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Arquitetura

Arquitetos propõem transformar edifícios comerciais em conjuntos que unam moradia e trabalho

Daliane Nogueira
03/07/2020 20:00
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Repensar o uso de edifícios de uso exclusivo para escritórios: essa é a proposta do projeto H.O.M.E do Hiperstudio | Divulgação

Há mais de 100 dias milhares de pessoas deixaram de ir para os escritórios e passaram a trabalhar a partir de suas casas. O impacto dessa mudança, que em muitos casos permanecerá para o pós-pandemia, é ainda incerto. Mas não seria exagero imaginar que muitos prédios corporativos e comerciais, em endereços importantes das grandes cidades, passem a ficar subutilizados.
Essa realidade leva a um debate, uma reflexão no campo da arquitetura no que diz respeito ao futuro da organização urbana e das construções. Apesar de estar longe de ser uma questão nova, o adensamento urbano, com as pessoas morando perto do trabalho, vem ocupando a cabeça de quem pensa a cidade de forma ainda mais constante.
Neste cenário os profissionais do escritório Hiperstudio, sediado em São Paulo, imaginaram a conversão de edifícios hoje exclusivamente comerciais em conjuntos de uso misto, incluindo unidades residenciais e áreas de convívio.
“Essa discussão de uso misto existe há muito tempo, não é nova. Haja vista os empreendimentos que têm duas torres, sendo uma comercial e outra residencial. A partir disso, começamos a discutir, fazer um projeto conceitual. Especialmente observando o local onde nós mantemos o escritório, a Avenida Brigadeiro Faria Lima. Até por volta das 19 horas ela é muito movimentada, depois desse horário ela acaba ficando obsoleta”, aponta Matheus Marques que junto do sócio Ricardo Felipe Gonçalves, do arquiteto Luís Favilla e do estudante de arquitetura Rolando Figueiredo, assinam o projeto intitulado H.O.M.E (Housing and Office Modular Environment).
“Nossa
ideia é intensificar o uso misto, promovendo uma simbiose direta
entre a habitação e o escritório", explica Matheus, colocando
como ganho direto dessa iniciativa a diminuição dos deslocamentos
que produzem aglomerações e diminuem a qualidade de vida da
população.

O projeto

A
equipe tomou como estudo de caso justamente o edifício onde fica o
escritório do Hiperstudio, área reconhecida em São Paulo como eixo
de serviços e com predominância de edificações monofuncionais.
A ideia, basicamente, é fomentar novos usos e garantir que o prédio continue habitado, em uso, por todo o período do dia. Para isso, são propostos módulos residenciais. “É um sistema de encaixe de diferentes tipos de apartamento que se conectam verticalmente a pelo menos um módulo de escritório”, descreve Matheus.
O
sistema modular permitiria a criação de apartamentos de salas
comerciais de diferentes tamanhos e seria possível que os moradores
garantissem um local de trabalho tranquilo e isolado da intimidade da
convivência doméstica.
“É importante pontuar que os escritórios podem permanecer funcionando com acesso independente em seus pavimentos exclusivos. Isso permite que se receba clientes ou profissionais que não morem no prédio”, destaca.
Mas,
para um novo uso, abre-se a questão das áreas de convívio, tão
importantes em empreendimentos residenciais. Para atender esta
necessidade, a cobertura do edifício seria convertida em espaço de
lazer, com projeto de paisagismo específico para os moradores.
“Outra alternativa seria a subtração de unidades no meio do
edifício, como que criando “buracos” onde seriam instalados
espaços de convivência espalhados pela torre”, completa Matheus.
Os arquitetos explicam que os edifícios comerciais têm características semelhantes, o que possibilitaria a adequação deste projeto em outros prédios. Prédios centrais, antigos e que já eram subutilizados mesmo antes da pandemia poderiam receber estudos parecidos.
A ideia do Hiperstudio participou de um concurso internacional para propor algo conceitual sobre novos espaços de moradia e trabalho, com a intenção de arrecadar fundos para ações contra a Covid-19. O projeto brasileiro ficou entre as 12 melhores propostas.
Para Ricardo Felipe Gonçalves a equipe em nenhum momento “reinventou a roda, [apenas colocou em prática o pensamento de que] uma cidade compacta é a melhor solução. O que a gente propõe é mudar um pouco a tipologia”, defende.
A equipe do Hiperstudio.
A equipe do Hiperstudio.
A reação advinda com a pandemia de “negação da cidade”, como se este fosse o espaço que “promove ou favorece a disseminação da pandemia”, incomoda os profissionais que, de certa forma, entendem o projeto como uma provocação. “Não é saudável, nem sustentável negar a cidade. E neste projeto, no fundo, estamos defendendo algo que se discute há muito tempo: a cidade compacta, o morar perto do trabalho e uma cidade mais humana, promovendo um estilo de vida mais saudável. Gostaríamos que [o isolamento provocado pela pandemia] fosse uma oportunidade para que pensássemos em uma cidade melhor e déssemos valor para o espaço urbano e todas as suas qualidades”, finaliza Ricardo.

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