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Lembra de John Keating, personagem de Robin Williams no filme Sociedade dos Poetas Mortos, que faturou o Oscar de Melhor Roteiro Original em 1990? Era um professor de literatura de uma escola ultra conservadora – a Academia Welton –, mas que usava métodos pouco ortodoxos para orientar seus alunos. Ao invés de apenas transmitir o conteúdo, mencionando as obras e períodos e cobrando a leitura (o que pode ser terrivelmente enfadonho), Keating despertava o interesse pela disciplina estimulando os estudantes a perseguirem suas paixões individuais.

Já no primeiro dia de aula, desafiava-os a abandonar a passividade, questionando se eles preferiam virar “comida de vermes” ou aproveitar cada instante para tornar suas vidas extraordinárias. Estava lançado o conceito de aproveitar o dia (“carpe diem”), que permeia todo o filme. A partir dessa ideia, ele faz os estudantes perceberem o privilégio que é desfrutar das obras dos grandes poetas e escritores, e as infinitas possibilidades de enriquecer o espírito que a literatura proporciona. Detalhe: quem chega a essas conclusões são os próprios alunos, contagiados pelas ideias e pela paixão manifestada pelo professor.

Esta é uma boa maneira de ilustrar a aprendizagem ativa, conceito que começa a ser adotado por algumas universidades brasileiras. É o caso da PUCPR, que desde 2014 tem implementado uma série de ações inovadoras no seu sistema de ensino e aprendizagem, com o objetivo de formar cidadãos mais autônomos, conscientes e capazes de lidar com os desafios da vida moderna. Modelo adotado por universidades de ponta como Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT), a aprendizagem ativa pode ser resumida como a transferência do protagonismo do professor para o aluno no processo de ensino e aprendizagem, por meio de técnicas como simulação, sala de aula invertida, peer to peer instruction (aprendizado de aluno para aluno), jogos e dinâmicas, entre outros.

Mas na estratégia posta em prática na PUCPR, a premissa é bem mais ampla: estimular a autonomia, para que os estudantes criem e assumam o seu caminho de aprendizagem; oferecer alternativas para que eles consigam fugir do senso comum; criar situações para que eles atuem cooperativamente; reiterar a importância da honestidade, na academia e na vida; e demonstrar a relação entre dedicação e sucesso.

Simulação

Com base em um projeto piloto elaborado por todas as oito escolas da instituição (de Arquitetura e Design, de Comunicação e Artes, de Direito, de Educação e Humanidades, de Medicina, de Negócios, Politécnica e de Ciências da Vida), cada curso vem escolhendo uma forma de aplicar essas ideias. A Escola de Medicina, por exemplo, conta com um Centro de Simulação Clínica que é o mais moderno da América Latina. “Temos um espaço que recria vários tipos de ambientes pré-hospitalares – um carro, uma ambulância, o quarto de uma residência, uma rua movimentada –, e também os hospitalares, como a UTI e o centro cirúrgico”, descreve a médica e professora da Escola de Medicina Aline von Bahten. “Além dos ambientes, os estudantes têm acesso aos instrumentos, equipamentos e medidores, e aprendem a utilizá-los em bonecos que respiram, choram, sangram, vomitam e até dão à luz.”

“Temos tido resultados muito bacanas com os estudantes. Eles se sentem aliviados por poderem errar na simulação, ao invés de errarem de verdade lá fora.”

Aline von Bahten, médica e professora da Escola de Medicina da PUCPR.

E a simulação não se restringe aos procedimentos e suas complicações. “No sétimo período, além dos procedimentos, começamos a trabalhar com atores. Temos uma parceria com o curso de Teatro, que cede alunos que nos ajudam em situações como proteção da cena, reação dos familiares, humanização do atendimento e questões éticas, como no socorro a supostos bandidos”, conta a médica. “Temos tido resultados muito bacanas com os estudantes. Eles se sentem aliviados por poderem errar na simulação, ao invés de errarem de verdade lá fora.”

Como verificado na simulação com atores, a educação inovadora nem sempre depende da tecnologia ou de equipamentos caros ou sofisticados. Um exemplo quase prosaico vem do curso de Jornalismo: “Os alunos quase morriam quando eu aplicava uma prova sobre um livro qualquer”, conta a professora Suyanne Tolentino de Souza. “Então eu resolvi avaliar de outra forma: eles sentam em círculo diante de uma caixa cheia de papéis com perguntas sobre a obra; cada um tira uma pergunta e responde; se não souber, pode trocar de papel uma única vez; os colegas também podem ajudar, respondendo questões tiradas pelos outros; no fim, cada um tem um minuto para escrever num papel suas impressões sobre o livro, e vão trocando os papéis entre eles. Com essa ‘brincadeira’, eles interpretam, compartilham, sintetizam, verbalizam, escrevem e leem o conteúdo da obra.”

Aula invertida

Outra técnica é a chamada sala de aula invertida. Quem explica é o professor Bruno Campagnolo, coordenador do curso de Desenvolvimento de Jogos Digitais. “Ao invés do modelo clássico de darmos uma aula expositiva para o aluno refletir sobre ela nas tarefas de casa, fazemos o inverso: há um momento pré-aula, em que o aluno acessa o conteúdo gravado em vídeo a hora que quiser, com a possibilidade de tirar dúvidas previamente. Na sala de aula, com eles já iniciados no assunto, usamos o tempo para interagir, debater o tema, criar competições e dar um atendimento mais individualizado”, descreve. “Dessa forma a gente empodera o estudante, que pode se dedicar ao conteúdo a hora que achar melhor, e diminui a distância até ele.”

E o melhor é que é possível adotar essa forma de ensino em todas as disciplinas, de qualquer curso. “Não só pode, como deve. Mas é preciso ter cuidado. Como há muitas formas de aprender, devem ser várias as formas de ensinar”, ressalta o filósofo Jelson Oliveira, professor do Programa de Pós-Graduação da universidade. “Isso significa que o professor terá que decidir que tipo de atividade é mais adequada a cada curso. É preciso levar em conta o perfil e os interesses dos estudantes e construir essas estratégias de forma democrática, com os demais colegas e os gestores.”

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