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O judô de Sarah Menezes, campeã olímpica, é uma das exceções quando o assunto é remuneração no esporte | Marcos Rodrigues / Gazeta do Povo
O judô de Sarah Menezes, campeã olímpica, é uma das exceções quando o assunto é remuneração no esporte| Foto: Marcos Rodrigues / Gazeta do Povo

Machismo histórico

Embora praticassem a maioria das modalidades, as mulheres só foram autorizadas a competir em todas, oficialmente, em 1979, quando foi revogada a determinação que não autorizava o sexo feminino a competir em esportes que poderiam "fazer mal ao físico frágil". Tudo porque o Estado Novo (governo Getúlio Var­­gas entre 1937 e 1945) criou o Decreto 3.199, que vedava a prática para futebol, halterofilismo, beisebol e de lutas de qualquer natureza.

Marta, Sarah, Jaqueline e Sandra, Maurren, Paula, Hortência, Fabiana, Daiane, Natália... O Brasil já formou uma constelação de estrelas femininas no esporte, e a cada edição dos Jogos Olímpicos o país tem enviado cada vez mais mulheres para competir. Mas ainda há um quesito que não conseguiram sair da sombra do mundo esportivo masculino: remuneração.

Assim como no mercado de trabalho formal, em que elas ganham, em média, 74% do salário deles (fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no esporte, as mulheres também batalham pela igualdade de rendimentos. No judô e atletismo, ao menos entre as atletas de elite, conseguiram.

"Faz 16 anos que treino e todos os salários são iguais", diz Fabiana Murer, 31 anos, campeã mundial do salto com vara em 2011.

No tatame, a balança dos ganhos foi equilibrada recentemente: "Recebemos as mesmas premiações. As meninas conseguiram ter seu próprio espaço. Sempre batíamos na trave, mas conseguimos compor nosso espaço", diz Sarah Menezes, 22 anos, primeira mulher a ganhar uma medalha de ouro para o Brasil na modalidade, feito obtido em Londres (2012).

Mas a equiparação de rendimentos das judocas depende dos resultados de cada uma. Parte da seleção feminina ainda batalha para atingir o mesmo patamar.

Mesmo no vôlei, em que a seleção feminina é a atual bicampeã olímpica, estima-se que o investimento nas equipes seja cerca de 30 vezes menor que dos times masculinos na Superliga.

"Não consigo associar nada machista como causa, mas há, sim, mais dinheiro envolvido no esporte masculino. No vôlei, até mesmo o público feminino prefere ver os jogos deles. Talvez porque o sucesso nas quadras tenha vindo primeiro com eles [ouro olímpico em Barcelona-1992]", avalia o diretor da Nielsen Sports, empresa de informação e pesquisa de mercado, Rafael Plastina.

A natação – na mesma linha – ainda relega as moças ao segundo plano.

"O padrão dos meninos é de medalhistas olímpicos. Ainda não temos esse padrão. Até aí, tudo bem, eles conquistaram isso. Mas, se você parte para a questão da estrutura e suporte dado para que eles chegassem a esse patamar, as diferenças começam a aparecer e aí se entende o porquê dessa disparidade", fala Joanna Maranhão, 25 anos, que nos Jogos de Atenas (2004), foi 5.º lugar nos 400 m medley, igualando o feito de Piedade Coutinho (nos 400 m livre em Berlim-1936).

A promessa da Con­fe­­deração Brasileira de Des­por­­tos Aquáticos (CBDA) é que elas sejam o foco para os Jogos do Rio, em 2016.

O ambiente mais hostil é no futebol. Embora com número em ascensão, a única competição nacional é a Copa do Brasil (apesar de contar com 31 times, ainda padece de evolução técnica e investimentos). A seleção feminina é praticamente ignorada pela CBF, mesmo tendo Marta, eleita cinco vezes como melhor jogadora do mundo.

A camisa 10 já declarou que se fosse homem, ganharia muito mais. Quando defendeu o Santos em 2011, seu salário era de R$ 150 mil, oito vezes menor do que o de Ronaldinho Gaúcho no Flamengo.

Para o mercado, mulher tem de ser ‘bela e fera’

Campeões viram heróis. Campeãs, musas. A diferença não é apenas etimológica. Se aos astros do esporte os resultados bastam para fazer com que sejam alçados ao status de semideuses e angariem patrocinadores; para elas, atingir a mesma condição é preciso, além da competência técnica, aliar atributos estéticos.

"Beleza ajuda, sim. O homem é o herói, a mulher, não. Não existe maior heroína do que a Sarah Menezes. Mas ela não teve praticamente nenhum retorno de mídia, comparado ao que o [Cesar] Cielo teve na época do ouro de Pequim", diz Joanna Maranhão.

A saltadora Fabiana Murer diz não se incomodar com essa conjugação de valores. Tanto que já pousou para capas de revistas, passando por produção "mulherzinha". "A beleza é um ponto a mais [para a atleta]. Disputo um esporte que, em si, é muito estético. Já fiz algumas fotos estilo modelo, me divirto, saio um pouco da rotina."

O diretor da Nielsen Sports, Rafael Plastina, diz que há empresas que precisam conjugar os valores técnicos aos estéticos e há atletas que cumprem bem esse papel. "A [tenista Maria] Sharapova, por exemplo, é patrocinada pela Ômega, que produz relógios de alta classe e quer que o consumidor veja beleza e qualidade. Há atletas masculinos também que são procurados pelo apelo estético, como o Tom Brady [futebol americano]."

Mesmo quando competentes e lindas, as esportistas mulheres ainda não têm tanto espaço na mídia quanto os homens. As transmissões de competições e a cobertura jornalística dos eventos são massivamente masculinas, especialmente pela predominância da preferência do público pelo futebol, destaca Plastina.

Para quebrar essa barreira, nos EUA, as jogadoras de futebol americano disputaram a Liga de Lingerie por quatro temporadas (jogavam usando tops e shorts). Este ano, vão trocar os trajes sumários por uniformes, com o desafio de manter a atenção do público.

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