Cobertura de atendimento da população varia conforme a região. Sudeste conta com a maior cobertura e ainda assim 9% da população não tem acesso a água potável.
Cobertura de atendimento da população varia conforme a região. Sudeste conta com a maior cobertura e ainda assim 9% da população não tem acesso a água potável.| Foto: Sabesp/Divulgação

Os prefeitos que forem eleitos em novembro terão inúmeros desafios a partir de 2021. Além das questões que envolvem educação, saúde, transporte e outros problemas “mais visíveis”, eles precisarão pensar em demandas como abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto. Além de essenciais para o desenvolvimento econômico, são obras que estão previstas no novo Marco Legal do Saneamento.

O Projeto de Lei foi sancionado pela Presidência da República em julho último.  Como próximas etapas, espera-se a votação dos vetos presidenciais e a promulgação dos decretos necessários para a regulamentação do Marco. A pandemia de Covid-19 acelerou esse debate e os serviços se tornaram ainda mais relevantes.

O novo Marco Legal do Saneamento prevê a universalização do fornecimento de água e coleta de esgoto no Brasil e estabelece que isso seja feito até 2033. A grande novidade é que o texto atual permite a participação da iniciativa privada para atender essa demanda, algo que até então era responsabilidade quase exclusiva de empresas estatais.

ESTATÍSTICAS

Entre as metas estabelecidas na nova lei, 99% da população deve ser atendida com fornecimento de água potável. Para a rede de coleta e tratamento de esgoto essa marca é de 90%.

Dados do Instituto Trata Brasil mostram uma grande discrepância entre as diferentes regiões do país atualmente. Enquanto no Sudeste 9% da população não tem acesso a água potável, na região Norte esse problema atinge 43% dos habitantes. Quando o assunto é a coleta de esgoto, os números são ainda mais alarmantes: na Região Norte, 89,5% das pessoas não contam com esse serviço. No Nordeste são 72%. No Sudeste, região com a maior cobertura, esse índice é de 20,8%.

O CEO da petroquímica Unipar, Mauricio Russomanno, salienta que caberá aos novos gestores públicos a elaboração de estratégias para a universalização dos serviços de saneamento. Segundo ele, é fundamental que os prefeitos eleitos assumam seus cargos cientes da urgência e da importância dessas obras, sob o risco de sofrerem penalização por descumprir os prazos estabelecidos na lei. “É bem provável que metade do próximo mandato seja destinada aos ajustes para viabilizar essas obras, como processos de licitação, prazos necessários para as empresas interessadas comprovarem que têm capacidade técnica e financeira para o projeto. Se nada for feito até 2025, o cronograma de obras não se cumpre até 2033”, pontua.

Russomano destaca que para ampliar o saneamento básico no Brasil e reverter o cenário atual é fundamental viabilizar parcerias entre as prefeituras, a iniciativa privada e os bancos de fomento. “O importante é desonerar as prefeituras, que estão vindo de um momento de pandemia e com os serviços sobrecarregados em áreas como saúde, educação e assistência social”, analisa o CEO da Unipar.

FINANCIAMENTO

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – principal instrumento do Governo Federal para financiamento de longo prazo – oferece quatro linhas de crédito destinadas a projetos na área de saneamento. Por meio da assessoria de imprensa, o órgão informa que, além do financiamento, também oferece apoio aos gestores públicos na estruturação de projetos de concessões.

Inicialmente, a equipe técnica do BNDES realiza um diagnóstico da prestação atual dos serviços, levando em consideração diversos aspectos: jurídico, financeiro, operacional, ambiental, entre outros. Com base no resultado é desenvolvido um modelo de negócios para propiciar a universalização dos serviços de saneamento para a população, a partir dos investimentos necessários.

A etapa de implantação do projeto segue o fluxo tradicional dos órgãos públicos, com a elaboração do edital de licitação e do contrato de concessão, realização de consulta pública, audiência pública e road show para apresentação do projeto aos investidores. Depois dessas etapas, é feito o lançamento do edital da concessão e realizado o leilão para definição do futuro concessionário.

De acordo com Cláudia Lins, supervisora do Núcleo de Desenvolvimento Territorial da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o Congresso aprovou o novo Marco Legal do Saneamento, mas a entidade ainda aguarda a apreciação dos vetos para poder fornecer os subsídios necessários às prefeituras. Estão previstos cursos remotos e publicações técnicas para orientar os gestores públicos.

Cláudia explica que a CNM vê de forma positiva a participação da iniciativa privada na estruturação e implantação de projetos de saneamento básico. Porém, ela ressalta que a grande preocupação é com as cidades menores, que têm poucos atrativos para os investidores, além de uma limitada capacidade de articulação. “90% dos municípios brasileiros são de pequeno porte. Se a lógica for regionalizar para ganhar escala, queremos ver se isso realmente vai acontecer”, aponta, referindo-se às cidades com pouco adensamento populacional ou distantes dos grandes centros e que podem representar altos investimentos em infraestrutura às empresas que ganharem as concessões.

Victor Borges, presidente executivo da Rede Nacional de Consórcios Públicos, destaca que o Marco Legal do Saneamento propõe a competição pela prestação do serviço no país. E, para implantar os projetos, a lei determina que os municípios formem blocos e se organizem em grupos. “Cada região do país está num estágio diferente. O que vemos em comum é a necessidade de trabalhar a integração entre os municípios”, pontua.

Borges ressalta que a entidade acompanhou desde o início a tramitação da lei e entende que se trata de uma tarefa que envolve todas as esferas governamentais, Ministério Público, Tribunais de Contas, agências regulatórias, universidades, sociedade e os investidores. “O problema do saneamento é regional. Os bons projetos precisam ter escala, segurança jurídica, interesse coletivo e dialogar com empresas públicas e privadas”, completa.