Arquitetura

“Criar dá trabalho e requer recursos, por isso é caro”, diz arquiteto da Louis Vuitton

Mariana Domakoski*
11/12/2016 20:58
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O arquiteto Eric Carlson. Foto: Divulgação

Nascido nos Estados Unidos e residente na França, o arquiteto Eric Carlson tem mais de 30 anos de experiência no mercado de luxo. Começou no setor como cofundador e diretor do departamento de arquitetura da Louis Vuitton. Atualmente à frente do escritório Carbondale, ele assina projetos de alto padrão para BMW, H. Stern, Tag Heuer, entre outras marcas, em diversos países, como França, Estados Unidos, Japão e Brasil, onde está baseado um escritório Carbondale.
Por aqui ele já projetou o restaurante Piselli Sud, no Shopping Iguatemi, em São Paulo, além de várias outras áreas do centro comercial. A HAUS conversou com Carlson após sua palestra sobre alguns de seus projetos durante o “New Concept Design – Criatividade para o Mundo”, seminário organizado pelo Núcleo Paranaense de Decoração.
Restaurante Piselli Sud, em São Paulo. Foto: Rômulo Fialdini/Divulgação
Restaurante Piselli Sud, em São Paulo. Foto: Rômulo Fialdini/Divulgação
Como é trabalhar com arquitetura no mercado de luxo?
Geralmente você é treinado para desenhar baseado na economia. Ao criar algo, além de se perguntar se é bom e funcional, você também se pergunta se é bonito. E você é habilitado para decidir se é bonito baseado na economia: “É belo porque eu fiz de uma maneira econômica”. Isso é importante para muitos tipos de arquitetura, mas não para todos. Luxo não é beleza econômica. É, sim, a melhor resposta. Ser ou não econômico não é prioridade. No luxo, a prioridade – e também o maior desafio – é aprender a ter ideias que não sejam dirigidas pela economia, a não ser seduzido pela beleza econômica.
Para você, luxo é a personalização máxima. É estudar o cliente de forma tão profunda que é possível entender exatamente o que ele quer. Isso vale também para a arquitetura?
É isso mesmo. Perfeito!
Projeto da loja Louis Vuitton, em Paris. Foto: Jimmy Cohrssen/Divulgação
Projeto da loja Louis Vuitton, em Paris. Foto: Jimmy Cohrssen/Divulgação
E como ficam as tendências nesse contexto de personalização?
No luxo você tem a oportunidade de desenvolver algo novo, diferente, que não é baseado no que já foi feito. Nós não seguimos tendências ou estilos. Nós os criamos. Porque temos os recursos, a equipe, os protótipos. As pessoas vêm até nós porque querem algo novo, excepcional, personalizado, que combina com elas. Tendências são para seguidores. Nós somos líderes.
Você tem vários projetos em diferentes países, com culturas diversas. Como é possível manter uma assinatura própria ao criar para toda essa diversidade?
Esse é um fenômeno que acontece, mas é algo que evito a todo custo. Se eu tenho uma assinatura, então vou repeti-la. E isso não é interessante criativamente. Eu não quero que você veja um projeto de nossa autoria e pense “é do Carbondale” ou “é de Eric Carlson”. Quero que você olhe para ele e pense “é da Louis Vuitton” ou “é da H. Stern” [marcas para as quais Carlson desenvolveu trabalhos]. Fazer algo com a minha cara ou do Carbondale significa que falhamos. É preciso ser sempre sobre o outro. Não estou interessado em repetir meus próprios desejos, quero saber dos seus. Criar é redefinir algo novo a todo momento. Dá muito trabalho, requer muitos recursos, por isso é caro.
Restaurante Tre Bicchieri, em São Paulo. Foto: Nelson Kon/Divulgação
Restaurante Tre Bicchieri, em São Paulo. Foto: Nelson Kon/Divulgação
E como é o seu processo criativo?
Nos primeiros meses de um projeto, nós apenas ouvimos e fazemos boas perguntas. Muitas perguntas. E tomamos nota. Temos que usar aquele tipo de pesquisa de laboratório mesmo, ser bem científicos nessa primeira etapa. Depois, temos que ser muito criativos. Por isso, é desafiador, o que me atrai. É um processo analítico, racional e free style ao mesmo tempo. A arquitetura é complicada, difícil e exigente, porque você tem que garantir a qualidade, e eu adoro.
Você vê características em comum entre os clientes brasileiros?
Eu não gosto de falar sobre o que as pessoas têm em comum, prefiro pensar sobre o que elas têm de diferente. E claro que as diferenças existem, porque vivemos em sociedades, estamos inseridos em culturas, e existem vários níveis para isso: temos o Brasil, depois temos as regiões do Brasil, e dentro de cada uma delas há cidades diferentes, e nas cidades há bairros, e assim por diante. Mas acho que a resposta para essa pergunta é “sim”. Há algumas características em comum. Uma generalização que descobri sendo um estrangeiro aqui no Brasil foi que brasileiros gostam de luz, claridade, de verde e de espaços abertos. Mas nem todos têm essas preferências. São características culturais que muitos dividem, mas eu acredito que o interessante é ir além: perguntar-se “por que eles gostam disso?”. Por que querem isso no ambiente em que trabalham? No ambiente em que se divertem? Em que comem ou dormem? Acho que isso é interessante: as diferenças.
Área de circulação da loja da Longchamp, em Paris. Foto: Karim Daher/Divulgação
Área de circulação da loja da Longchamp, em Paris. Foto: Karim Daher/Divulgação
O que você aprendeu trabalhando com projetos no Brasil?
Todo projeto é como uma escola para mim. Em todos os países eu aprendo. No Brasil, aprendemos sobre os costumes das pessoas daqui. Por exemplo, com o projeto do Shopping Iguatemi, em São Paulo, pudemos conhecer sobre o processo de compra no Brasil. O papel que as compras têm e a forma como as pessoas veem um shopping: como um lugar para se reunir. Faz parte da cultura, do estilo de vida do brasileiro. A ideia que eu tinha disso era basicamente a dos Estados Unidos, de onde venho, e da França, países onde esses lugares são feitos apenas para comprar e comer. Eventualmente eles também servem para o entretenimento, mas não são uma opção para ir e passar o dia. No Brasil, algumas das melhores experiências acontecem nesses ambientes. E esse é só um exemplo. Eu poderia falar de residências, restaurantes, marcas de luxo, etc.
Assim como pensamos sobre o que os grandes chefs de cozinha preparam em casa – será que comem arroz com ovo frito? –, também pensamos sobre como é a casa de um arquiteto que trabalha com luxo. Como é a sua?
Tenho certeza de que sou impactado pelo trabalho que desenvolvo. Mas, na minha vida, eu não gosto de coisas. Eu não tenho coisas, não as quero ao meu redor, em minha casa. Quero que tudo seja muito simples e fácil. Não estéril ou mínimo, de jeito nenhum, mas eu apenas não quero pensar sobre coisas, porque eu já faço isso o dia todo. Mas minha esposa, que é brasileira, às vezes não concorda comigo, e ela não trabalha com arquitetura ou design [risos]! Às vezes ela quer coisas, sabe? Como móveis, por exemplo.
* especial para HAUS

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