer por eles. Coitados. Não podem nem sair do país para ver um jogo de futebol.

– E daí? Que se danem, tu é brasileiro, cara! Deixa cada torcida se virar como der!

– Fala baixo.

– Não pode ser sério.

– É sério e fiquei pensando a noite inteira nisso. Se o Brasil ganhar do pior time da Copa, todo mundo vai dizer que é obrigação, certo?

– Certo. E é obrigação mesmo. O Dunga não pode fazer a gente perder contra o maior azarão da Copa.

– E se a Coreia ganhar?

– Como se a Coreia ganhar? Véio, ficou maluco?

– Então, se eles metem pelo menos um gol na gente, vai tudo abaixo lá na Coreia. O cara que fizer o gol vai ser santificado. Santificado não, que eles são comunistas. Sei lá, vai ter estátua em praça, rua com o nome dele, uma casa melhor pra família do cara... Tudo isso por causa de um gol contra o Bra­­sil. Véio, vai por mim, pra Coreia um gol é muita coisa. Pra nós não refresca. Decidi que vou ser coreano por um dia.

– Não acredito.

– Olha lá, olha lá! Os caras tão chorando com o hino na­­cional deles! Olha! Olha como são coitados! Acho que vão para o paredão se tomarem fumo da gente. Acho que estão chorando de medo. Puxa, estou com pena deles e nem sei onde fica a Coreia do Norte. Vou dar um google em casa.

– Não acredito. Não pode ser verdade. Cala a boca e para de torcer pro ti­­­­me errado.

Ouvi falar que num bar da cidade alguém foi expulso por vibrar pelo o gol da Coreia do Norte. O homem pegou um táxi e pediu para ir ao Cemi­­tério Municipal. Che­­gando ao destino, o taxista virou-se para cobrar a corrida e viu somente o banco traseiro vazio.

Não acredite nesta lenda de torcedor fantasma. Ele pode até ter desaparecido no meio da neblina curitibana, mas, garanto, não estava torcendo pela Coreia.

Quando nossa seleção joga, por alguns dias ninguém se importa com os buracos da própria rua; somos tomados por um sentimento coletivo de brasilidade que contagia até os mais céticos. De repente, somos o país do samba, do carnaval e do futebol. Ba­­tucamos em mesas. Andamos de carro com bandeirinhas plásticas nas janelas. Torcedores de Copa não são altruístas e nunca torcem por pena. A motivação que o amor à pátria traz é uma mulher muito ciumenta – não admite ser trocada por outra.

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