Arquitetura

Casa Lerner: espaço que abrigou judeus refugiados da Segunda Guerra será restaurada em Curitiba

Vivian Faria*
22/04/2019 10:59
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Foto: Haraton Maravalhas/Casa da Memória

Um chamativo tapume colocado em frente à casa de número 407 da rua Riachuelo, quase em frente ao recém-inaugurado Cine Passeio, anuncia o fim do período de abandono do prédio – que já dura anos. Conforme sinaliza, a Casa Lerner, que recebeu esse nome em homenagem a Dora e Israel Chaim Lerner, conhecido como Jaime, proprietários do local durante aproximadamente 40 anos, é um dos imóveis a ser recuperado pelo projeto Rosto da Cidade, idealizado pela Prefeitura de Curitiba e que prevê a revitalização urbana de alguns pontos icônicos da cidade.
Nesse caso, porém, a expectativa é de que a casa passe por mais do que limpeza e pintura, conforme diz o programa. A recuperação ali deverá ser mais significativa, não apenas por necessidade – há relatos da
precariedade da situação publicados pela Gazeta do Povo desde pelo menos 2010, mas também porque a casa deverá ser incorporada ao patrimônio da prefeitura para ser transformada em um espaço cultural sob responsabilidade da Fundação Cultural de Curitiba (FCC).
De acordo com a assessoria de imprensa da FCC, o imóvel está em processo de desapropriação, o qual começou em outubro de 2018, após a publicação no Diário Oficial do município de decreto que transformava a casa em bem de utilidade pública. O órgão não informou em quanto tempo esse processo deve ser finalizado.
Quanto aos projetos de restauro e uso do espaço, a FCC afirmou que eles ainda estão em desenvolvimento e devem ser apresentados quando a desapropriação for finalizada. O que se sabe até o momento é que ele sediará “uma nova unidade cultural, a qual deverá se integrar aos equipamentos culturais já existentes nas proximidades, como Cine Passeio e Solar do Barão”.
Foto: Haraton Maravalhas/Casa da Memória
Foto: Haraton Maravalhas/Casa da Memória

Belle Époque

Quem viu a Casa Lerner pouco antes da instalação do tapume da prefeitura, já bastante deteriorada pelo tempo e o abandono, dificilmente vai usar termos como euforia ou progresso para falar dela. Contudo, são essas as palavras associadas ao período e estilo que ela representa: a Belle Époque, aqui fortemente ligada ao ciclo da erva-mate.
À época – uma pesquisa da Casa da Memória indica que o imóvel foi erguido na década de 1910 –, havia uma euforia relacionada ao progresso e à cultura, o que se refletia em uma arquitetura “celebrativa” e “extrovertida”. Entre as características da casa que se relacionam com o estilo adotado naquele momento estão o porão alto, as escadarias conduzindo à entrada principal, os detalhes ornamentais no gradil de ferro e as grandes janelas de frente para a rua.
Mas não foi só por isso – ou pelo fato de ser um residência em meio aos muitos sobrados comerciais da via – que a casa se tornou importante: enquanto foi propriedade dos Lerner, o local se tornou um ponto de encontro da comunidade judaica. Depois da morte do casal, no entanto, o local foi vendido para comerciantes da região e, mais tarde, levado a leilão devido a um processo trabalhista contra um antigo proprietário. Mesmo tendo sido adquirido por um microempresário em 2004, a residência acabou fechada e abandonada à ação do tempo.

Os Lerner

Os Lerner Dora e Israel Chaim eram judeus que vieram ao Brasil na década de 1930, assustados com o avanço do antissemitismo. De acordo com reportagem escrita por José Carlos Fernandes e publicada na Gazeta do Povo em julho de 2010, ao chegarem aqui, foram acolhidos pelo industrial Salomão Guelmann, da Móveis Guelmann, que ficou conhecido por abrigar judeus perseguidos na Europa, e abriram uma lavanderia na rua Cruz Machado em parceria com Rosa e Abraham, irmã e cunhado de Dora.
Alguns anos mais tarde, com o fim da sociedade, Israel e Dora abriram a Casa Paris, na Praça Tiradentes. Os rendimentos do novo negócio permitiram então que o casal comprasse o que considerava “a mais bela casa da Riachuelo”. Ali, o casal criou alegre e abundante refúgio judeu em meio a um
conjunto de comércios majoritariamente sírio-libanês, onde, de acordo com os herdeiros Geni Wilner e Bernardo Rzeznik, havia lanches e reuniões – e mais do que isso: abrigo e afeto para enfrentar o difícil período da Segunda Guerra Mundial.

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