Arquitetura

Por cidades melhores, arquitetura precisa abraçar o humor

Carolina Werneck*
04/08/2017 10:30
Thumbnail

O arquiteto argentino Enrique Walker e o arquiteto espanhol Andrés Jaque. Os dois professores da Universidade de Columbia estiveram em Curitiba para a exposição Arquitetura para Curitiba. Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo e Espacio Fundación Telefónica/Reprodução

O arquiteto argentino e professor da Universidade de Columbia Enrique Walker é categórico ao afirmar que as mazelas causadas pela falta de segurança a países como os da América Latina poderiam ser resolvidas derrubando barreiras sociais em vez de erguê-las. “Sociedades mais justas são, também, mais seguras”, dispara. Acompanhado do amigo e também arquiteto espanhol Andrés Jaque, o falante e bem-humorado Walker conversou com HAUS sobre o papel da arquitetura nas sociedades atuais.
“É uma aposta de longo prazo, mas é importante porque uma arquitetura que exibe seu exercício da segurança vai contra a possibilidade de uma sociedade aberta”, afirma o argentino. Para ele, tomar a decisão de construir de modo a se eliminar divisões sociais é comparável à de investir em educação ou prisões. “Eu diria que o meu investimento seria na educação”, acrescenta, rindo, no que é acompanhado por Jaque.
Mais que colegas de docência em Columbia, nos Estados Unidos, os dois são amigos. “É bonita a coincidência de estarmos ambos aqui [em Curitiba, durante palestras na abertura da ExpoCuritiba 2017], porque costumamos conversar sobre como a arquitetura pode operar no mundo. Isso tem sido fascinante pela forma como fomos trabalhando o tema, mas também pela forma como fomos trabalhando nossas próprias concepções sobre o assunto”, diz Walker.
Os arquitetos afirmam que é preciso ampliar o debate sobre a atuação da arquitetura no âmbito social e não meramente em seus aspectos construtivos. Jaque acredita que, para que a arquitetura seja “um campo com responsabilidade cultural e política, é necessária uma expansão em todo um contexto de discussão, de debate, de interação. Em uma sociedade civilizada, democrática e culta a atividade da arquitetura não pode ser de mera edificação, desconectada de outros componentes”. Walker avalia que essa é uma questão que também passa pela conceituação da disciplina. “Pode-se falar de arquitetura ou de cultura arquitetônica, que supõe um espectro amplo que passa pela construção de edifícios, de projetos, de desenhos, de escritos e de conversas que contribuem a um diálogo mais amplo.”
Uma abordagem assim permite que a arquitetura se aproxime das diferentes realidades sociais existentes no mundo contemporâneo. Esse é um tema recorrente entre arquitetos de diferentes vertentes: como reformular a produção arquitetônica para que ela contribua com a qualidade de vida nas cidades? Não se trata mais apenas de entregar edifícios e avenidas bem construídos ou visualmente inovadores, é preciso atender demandas específicas das pessoas que vão utilizar essas obras.
Na avaliação de Jaque e Walker, hoje os profissionais da área estão mais conscientes do que fazem e de como isso afeta a cidade e o universo ao redor. Além disso, eles dizem acreditar que os objetivos da área em que atuam não são diferentes dos da sociedade como um todo. Para eles, a disciplina vem observando os problemas que precisam ser sanados e se perguntando como ela pode contribuir para que esses objetivos gerais sejam atendidos, como pode tomar o controle para tentar resolvê-los.

Alegria e ideologia

Encarar a arquitetura como uma matéria que lida diretamente com o mundo das ideias é, para os dois amigos, fundamental no mundo de hoje. O atual cenário global, que vem negligenciando os incentivos a quase todo tipo de cultura, é uma lacuna em que esse papel ideológico se encaixa perfeitamente. “A arquitetura tem hoje um papel muito importante, que é o de cultivar ideias e apostar na cultura, em um momento em que a cultura está sob tensão a nível mundial. Há uma espécie de predomínio de ceticismo sobre tudo o que tem a ver com pensar ou formular ideias. É um papel decisivo em um mundo que se tornou anti-intelectual”, avalia Walker.
Em um momento de instabilidade política em diversos países, Jaque afirma que o uso do humor pela arquitetura como uma possibilidade necessária. “O humor é uma ferramenta política, uma ferramenta para estender as discussões e poder dizer coisas que são muito importantes. A arquitetura necessita dessa política do humor, uma política que possa gerar também uma existência compartilhada e que muitas vezes dá voz a pequenas situações que de outra maneira seriam invisíveis.” Walker diz estar totalmente de acordo. “É curioso, às vezes se vê mais humor nos edifícios que nos arquitetos. Às vezes nos levamos a sério demais em detrimento da capacidade de aumentar a amplitude daquilo que fazemos.”
*Especial para a Gazeta do Povo

LEIA TAMBÉM:

Enquete

Você sabe quais são as vantagens de contratar um projeto de arquitetura para sua obra de reforma ou construção?

Newsletter

Receba as melhores notícias sobre arquitetura e design também no seu e-mail. Cadastre-se!